TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601584–78.2022.6.00.0000 (PJe) – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relatora: Ministra Maria Claudia Bucchianeri Representantes: Coligação pelo Bem do Brasil e outro Advogados(as): Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e outros (as) Representada: Coligação Brasil da Esperança DECISÃO Trata–se de representação, com pedido liminar,... Leia conteúdo completo
TSE – 6015847820225999872 – Min. Maria Claudia Bucchianeri
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601584–78.2022.6.00.0000 (PJe) – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relatora: Ministra Maria Claudia Bucchianeri Representantes: Coligação pelo Bem do Brasil e outro Advogados(as): Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e outros (as) Representada: Coligação Brasil da Esperança DECISÃO Trata–se de representação, com pedido liminar, ajuizada pela Coligação pelo Bem do Brasil e Jair Messias Bolsonaro em desfavor da Coligação Brasil da Esperança, com fundamento no art. 31 da Res.–TSE nº 23.608/2019 c/c art. 72, §§ 1º e 2º, da Res.–TSE 23.610/2019, por suposta veiculação de desinformações em inserções na propaganda eleitoral gratuita da representada nas emissoras de rádio, nos dias 14, 15, 16, 17, 18 e 19.10.2022. Na petição inicial, os representantes alegam, em síntese, que (ID 158265091): a) os representados veicularam informação gravemente manipulada e distorcida sobre o preço dos combustíveis, dispondo que a sua redução “decorre de ¿jogada eleitoreira', portanto, temporária, e que, após o 2º turno, o preço não só do combustível, como dos ¿alimentos, remédios e tudo mais', ¿vai explodir'” (p. 5). Este é o teor da inserção impugnada (p. 2): “Com o Bolsonaro o combustível aumentou para o valor mais alto da história. Perto da eleição ele começou a reduzir o preço. Mas como é uma jogada eleitoreira, a redução é temporária. E agora Bolsonaro quer que a Petrobrás só aumente os preços depois do 2º turno, ou seja, depois da eleição essa bomba vai explodir. E os preços de alimentos, remédios e tudo mais também. Brasil não aguenta mais o Bolsonaro”. b) é inverídica e manipuladora a imputação de culpa ao candidato Jair Bolsonaro pela alta dos combustíveis no Brasil, tendo em vista que “a realidade conhecida é que o aumento dos preços dos combustíveis, a partir de 2020, é um fenômeno mundial, chegando o barril de petróleo a U$ 100, potencializado pela pandemia de Covid–19 e pela Guerra da Ucrânia, fato amplamente divulgado pela imprensa, como se vê em reportagem da CNN Brasil” (p. 5); c) “mesmo diante desse cenário global de aumento de preços do combustível, o seu preço médio no Brasil, ainda em 2016, esteve abaixo da média internacional, em clara demonstração dos esforços da Petrobrás na viabilização de política pública destinada à redução dos impactos negativos da elevação dos preços dos combustíveis no país” (fl. 5); d) a legislação de regência, mais especificamente o art. 14, inc. II, da Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais), impede a fixação de preços de combustíveis pelo presidente da República, competindo tal atribuição, no âmbito da Petrobrás, ao Conselho de Administração e Diretoria, o que demonstra ser inverídica a informação veiculada; e) o teor da propaganda transcende os limites da liberdade de expressão e atinge a integridade do processo eleitoral, nos termos dos arts. 9º–A da Res.–TSE nº 23.610/2019 e 53, § 1º e 2º, da Lei das Eleições, sendo da mesma forma rechaçada pela jurisprudência desta Corte; Requerem seja deferido o pedido de remoção da inserção veiculada, cautelarmente, em razão da manifesta contrariedade à legislação eleitoral, residindo o periculum in mora no fato de que a referida propaganda está sendo veiculada desde o dia 14.10, devendo este Tribunal adotar “medidas mais enérgicas para proibir a retransmissão da grave propaganda descontextualizada” (fl. 11). Ao final, pedem (p. 11): i) a concessão da tutela de urgência requestada, a fim de que se determine a imediata retirada e se proíba a retransmissão, por quaisquer meios de propaganda eleitoral, da inserção constante do áudio anexo, com expedição de ordem ao pool de emissoras de rádio para que promova a interrupção da transmissão, sob pena de multa de R$ 50.000,00, a ser arcada de maneira solidária pela emissora que fizer a transmissão, para cada vez que a inserção for veiculada; ii) a notificação da Representada para que, querendo, apresente sua defesa no prazo legal; iii) reconhecida a prática do ilícito e confirmada a concessão da medida liminar, seja julgada procedente a representação, com esteio nos arts. 53, §1º e 2º, da Lei das Eleições, e 9º e 9º–A, da Resolução/TSE nº 23.610/2019, para o fim de restar definitivamente proibida a retransmissão da inserção ora impugnada por qualquer meio de propaganda eleitoral. É o relatório. Passo a apreciar os pedidos veiculados na liminar. Consoante já tive a oportunidade de enfatizar em diversas decisões anteriores, entre elas a Rp nº 0600229–33/DF, o meu entendimento é no sentido do minimalismo judicial em tema de intervenção no livre mercado de ideias políticas, de sorte a conferir tratamento preferencial à liberdade de expressão e ao direito subjetivo do eleitor e da eleitora de obterem o maior número de informações possíveis para formação de sua escolha eleitoral, inclusive para aquilatar eventuais comportamentos supostamente desleais ou inapropriados. No entanto, o Plenário desta Corte Superior, considerando o peculiar contexto inerente às eleições de 2022, com “grande polarização ideológica, intensificada pelas redes sociais”, firmou orientação no sentido de uma “atuação profilática da Justiça Eleitoral”, em especial no que concerne a qualquer tipo de comportamento passível de ser enquadrado como desinformativo (R–Rp nº 0600557–60/DF, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, PSESS de 1º.9.2022, em que fiquei vencida isoladamente) e flagrantemente ofensivo. Também assim, o julgamento da Rp nº 0600851–15/DF, red. p/ o acórdão Min. Alexandre de Moraes, PSESS de 22.9.2022, ocasião em que esta Casa voltou a destacar o direito do eleitorado não apenas de ter acesso à mais ampla informação, mas, também e sobretudo, à informação “verdadeira” e “não fraudulenta”, com o que se conferiu a esta Casa um dever de filtragem mais fino. Em idêntico sentido, na sessão jurisdicional de 13.10.2022, o Plenário desta Casa determinou, nos autos da RP 0601373–42, a remoção de matéria jornalística, sem nenhuma edição, veiculada ainda no ano de 2011 pela TV Record, envolvendo o debate público então travado em torno do combate a homofobia nas escolas, por se haver considerado que o título atribuído à mídia (19.05.2011 – kit gay causa polêmica) era desinformativo. Nesse mesmo julgamento, em que fiquei vencida ao lado do Ministro Sergio Banhos, o Ilustre Presidente desta Casa, Ministro Alexandre de Moraes, registrou que a associação de diversos fatos verdadeiros a uma conclusão inverídica também configura “fake news”. Sua Excelência também destacou que o só fato de determinadas matérias terem sido divulgadas em veículos tradicionais de imprensa não afasta eventual natureza desinformativa. Também na sessão de 13.10.2022, o Plenário desta Casa, vencidos os llustres Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Sergio Banhos e Carlos Horbach, determinou a imediata remoção dos conteúdos da URL mencionada no acórdão, nos autos da RP nº 0601372–57, por entender que, mesmo tratando–se de um vídeo estruturado a partir de conteúdo jornalístico, apresentava “desordem informacional”. Essa, portanto, é a métrica a nortear a análise do presente feito. Pois bem, consoante relatado, o que se pretende, em sede de tutela provisória de urgência, é a suspensão de veiculação de suposta desinformação contra o candidato à presidência Jair Bolsonaro, constante de inserção em emissoras de rádio, assim transcrita na inicial (ID 158265091, p. 2): Com o Bolsonaro o combustível aumentou para o valor mais alto da história. Perto da eleição ele começou a reduzir o preço. Mas como é uma jogada eleitoreira, a redução é temporária. E agora Bolsonaro quer que a Petrobrás só aumente os preços depois do 2º turno, ou seja, depois da eleição essa bomba vai explodir. E os preços de alimentos, remédios e tudo mais também. Brasil não aguenta mais o Bolsonaro. Não vislumbro, na propaganda questionada, irregularidade apta a ensejar a excepcional interferência desta Justiça especializada. Trata–se, a meu ver, de típicas críticas políticas, também inseridas no debate político, e que devem ser neutralizadas e respondidas dentro do próprio ambiente político, sem a intervenção do Poder Judiciário que, no meu entender, deve se pautar pelo minimalismo judicial, não podendo e nem devendo funcionar como “curador” da “qualidade” de discursos e narrativas de natureza eminentemente políticas – especialmente quando construídas a partir de fatos de conhecimento público, como na referida propaganda impugnada, em que se questiona o aumento e a redução do preço dos combustíveis e dos produtos de consumo em geral, tema que inegavelmente faz parte de discussão pública nacional e é claramente albergado pela liberdade de expressão. Aplica–se, portanto, à espécie, a jurisprudência desta Casa no sentido de que “a mensagem, para ser qualificada como sabidamente inverídica, deve conter inverdade flagrante que não apresente controvérsias”. Nesse sentido: R–Rp nº 2962–41/DF, rel. Min. Henrique Neves da Silva, PSESS de 28.9.2010; e Rp nº 0601513–18/DF, rel. Min. Carlos Horbach, PSESS de 5.10.2018. Também assim, a premissa de que, “no processo eleitoral, a difusão de informações sobre os candidatos – enquanto dirigidas a suas condutas pretéritas e na condição de homens públicos, ainda que referentes a fato objeto de investigação, denúncia ou decisão judicial não definitiva – e sua discussão pelos cidadãos evidenciam–se essenciais para ampliar a fiscalização que deve recair sobre as ações do aspirante a cargos políticos e favorecer a propagação do exercício do voto consciente” (AgR–REspEl nº 0600045–34/SE, rel. Min. Edson Fachin, DJe de 4.3.2022). Esta casa também já firmou o entendimento de que “não devem ser caracterizados como ¿fake news' [...] as notícias veiculadas em tom exaltado e até sensacionalista” (REspEl nº 972–29/MG, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 26.8.2019 – p. 20, destaquei), assim como é cediço que fatos noticiados na mídia não embasam o pedido de direito de resposta por não configurar fato sabidamente inverídico (Rp nº 1393–63/DF, rel. Min. Admar Gonzaga, PSESS de 2.10.2014, entre outros). Nesse contexto, impende destacar alguns julgados cuja ratio decidendi se aplica a este caso, embora referentes a pedido de direito de resposta: ELEIÇÕES 2018. RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA. INSERÇÕES. VEICULAÇÃO. EMISSORAS DE TELEVISÃO. DESPROVIMENTO. 1. Na linha de entendimento desta Corte, o exercício do direito de resposta é viável apenas quando for possível extrair, das afirmações apontadas, fato sabidamente inverídico apto a ofender, em caráter pessoal, o candidato, partido ou coligação. Precedente. 2. Conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), a “liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e compreende não somente as informações consideradas como inofensivas, indiferentes ou favoráveis, mas também as que possam causar transtornos, resistência, inquietar pessoas, pois a Democracia somente existe baseada na consagração do pluralismo de ideias e pensamentos políticos, filosóficos, religiosos e da tolerância de opiniões e do espírito aberto ao diálogo” (ADI no 4439/DF, rel. Min. Luís Roberto Barroso, rel. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, DJe de 21.6.2018). 3. A propaganda questionada localiza–se na seara da liberdade de expressão, pois enseja crítica política afeta ao período eleitoral. Cuida–se de acontecimentos amplamente divulgados pela mídia, os quais são inaptos, neste momento, a desequilibrar a disputa eleitoral. Em exame acurado, trata–se de declarações, cuja contestação deve emergir do debate político, não sendo capaz de atrair o disposto no art. 58 da Lei nº 9.504/1997. 4. Recurso desprovido. (R–Rp nº 0601054–16/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS de 18.9.2018 – destaquei) ELEIÇÕES 2018. RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA. INSERÇÕES. TELEVISÃO. INEXISTÊNCIA DE AFIRMAÇÃO SABIDAMENTE INVERÍDICA. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. DESPROVIMENTO. 1. Na linha de entendimento desta Corte, o exercício do direito de resposta é viável apenas quando for possível extrair, das afirmações apontadas, fato sabidamente inverídico apto a ofender, em caráter pessoal, o candidato, partido ou coligação. Precedente. 2. A propaganda eleitoral impugnada foi embasada em notícias veiculadas na imprensa e em entrevistas concedidas pelo próprio candidato recorrente, inclusive com a exibição das manchetes dos jornais na propaganda eleitoral, como forma de demonstrar a origem das informações. 3. Esta Corte já firmou o entendimento de que fatos noticiados na mídia não embasam o pedido de direito de resposta por não configurar fato sabidamente inverídico (Rp nº 1393–63/DF, rel. Min. Admar Gonzaga, PSESS em 2.10.2014). 4. A propaganda impugnada localiza–se na seara da liberdade de expressão, pois enseja crítica política afeta ao período eleitoral. 5. Recurso desprovido. (R–Rp nº 0601420–55/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS de 5.10.2018 – destaquei) Também nessa linha, convém realçar as esclarecedoras palavras de Aline Osorio: A crítica política – dura, mordaz, espinhosa, ácida – é peça essencial ao debate democrático. Em disputas acirradas por cargos eletivos, é natural que candidatos e partidos não se limitem a discutir propostas e programas de governo e utilizem também a estratégia de desqualificar seus oponentes, destacando seus defeitos, pontos fracos, erros e manchas em suas biografias [...]. [...] por meio da crítica à figura dos candidatos, os eleitores têm acesso a um quadro mais completo das opções políticas. Considerações a respeito do caráter, da idoneidade e da trajetória dos políticos não são indiferentes ou [ir]relevantes para o eleitorado e fazem parte do leque de informações legitimamente utilizadas na definição do voto. (OSORIO, Aline. Direito Eleitoral e Liberdade de Expressão. Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 228) Nesse cenário, com todo o respeito devido, não encontro, nas publicações impugnadas, grave descontextualização dos fatos narrados ou veiculação de fatos sabidamente inverídicos que seja apta a afetar a integridade do processo eleitoral, a ponto de induzir o eleitor em erro, razão pela qual não vislumbro, na espécie, os pressupostos autorizadores da sempre excepcional intervenção desta Casa no livre mercado de ideias políticas (fato sabidamente inverídico ou gravemente descontextualizado). É assente na Suprema Corte que “o direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte–se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional” (ADI no 4451/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 6.3.2019 – destaquei). Ante todo o exposto, por entender ser manifestamente infundada a pretensão autoral, nego seguimento à representação, ficando prejudicado o pedido de medida liminar (art. 36, § 6º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral). Publique–se. Brasília, 25 de outubro de 2022. Ministra MARIA CLAUDIA BUCCHIANERIRelatora
Data de publicação | 25/10/2022 |
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PALAVRA PESQUISADA | Fake News |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60158478 |
NUMERO DO PROCESSO | 6015847820225999872 |
DATA DA DECISÃO | 25/10/2022 |
ANO DA ELEIÇÃO | Não especificado |
SIGLA DA CLASSE | Rp |
CLASSE | REPRESENTAÇÃO |
UF | DF |
MUNICÍPIO | BRASÍLIA |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Representação |
PARTES | COLIGAÇÃO BRASIL DA ESPERANÇA, COLIGAÇÃO PELO BEM DO BRASIL, JAIR MESSIAS BOLSONARO |
PUBLICAÇÃO | MURAL |
RELATORES | Relator(a) Min. Maria Claudia Bucchianeri |
Projeto |