TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO Nº 0600716–42.2018.6.00.0000 – CLASSE 11541 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relator: Ministro Sérgio Banhos Representante: Partido Democrático Trabalhista (PDT) – Nacional Advogado: Willer Tomaz de Souza Representada: Google Brasil Internet Ltda. Advogado: Fabio Rivelli Representada: Associação Movimento Brasil Livre (MBL) Advogados:... Leia conteúdo completo
TSE – 6007164220186000384 – Min. Sergio Silveira Banhos
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO Nº 0600716–42.2018.6.00.0000 – CLASSE 11541 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relator: Ministro Sérgio Banhos Representante: Partido Democrático Trabalhista (PDT) – Nacional Advogado: Willer Tomaz de Souza Representada: Google Brasil Internet Ltda. Advogado: Fabio Rivelli Representada: Associação Movimento Brasil Livre (MBL) Advogados: Cleber dos Santos Teixeira e outro Representado: Carmelo Silveira Carneiro Leão Neto Advogados: Daniel de Leão Keleti e outros DECISÃO Trata–se de representação ajuizada pelo Diretório Nacional do Partido Democrático Trabalhista (PDT) contra Google Brasil Internet Ltda., Associação Movimento Brasil Livre (MBL) e Carmelo Silveira Carneiro Leão Neto, impugnando a publicação de vídeo no canal “Movimento Brasil Livre”, na plataforma YouTube, intitulado “Jovem cearense manda a real sobre Ciro Gomes!”. Segundo o representante, o vídeo (narrado pelo terceiro representado) traz diversas afirmações falsas e ofensivas sobre o candidato Ciro Gomes, atribuindo–lhe imagem pejorativa e desqualificando sua pessoa política. Em umas delas, consta que Ciro Gomes é “um frouxo, um covarde acostumado a posar de machão no feudo em que sua família transformou e quer continuar transformando o Estado do Ceará e a cidade de Sobral”. Consta, ainda, que o candidato está “acostumado a intimar os seus adversários com capangas” e que sua família era composta por oligarcas que “ganhavam dinheiro com o sangue dos negros”. Defende que a Justiça Eleitoral deve combater violências que venham, como único propósito, prejudicar a imagem de Ciro Gomes, mediante veiculação de fake news. Assenta que, além de violar sua imagem e divulgar informações falsas, o vídeo constituiria propaganda eleitoral antecipada, com fundamento em informações caluniosas e difamatórias. Estabelece a necessidade de relativização da liberdade de expressão, devido ao seu exercício abusivo, situação que se agrava em razão da vulnerabilidade do candidato, constantemente submetido aos holofotes da imprensa e da opinião pública. Solicita liminarmente a remoção do vídeo impugnado, como modo de conter a disseminação do conteúdo. Em razão do pedido de tutela provisória, deixou–se de proceder à notificação imediata, fazendo–se os autos conclusos conforme o art. 8º, § 5º, da Res.–TSE nº 23.547/2017. A Presidente em exercício no período das férias forenses, Ministra Rosa Weber, indeferiu o pedido liminar (ID 285938). A Associação Movimento Renovação Liberal apresentou pedido de habilitação nos autos do processo, informando ser a responsável pela publicação do vídeo impugnado (ID 28751). Em contestação conjunta (ID 289056), a Associação Movimento Renovação Liberal e Carmelo Silveira Carneiro Leão Neto suscitam, preliminarmente, a ilegitimidade ativa do PDT. Quanto ao mérito, alegam, em síntese, que: a) o Movimento Renovação Liberal é associação detentora da marca MBL, portanto é parte legítima para figurar no polo passivo desta demanda; b) “as opiniões divulgadas pelos Representados não são falsas nem tampouco ofensivas, uma vez que se limitam nas balizas do direito constitucionalmente consagrado à liberdade de expressão, expressar opinião política dos Representados sobre o pré–candidato Ciro Gomes” (fl. 4); c) o artigo 22, §§ 1º e 2º, da Res.–TSE nº 23.551/2017 é cristalino ao defender a livre manifestação do pensamento, ainda que dela conste mensagem de crítica a partido político ou candidato; e d) não houve ofensa à moral ou à honra do PDT nem do candidato Ciro Gomes, “uma vez que o conteúdo tratou de meras críticas à conduta política do político” (fl. 6). Em defesa, a Associação Movimento Brasil Livre (MBL) suscita sua ilegitimidade passiva, sob o argumento de que não possui páginas em redes sociais, o que torna inviável a possibilidade de ter postado o vídeo hostilizado (ID 290074). Ao final, pleiteia a correção do polo passivo da demanda, indicando o Movimento Renovação Liberal como entidade autora da publicação do vídeo. A Google Brasil Internet Ltda., por sua vez, alega inexistir citação válida, “uma vez que o endereço indicado na petição inicial e no instrumento citatório não são da sede da Google, pois a empresa não se encontra estabelecida no logradouro informado” (ID nº 299766 – fl. 2). No mérito, sustenta, em suma, que: a) “um homem público que se expõe ao juízo popular, seja como deputado, senador ou candidato, está invariavelmente submetido a críticas e conceitos depreciativos. Isso nem sempre virá de maneira elegante, como em um debate entre cavalheiros. Todavia, o mau gosto não é fundamento suficiente a autorizar a supressão de conteúdo, e, mais que isso, a censura da liberdade de expressão do eleitorado” (fl. 8); b) não cabe ao Poder Judiciário restringir as manifestações sociais, ainda que sejam elas exageradas ou distorcidas, pois não deixam de ser, nos termos da Constituição Federal, oportunidade para se formar uma discussão saudável e relevante para a sociedade; c) aos eleitores deve subsistir o direito amplo à manifestação do pensamento, no mundo real ou virtual, sob o risco de intromissões indevidas na vida privada dos cidadãos por parte do Poder Público (fl. 9); e d) o conteúdo não fere os direitos de personalidade do representante, motivo pelo qual o pedido deverá ser julgado improcedente. O Vice–Procurador–Geral Eleitoral opina pela extinção do processo sem resolução de mérito em relação à Associação Movimento Brasil Livre (MBL), ante sua ilegitimidade passiva, e pela improcedência dos pedidos contidos na petição inicial (ID 301289). O parecer apresenta a seguinte ementa: Eleições 2018. Presidente da República. Representação. Propaganda negativa extemporânea. Não configuração. Ilegitimidade passiva. Exercício do direito de crítica. 1. Nos termos do art. 96, caput, da Lei das Eleições, as representações por propaganda eleitoral irregular podem ser propostas por partido político, a afastar a questão preliminar de ilegitimidade ativa da agremiação. 2. Não tendo a petição inicial esclarecido, de forma adequada, o vínculo de pertinência subjetiva em relação um dos representados, o processo deve ser extinto em relação a ele, sem resolução de mérito, por ilegitimidade passiva (art. 485, VI, do Código de Processo Civil). 3. A circulação de opiniões e críticas revela–se essencial para a configuração de um espaço público de debate e, consequentemente, ao Estado Democrático de Direito. Em período eleitoral, aqueles que se propõem a representar toda a sociedade devem tolerar a realização de críticas a eles dirigidas de forma mais acentuada que um cidadão comum. 4, Por mais ácidas que possam parecer àquele que figura como seu alvo, as críticas de caráter político estão compreendidas, prima facie, no campo da liberdade de expressão, passando para o domínio da ilicitude quando inegavelmente violadoras da legislação atinente à propaganda eleitoral. Parecer pela extinção do feito, sem resolução de mérito, em relação à Associação Movimento Brasil Livre – MBL, e pela improcedência dos pedidos contidos na inicial. É o relatório. Decido. De início, considero tempestiva a contestação apresentada pela representada Google Brasil Internet Ltda., nos termos do preceito normativo assegurado no art. 239, § 1º, do Código de Processo Civil: “o comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou nulidade da citação, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação”, pois devidamente comprovada a indicação errônea do endereço pelo representante na petição inicial (ID 299769). Afasto a preliminar referente à ilegitimidade do PDT para a propositura desta representação, porquanto o art. 96 da Lei nº 9.504/1997 dispõe que “as reclamações ou representações relativas a seu descumprimento podem ser feitas por qualquer partido político, coligação ou candidato”. Noutro vértice, observo que as condições da ação – interesse e legitimidade – devem ser aferidas com base na teoria da asserção, ou seja, à luz das afirmações contidas na petição inicial. Verifico não demonstrada pelo PDT, por ocasião da pretensão deduzida na peça inicial, pertinência subjetiva da Associação Movimento Brasil Livre (MBL), para compor o polo passivo da ação. Aliás, a Associação Movimento Renovação Liberal apresentou, simultaneamente, pedido de habilitação nos autos e contestação, reivindicando a autoria pela publicação do vídeo hostilizado. Desse modo, julgo extinta a ação sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, VI, do CPC, em relação à representada Associação Movimento Brasil Livre (MBL). No mérito, não assiste razão ao representante. O art. 22, § 1º, da Res.–TSE nº 23.551/2017 é categórico ao estabelecer que “a livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos”. De acordo com a doutrina, a inverdade sabida nada mais é do que a inverdade evidente (CONEGLIAN, Olivar. Propaganda Eleitoral – Curitiba: Juruá, 2016, p. 366); isto é, aquela cuja constatação independa de maiores exames ou avaliações. Logo, entende–se, por sabidamente inverídicos, somente os “flagrantes expedientes de desinformação”, levados a cabo “com o propósito inequívoco de induzir o eleitorado a erro” (ALVIM, Frederico Franco. Curso de Direito Eleitoral –Curitiba: Juruá, 2016, p. 293). Na mesma linha, este Tribunal entende que “a mensagem, para ser qualificada como sabidamente inverídica, deve conter inverdade flagrante que não apresente controvérsias” (RP nº 3675–16/DF, rel. Min. Henrique Neves da Silva, PSESS em 26.10.2010), bem como que “o fato sabidamente inverídico [...] é aquele que não demanda investigação, ou seja, deve ser perceptível de plano” (RP n° 1431–75/DF, rel. Min. Admar Gonzaga Neto, PSESS em 2.10.2014), o que não se verifica no caso em exame. É certo que “o caráter dialético imanente às disputas político–eleitorais exige maior deferência à liberdade de expressão e de pensamento, razão pela qual se recomenda a intervenção mínima do Poder Judiciário nas manifestações e críticas próprias do embate eleitoral, sob pena de se tolher substancialmente o conteúdo da liberdade de expressão” (AgR–RO nº 758–25/SP, rel. Min. Luiz Fux, DJe de 13.9.2017). À luz do que afirmado pela Ministra Rosa Weber, por ocasião do julgamento do pedido liminar, “no contexto das competições eleitorais, é preciso preservar, tanto quanto possível, a intangibilidade da liberdade de imprensa, notadamente porque a função de controle desempenhada pelas indústrias da informação é essencial para o controle do poder e para o exercício do voto consciente. Essa condição impõe, como consequência, que as autoridades jurisdicionais se abstenham de banalizar decisões que limitem o seu exercício, somente intervindo em casos justificados e excepcionais” (ID 285938). Na hipótese dos autos, depois de uma análise atenta do vídeo hostilizado, não se extraem das mensagens elementos suficientes à configuração de qualquer transgressão comunicativa, violadoras de regras eleitorais ou ofensivas aos direitos personalíssimos do representante. As afirmações constantes do vídeo se voltam à postura política de Ciro Gomes – candidato à Presidência da República pela agremiação partidária representante –, assumindo o sentido de crítica, e não de humilhação. Esse tipo de crítica, quando inerente à disputa eleitoral, não configura agressão à honra. Nesse sentido: Pet no 4979/PE, rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgada em 23.6.2015). A liberdade de expressão não abarca somente as opiniões inofensivas ou favoráveis, mas também aquelas que possam causar transtorno ou inquietar pessoas, pois a democracia se assenta no pluralismo de ideias e pensamentos (ADI no 4439/DF, rel. Min. Roberto Barroso, rel. para acórdão Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgada em 27.9.2017). Acrescenta Aline Osorio, em obra doutrinária, que “a liberdade de expressão no campo político–eleitoral abrange não só manifestações, opiniões e ideias majoritárias, socialmente aceitas, elogiosas, concordantes ou neutras, mas também aquelas minoritárias, contrárias às crenças estabelecidas, discordantes, críticas, incômodas, ofensivas ou negativas. E isso ainda quando forem proferidas em tom feroz, exaltado ou emocionado” (OSORIO, Aline. Direito Eleitoral e Liberdade de Expressão. Belo Horizonte: Fórum, 2016. p. 161). O art. 33 da Res.–TSE nº 23.551/2017 impõe à Justiça Eleitoral o dever de autocontenção judicial em prol da amplitude do debate democrático. Reproduzo o dispositivo: Art. 33. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57–J). § 1° Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral. Por fim, oportuno mencionar precedente desta Corte: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. CRÍTICA A ATOS DE GOVERNO. POSIÇÃO PREFERENCIAL DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E SEUS COROLÁRIOS NA SEARA ELEITORAL. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO ATACADA. DESPROVIMENTO. 1. A liberdade de expressão reclama proteção reforçada, não apenas por encerrar direito moral do indivíduo, mas também por consubstanciar valor fundamental e requisito de funcionamento em um Estado Democrático de Direito, motivo por que o direito de expressar–se e suas exteriorizações (informação e de imprensa) ostenta uma posição preferencial (preferred position) dentro do arquétipo constitucional das liberdades. 2. A proeminência da liberdade de expressão deve ser trasladada para o processo político–eleitoral, mormente porque os cidadãos devem ser informados da variedade e riqueza de assuntos respeitantes a eventuais candidatos, bem como das ações parlamentares praticadas pelos detentores de mandato eletivo (FUX, Luiz; FRAZÃO, Carlos Eduardo. Novos Paradigmas do Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2016). 3. A exteriorização de opiniões, por meio da imprensa de radiodifusão sonora, de sons e imagens, sejam elas favoráveis ou desfavoráveis, faz parte do processo democrático, não podendo, bem por isso, ser afastada, sob pena de amesquinhá–lo e, no limite, comprometer a liberdade de expressão, legitimada e legitimadora do ideário de democracia. (AgR–REspe nº 1987–93/AP, rel. Min. Luiz Fux, DJe de 27.10.2017) Ante o exposto, em relação à representada Associação Movimento Brasil Livre (MBL), julgo extinta a ação sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, VI, do CPC. No mérito, julgo improcedente a representação, nos termos do art. 36, § 6º, do RITSE. Determino à Secretaria Judiciária a inclusão da Associação Movimento Renovação Liberal no polo passivo da demanda. Publique–se. Brasília, 22 de agosto de 2018. Ministro SERGIO SILVEIRA BANHOS Relator
Data de publicação | 22/08/2018 |
---|---|
PALAVRA PESQUISADA | Fake News |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60071642 |
NUMERO DO PROCESSO | 6007164220186000384 |
DATA DA DECISÃO | 22/08/2018 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2018 |
SIGLA DA CLASSE | Rp |
CLASSE | Representação |
UF | DF |
MUNICÍPIO | BRASÍLIA |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Direito de resposta |
PARTES | ASSOCIACAO MOVIMENTO BRASIL LIVRE - MBL, CARMELO SILVEIRA CARNEIRO LEAO NETO, GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., MOVIMENTO RENOVAÇÃO LIBERAL, PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) - NACIONAL |
PUBLICAÇÃO | MURAL |
RELATORES | Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos |
Projeto |