TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626) Nº 0600081–21.2022.6.18.0000 (PJe) – TERESINA – PIAUÍ RELATOR: MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI AGRAVANTE: SAMUEL C BRANCO & F EMANOEL LTDA. ADVOGADOS: SAMUEL CASTELO BRANCO SANTOS (OAB/PI 6.334) E OUTROS AGRAVADO: PROGRESSISTAS (PP) – ESTADUAL ADVOGADA: IVILLA BARBOSA ARAUJO (OAB/PI 8.836) DECISÃO Trata–se de... Leia conteúdo completo
TSE – 6000812120226180096 – Min. Ricardo Lewandowski
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626) Nº 0600081–21.2022.6.18.0000 (PJe) – TERESINA – PIAUÍ RELATOR: MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI AGRAVANTE: SAMUEL C BRANCO & F EMANOEL LTDA. ADVOGADOS: SAMUEL CASTELO BRANCO SANTOS (OAB/PI 6.334) E OUTROS AGRAVADO: PROGRESSISTAS (PP) – ESTADUAL ADVOGADA: IVILLA BARBOSA ARAUJO (OAB/PI 8.836) DECISÃO Trata–se de agravo em recurso especial eleitoral interposto pela empresa Samuel C Branco & F. Emanoel Ltda. contra a decisão que inadmitiu o recurso especial manejado em face do acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí que, em representação por propaganda eleitoral antecipada negativa realizada na internet, manteve a decisão do Juiz auxiliar daquela Corte que havia condenado a ora agravante ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com fundamento no § 3º do art. 36 da Lei 9.504/1997. O acórdão foi assim ementado: “RECURSO EM REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2022. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA IRREGULAR. POSTAGENS DE IMAGENS NO INSTAGRAM DE NOTÍCIAS FALSAS. FAKE NEWS. MULTA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. DESPROVIMENTO.” (ID 157793549). Nas razões do recurso especial (ID 157793553), fundadas no 276, I, a e b, do Código Eleitoral, a recorrente apontou violação do art. 22 da Res.–TSE 23.610/2019 e suscitou divergência jurisprudencial com julgados de outros Tribunais eleitorais. Defendeu que a matéria veiculada na internet não induz nenhum eleitor a votar ou a não votar em determinado candidato, não havendo que se falar, portanto, em propaganda eleitoral negativa, com influência direta ou indireta sobre o pleito eleitoral. No tocante ao ponto, afirmou que: “A matéria em si apenas explicita um fato, qual seja a mensagem de voz de um eleitor e participante da campanha do político que pretende concorrer a governo dando as suas impressões sobre a corrida eleitoral piauiense, além disso informa sobre dados públicos de pesquisas registradas quanto as intenções de votos dos cidadãos.” (ID 157793553). Requereu, assim, o conhecimento e o provimento do apelo especial para que fosse reformado o acórdão recorrido e fossem julgados improcedentes os pedidos formulados na representação, com o consequente afastamento da multa aplicada. O Presidente do Tribunal a quo inadmitiu o recurso especial com base na Súmula 28/TSE. Sobreveio, então, o presente agravo (ID 157793561), em cujas razões a empresa Samuel C Branco & F Emanoel Ltda. reitera a alegação de dissídio, bem como a ocorrência de interpretação equivocada do art. 22 da Lei 23.610/2019, enfatizando não haver “uma caracterização de propaganda negativa antecipada, pois não há com a notícia vinculada uma influência direta ou indireta no pleito eleitoral, nem mesmo se trata do lado pessoal ou profissional do pré–candidato” (ID 157793561). Requer o conhecimento e o provimento do agravo, a fim de que, conhecido e provido o recurso especial, seja reformada a decisão do TRE/PI. Não foram apresentadas contrarrazões. A Procuradoria–Geral Eleitoral manifestou–se pelo provimento do recurso especial, nos termos da seguinte ementa: “Eleições 2022. Propaganda eleitoral antecipada negativa. Postagem de notícia falsa. Ausente elemento eleitoral apto para estabelecer a propaganda negativa punível. Parecer pelo provimento do recurso especial.” (ID 158707862). É o relatório. Decido. Bem examinados os autos, dou provimento ao agravo, uma vez que a agravante logrou êxito em demonstrar a presença dos requisitos de admissibilidade constantes do art. 276, I, do Código Eleitoral. Estando os autos suficientemente instruídos, passo a examinar o recurso especial eleitoral (art. 36, § 4º, do RITSE). O recurso é tempestivo. O acórdão recorrido foi publicado no Diário de Justiça Eletrônico no dia 24/6/2022, sexta–feira; e o recurso especial foi apresentado no dia 26/6/2022, domingo (ID 157793553). A petição, por sua vez, está subscrita por advogado devidamente constituído nos autos digitais (ID 157793554), bem como estão presentes o interesse e a legitimidade. Bem examinados os autos, verifica–se que o recurso merece prosperar. No caso, o TRE piauiense concluiu pela ocorrência da propaganda irregular negativa, porquanto entendeu que a mensagem possuía conteúdo sabidamente inverídico. O voto condutor do acórdão regional consignou que: A afirmação [...] demonstra–se despida de qualquer conexão com a realidade, visto que é notória a pré–campanha do candidato e os rearranjos políticos daí decorrentes.O objetivo, assim, é criar um estado mental fictício baseado, à evidência, em afirmação notoriamente inverídica.Quanto a isso, a Resolução do TSE se apresenta explicitamente não condescendente com postagens que se revelem “fake news”, sabiamente inverídicas.Nesse sentido o art. 9.º–A, da Resolução TSE n.º 23.610/2019, estabelece que: ¿É vedada a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos, devendo o juízo eleitoral, a requerimento do Ministério Público, determinar a cessação do ilícito, sem prejuízo da apuração de responsabilidade penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação.'No que respeita à multa, meu entendimento vai em encontro de vasta jurisprudência da Corte Superior, bem assim de Regionais, no sentido de coibir a veiculação de propaganda irregular apontada como sabidamente inverídica, utilizando–se de propaganda negativa a candidato, partido ou coligação.” (ID 157793547). Na espécie, tenho ser possível a revaloração jurídica dos fatos, tendo em vista que, na linha da jurisprudência desta Corte, essa é admitida quando restrita às premissas assentadas pela instância regional, não se aplicando, no caso, o óbice da Súmula 24/TSE. Nesse sentido: AgR–REspe 24–98/RJ, de relatoria do Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto. Por outro lado, na linha do entendimento firmado por esta Corte Superior, o voto vencido deve, nos termos do art. 941, § 3º, do Código de Processo Civil, ser considerado pela instância revisora, mormente quando a fundamentação adotada não contraria as conclusões do voto condutor a respeito dos fatos. Nessa linha: AgR–Respe 68–56/MG, de relatoria do Ministro Sérgio Banhos. Pois bem. Conforme lançado pelo Juiz Thiago Mendes de Almeida Férrer em seu voto dissonante perante o Tribunal de origem: “O eminente Relator proferiu voto no sentido de negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida, por entender que a publicação que foi divulgada demonstra mensagem desabonadora do pré–candidato Sílvio Mendes, especialmente diante da afirmação eleição perdida, embora a afirmação provenha de um suposto eleitor deste. Destaca que a conduta é proibida pela legislação, tanto pelo seu conteúdo quanto pelo meio empregado (site e Instagram).[...]Entendo, nesse caso específico, que não é possível extrair da matéria um conteúdo que possa ser enquadrado como fato sabidamente inverídico. Tenho como baliza as seguintes características para definir um fato como sabidamente inverídico: i) seja um fato público e/ ou notoriamente inverídico; ii) um fato com conotação esdrúxula, um absurdo, facilmente perceptível; iii) que se comprove que o propagador conheça o fato, mas divulgue intencionalmente de forma inverídica.Com base nessas premissas, o que eu observei no conteúdo dessa matéria jornalística, é que na realidade o conteúdo dela não demonstra um fato inverídico, uma vez que no texto da matéria, o portal diz apenas que um cidadão chamado Élcio locutor teria, num grupo de whatsapp, lançado um áudio dizendo que na opinião dele, a eleição estava perdida. Dizendo, no áudio, que ele era apoiador do candidato Sílvio Mendes, mas que na opinião dele a eleição estava perdida.Ora, essa é a opinião dele. E o que foi que fez o site? Pegou o áudio e transformou em uma matéria [mal redigida], pois além de noticiar um fato que era de alguém [um autodeclarado apoiador do candidato Sílvio Mendes], que teria dado a sua opinião sobre a eleição perdida, o site colocou na manchete da notícia: “Aliados de Sílvio Mendes jogam a toalha”.O título da matéria, a meu ver, não tem nenhum fato sabidamente inverídico, pois no áudio, o cidadão se declara como eleitor de Sílvio Mendes e é um locutor, alguém que tem uma certa repercussão do que ele pensa, do que ele fala, não deixa de ser um apoiador, realmente, um aliado relevante. Então, vejo nesse caso, certa semelhança ao que já foi discutido sobre “palavras mágicas”, quando manifestei meu entendimento no sentido de que estas se caracterizam quando a mensagem de pedido de voto se mostra inteligível de pronto, sem necessidade de muita interpretação, muita reflexão. Do mesmo modo, no caso em análise, para se dizer que isso aqui é fato sabidamente inverídico, seria necessária muita interpretação e ao final, segundo penso, a conclusão nem seria pela inverdade de conteúdo. Assim, no meu modo de compreender o fato sabidamente inverídico, a sua caracterização é incompatível com essa necessidade de uma ampla reflexão.No documento ID 21788564, a manchete menciona que “aliados de Sílvio Mendes e Bolsonaro jogam a toalha”. Eu imaginei que tinha a expressão “coordenação” na manchete, mas eu me enganei. Se a notícia tivesse citado a coordenação de campanha, eu poderia entender que houve má–fé, pois, no áudio, a pessoa não se diz coordenador de campanha, mas sim que é um eleitor, simpatizante, radialista, formador de opinião. O pessoal que faz a gestão desses grupos de fofoca política são “formadores de opinião”, então ele deu a opinião dele. O site, então, pegou a opinião dele e transformou em uma matéria, se foi de boa ou má qualidade, não cabe a mim analisar. Portanto, nesse caso eu até concordaria com o eminente Relator se tivessem publicado que a desistência partira da coordenação. Porém, nesse caso aqui ele citou “aliados” e o cidadão do áudio se diz realmente um aliado, porque ele se diz apoiador do candidato. Então eu entendo que esse aliado aqui está dentro do que ele se declarou.Então, eu não vejo nem nessa manchete e nem no conteúdo da matéria, nada que possa ser visto ou interpretado como um fato sabidamente inverídico ou difamador. As decisões que fundamentaram a decisão recorrida tratam sobre propaganda negativa antecipada, que não é o caso, ou de propaganda antecipada extemporânea convencional, que é aquela que tem um pedido de voto. Mas nesse caso aqui, o que tem que ser analisado é essa questão da informação sabidamente inverídica. Então, pelo conteúdo, eu entendo que a matéria apenas e tão somente reflete o áudio e a interpretação que o jornalista fez desse áudio, no qual um aliado do pré–candidato Sílvio Mendes teria dito, em um grupo de whatsapp com muitos participantes, que, na opinião dele, a eleição estava perdida.A meu ver isso é apenas declaração de uma opinião e, se ficarmos intervindo nisso, eu entendo que entraremos em um campo de uma intervenção excessiva que não se mostra saudável para o ambiente democrático. Assim como não é a propagação de informações falsas, não é, também, a extrema intervenção sobre a manifestação de pensamento, seja do cidadão, individualmente, ou por meio de matéria jornalística.” (ID 157793546). A propósito, destaco ainda do parecer ofertado pelo Vice–Procurador–Geral Eleitoral que: “O acórdão regional indicou a necessidade de coibir a matéria publicada na internet no mês de março que continha o seguinte título: “Aliados de Silvio Mendes e Bolsonaro jogam a tolha: ¿Eleição perdida no Piauí'”. Entendeu que houve divulgação de fato sabidamente inverídico. Deixou de analisar o conteúdo da postagem – que foi objeto de apuração apenas pelo voto divergente, que concluíra tratar–se de opinião isolada.A potencialidade razoável de um discurso vir a ter impacto eleitoral já foi considerada pelo Tribunal como elemento aferível para a caracterização do ilícito eleitoral da propaganda antecipada – e, portanto, para a caracterização do que seja o conteúdo eleitoral relevante, justificador da intervenção da Justiça especializada.Disse o Tribunal, na Representação n. 57293 (Revista de Jurisprudência do TSE vol. 25, t. 3, p. 9), que não se haveria de cogitar de conduta relevante para o Direito Eleitoral, “dada a pouca probabilidade de que a propaganda pudesse ter reflexos na consciência do eleitor no momento do voto”.Produzir ou reproduzir fake news, assim, não será sempre necessariamente assunto da competência da Justiça Eleitoral. Para que assim seja, há de estar presente ou o conteúdo eleitoral ou o ataque à integridade do processo eleitoral.A distância cronológica do fato também há de ser considerada.Decerto que no mês de março, a meses consideráveis do pleito, não se sabia o resultado das eleições. O título da postagem, isoladamente, não configura conduta que afeta a integridade do processo eleitoral. O contexto eleitoral relevante não se mostra caracterizado. Não se vislumbra, além disso, a conclamação explícita de não voto, a caracterizar propaganda eleitoral antecipada.” (págs. 2–3 do ID 158707862). Com efeito, a repressão a conteúdo exige prévia comprovação de que a divulgação de conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa é sabidamente inverídica ou gravemente descontextualizada. Não é o caso dos autos, tendo em vista que a representada limitou–se a compartilhar manchete que, malgrado dúbia em seus dizeres, diz respeito à opinião isolada de um cidadão que, no caso concreto, tal como assentado pelo Órgão ministerial, não teve o condão de afetar a integridade do processo eleitoral, tampouco de caracterizar a prática de propaganda eleitoral antecipada negativa. Isso posto – e acolhendo os fundamentos do voto vencido, bem como o pronunciamento ministerial –, dou provimento ao recurso especial (art. 36, § 7º, do RITSE), a fim de julgar improcedente a representação e afastar a multa imposta à recorrente. Proceda a Secretaria Judiciária à reautuação do feito. Publique–se. Brasília, 10 de abril de 2023. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI Relator
Data de publicação | 10/04/2023 |
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PALAVRA PESQUISADA | Fake News |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60008121 |
NUMERO DO PROCESSO | 6000812120226180096 |
DATA DA DECISÃO | 10/04/2023 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2022 |
SIGLA DA CLASSE | REspEl |
CLASSE | RECURSO ESPECIAL ELEITORAL |
UF | PI |
MUNICÍPIO | TERESINA |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Direito de resposta |
PARTES | PROGRESSISTAS (PP) - ESTADUAL, SAMUEL C BRANCO & F EMANOEL LTDA |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Ricardo Lewandowski |
Projeto |