TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601307–62.2022.6.00.0000 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relatora: Ministra Maria Claudia Bucchianeri Representante: Coligação Brasil da Esperança Advogados(as): Eugênio José Guilherme de Aragão e outros(as) Representados(as): Radio Auri Verde de Bauru Ltda e outros(as) DECISÃO Trata–se de representação, com pedido de tutela... Leia conteúdo completo
TSE – 6013076220225999872 – Min. Maria Claudia Bucchianeri
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601307–62.2022.6.00.0000 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relatora: Ministra Maria Claudia Bucchianeri Representante: Coligação Brasil da Esperança Advogados(as): Eugênio José Guilherme de Aragão e outros(as) Representados(as): Radio Auri Verde de Bauru Ltda e outros(as) DECISÃO Trata–se de representação, com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada pela Brasil da Esperança em desfavor de Radio Auri Verde de Bauru Ltda, Mara Cristina Gabrilli, Flávio Nantes Bolsonaro, Carla Zambelli Salgado, Terra Brasil Notícias, Ednardo Davila Mello Raposo, Perfil “@monicamachado38” no Twitter, Perfil “Rodrigo” no grupo “Conhecimento Conservador” no Telegram, Perfil “Vinicius Novais” no grupo “BOLSONARO PRESIDENTE” no Telegram, e Perfil “AJ” no grupo “MOVIMENTO ANTI–NOVO NORMAL” no Telegram, por suposta divulgação de desinformação na Internet. A representante alega que (ID 158161745): a) no programa “Jovem Pan News”, em entrevista concedida pela Sra. Mara Gabrilli divulgaram–se “alegações infundadas, já objeto de análise desta c. Corte em Representação Eleitoral n. 0600543–76.2022.6.00.0000, de que haveria relação entre o Partido dos Trabalhadores, o ex–Presidente Lula e o assassinato do ex–Prefeito de Santo André, Celso Daniel” (p. 7). b) o vídeo contendo a referida entrevista está sendo amplamente divulgado nas redes sociais pelos demais representados; c) o conteúdo veiculado é “sabidamente inverídico, haja vista que este c. TSE já desmentiu as notícias que associam o candidato Luiz Inácio Lula da Silva e o Partido dos Trabalhadores à morte de Celso Daniel, uma vez que, conforme já registrado, os responsáveis pelo crime foram efetivamente punidos pela pretensão estatal e cumprem suas devidas penas” (p. 13); d) a propagação do referido conteúdo viola o art. 9º–A da Res.–TSE nº 23.610/2019, na medida em que atinge “a integridade do processo eleitoral, manipulando a opinião pública com fatos sabidamente inverídicos” (p. 14), e ofende também o art. 22, X, da mencionada resolução, “prevê que não será tolerada propaganda que caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa” (p. 19); e) estão presentes, na espécie, os requisitos autorizadores da tutela provisória de urgência. Requer, ao final, que: i) liminarmente, “seja determinado aos Representados e às redes sociais que removam os conteúdos desinformadores objeto desta ação, sob pena de multa a ser arbitrada por esta c. Corte”(p. 22), nas URLs apontadas na inicial, abstendo–se de veicular outras notícias e/ou publicações que contenham o mesmo teor; ii) no mérito, a confirmação da liminar e “a condenação por propaganda irregular e a consequente aplicação da multa de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), conforme previsto no art. 36 da Lei n. 9.504/97” (p. 24). Os autos me vieram conclusos em 29.9.2022, às 16h41. É o relatório. Decido. Passo a apreciar o pedido de medida liminar. A representante pretende, em sede de tutela provisória de urgência, a remoção e proibição de veiculação de desinformação consistente na divulgação de fatos sabidamente inverídicos e ofensivos a respeito do candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ao relacioná–lo ao assassinato do prefeito Celso Daniel, do Município de Santo André. O tema não é novo nesta Corte. Isso porque o referido conteúdo já foi tido por este Tribunal Superior Eleitoral como altamente desinformativo, além de gravemente violador da imagem da candidatura requerente. Cite–se, a tal propósito, a decisão liminar proferida pelo Presidente desta Casa, Ministro Alexandre de Moraes, nos autos da RP nº 0600543–76/DF, que versava a veiculação de conteúdo falso rigorosamente idêntico ao novamente divulgado: A liberdade do direito de voto depende, preponderantemente, da ampla liberdade de discussão, de maneira que deve ser garantida aos pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores a ampla liberdade de expressão e de manifestação, possibilitando ao eleitor pleno acesso as informações necessárias para o exercício da livre destinação de seu voto. Historicamente, a liberdade de discussão, a ampla participação política e o princípio democrático estão interligados com a liberdade de expressão (GEORGE WILLIAMS. Engineers is Dead, Long Live the Engineers in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 15; RONALD DWORKIN, O direito da liberdade. A leitura moral da Constituição norte–americana. Martins Fontes: 2006; HARRY KALVEN JR The New York Times Case: A note on the central meaning of the first amendment in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 14), que tem por objeto não somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva (Tribunal Constitucional Espanhol: S. 47/02, de 25 de febrero, FJ 3; S. 126/03, de 30 de junio, FJ 3; S. 20/02, de 28 de enero, FFJJ 5 y 6). A Constituição protege a liberdade de expressão no seu duplo aspecto: o positivo, que é exatamente 'o cidadão pode se manifestar como bem entender', e o negativo, que proíbe a ilegítima intervenção do Estado, por meio de censura prévia. A liberdade de expressão, em seu aspecto positivo, permite posterior responsabilidade cível e criminal pelo conteúdo difundido, além da previsão do direito de resposta. No entanto, não há permissivo constitucional para restringir a liberdade de expressão no seu sentido negativo, ou seja, para limitar preventivamente o conteúdo do debate público em razão de uma conjectura sobre o efeito que certos conteúdos possam vir a ter junto ao público. Será inconstitucional, conforme ressaltei no julgamento da ADI 4451, toda e qualquer restrição, subordinação ou forçosa adequação programática da liberdade de expressão do candidato e dos meios de comunicação a mandamentos normativos cerceadores durante o período eleitoral, pretendendo diminuir a liberdade de opinião e de criação artística e a livre multiplicidade de ideias, com a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático; tratando–se, pois, de ilegítima interferência estatal no direito individual de informar e criticar. No célebre caso New York Times vs. Sullivan, a Suprema Corte Norte–Americana reconheceu ser “dever do cidadão criticar tanto quanto é dever do agente público administrar” (376 US, at. 282, 1964); pois, como salientado pelo professor da Universidade de Chicago, HARRY KALVEN JR., “em uma Democracia o cidadão, como governante, é o agente público mais importante” (The New York Times Case: A note on the central meaning of the first amendment in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 14, p. 429). A censura prévia desrespeita diretamente o princípio democrático, pois a liberdade política termina e o poder público tende a se tornar mais corrupto e arbitrário quando pode usar seus poderes para silenciar e punir seus críticos (RONALD DWORKIN, O direito da liberdade. A leitura moral da Constituição norte–americana. Martins Fontes: 2006, p. 319; HARRY KALVEN JR The New York Times Case: A note on the central meaning of the first amendment in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 14, p. 429). Os legisladores não têm, na advertência feita por DWORKIN, a capacidade prévia de “fazer distinções entre comentários políticos úteis e nocivos” (O direito da liberdade. A leitura moral da Constituição norte–americana. Martins Fontes: 2006, p. 326), devendo–se, portanto, permitir aos candidatos a possibilidade de ampla discussão dos temas de relevância ao eleitor. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre os principais temas de interesse do eleitor e também sobre os governantes, que nem sempre serão “estadistas iluminados”, como lembrava o JUSTICE HOLMES ao afirmar, com seu conhecido pragmatismo, a necessidade do exercício da política de desconfiança (politics of distrust) na formação do pensamento individual e na autodeterminação democrática, para o livre exercício dos direitos de sufrágio e oposição; além da necessária fiscalização dos órgãos governamentais. No célebre caso Abrams v. United States, 250 U.S. 616, 630–1 (1919), OLIVER HOLMES defendeu a liberdade de expressão por meio do mercado livre das ideias (free marketplace of ideas), em que se torna imprescindível o embate livre entre diferentes opiniões, afastando–se a existência de verdades absolutas e permitindo–se a discussão aberta das diferentes ideias, que poderão ser aceitas, rejeitadas, desacreditadas ou ignoradas; porém, jamais censuradas, selecionadas ou restringidas pelo Poder Público que deveria, segundo afirmou em divergência acompanhada pelo JUSTICE BRANDEIS, no caso Whitney v. California, 274 U.S. 357, 375 (1927), “renunciar a arrogância do acesso privilegiado à verdade”. RONALD DWORKIN, mesmo não aderindo totalmente ao mercado livre das ideias, destaca que: “a proteção das expressões de crítica a ocupantes de cargos públicos é particularmente importante. O objetivo de ajudar o mercado de ideias a gerar a melhor escolha de governantes e cursos de ação política fica ainda mais longínquo quando é quase impossível criticar os ocupantes de cargos públicos” (O direito da liberdade. A leitura moral da Constituição norte–americana. Martins Fontes: 2006, p. 324). No âmbito da Democracia, a garantia constitucional da liberdade de expressão não se direciona somente à permissão de expressar as ideias e informações oficiais produzidas pelos órgãos estatais ou a suposta verdade das maiorias, mas sim garante as diferentes manifestações e defende todas as opiniões ou interpretações políticas conflitantes ou oposicionistas, que podem ser expressadas e devem ser respeitadas, não porque necessariamente são válidas, mas porque são extremamente relevantes para a garantia do pluralismo democrático (cf. HARRY KALVEN JR. The New York Times Case: A note on the central meaning of the first amendment in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 14, p. 435). As opiniões existentes são possíveis em discussões livres, uma vez que faz parte do princípio democrático “debater assuntos públicos de forma irrestrita, robusta e aberta” (Cantwell v. Connecticut, 310 U.S. 296, 310 (1940), quoted 376 U.S at 271–72). O direito fundamental à liberdade de expressão, portanto, não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também àquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias (Kingsley Pictures Corp. v. Regents, 360 U.S 684, 688–89, 1959). A Corte Europeia de Direitos Humanos afirma, em diversos julgados, que a liberdade de expressão: “constitui um dos pilares essenciais de qualquer sociedade democrática, uma das condições primordiais do seu progresso e do desenvolvimento de cada um. Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 10.º, ela vale não só para as «informações» ou «ideias» acolhidas com favor ou consideradas como inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que ferem, chocam ou inquietam. Assim o exige o pluralismo, a tolerância e o espírito de abertura, sem os quais não existe «sociedade democrática». Esta liberdade, tal como se encontra consagrada no artigo 10.º da Convenção, está submetida a excepções, as quais importa interpretar restritivamente, devendo a necessidade de qualquer restrição estar estabelecida de modo convincente. A condição de «necessário numa sociedade democrática» impõe ao Tribunal determinar se a ingerência litigiosa corresponde a «uma necessidade social imperiosa” (ECHR, Caso Alves da Silva v. Portugal, Queixa 41.665/2007, J. 20 de outubro de 2009) A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático. Lembremo–nos que, nos Estados totalitários no século passado – comunismo, fascismo e nazismo –, as liberdades de expressão, comunicação e imprensa foram suprimidas e substituídas pela estatização e monopólio da difusão de ideias, informações, notícias e educação política, seja pela existência do serviço de divulgação da verdade do partido comunista (pravda), seja pela criação do Comitê superior de vigilância italiano ou pelo programa de educação popular e propaganda dos nazistas, criado por Goebbels; com a extinção do multiplicidade de ideias e opiniões, e, consequentemente, da Democracia. Essa estreita interdependência entre a liberdade de expressão e o livre exercício dos direitos políticos, também, é salientada por JONATAS E. M. MACHADO, ao afirmar que: “o exercício periódico do direito de sufrágio supõe a existência de uma opinião pública autônoma, ao mesmo tempo que constitui um forte incentivo no sentido de que o poder político atenda às preocupações, pretensões e reclamações formuladas pelos cidadãos. Nesse sentido, o exercício do direito de oposição democrática, que inescapavelmente pressupõe a liberdade de expressão, constitui um instrumento eficaz de crítica e de responsabilização política das instituições governativas junto da opinião pública e de reformulação das políticas públicas... O princípio democrático tem como corolário a formação da vontade política de baixo para cima, e não ao contrário” (Liberdade de expressão. Dimensões constitucionais da esfera pública no sistema social. Editora Coimbra: 2002, p. 80/81). No Estado Democrático de Direito, não cabe ao Poder Público previamente escolher ou ter ingerência nas fontes de informação, nas ideias ou nos métodos de divulgação de notícias ou, no controle do juízo de valor das opiniões dos pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores ou dos meios de comunicação e na formatação de programas jornalísticos ou humorísticos a que tenham acesso seus cidadãos, por tratar–se de insuportável e ofensiva interferência no âmbito das liberdades individuais e políticas. O funcionamento eficaz da democracia representativa exige absoluto respeito à ampla liberdade de expressão, possibilitando a liberdade de opinião, de criação artística; bem como a proliferação de informações, a circulação de ideias; garantindo–se, portanto, os diversos e antagônicos discursos – moralistas e obscenos, conservadores e progressistas, científicos, literários, jornalísticos ou humorísticos, pois, no dizer de HEGEL, é no espaço público de discussão que a verdade e a falsidade coabitam. A liberdade de expressão permite que os pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores e os meios de comunicação optem por determinados posicionamentos e exteriorizem seu juízo de valor; bem como autoriza programas humorísticos e sátiras realizados a partir de trucagem, montagem ou outro recurso de áudio e vídeo, como costumeiramente se realiza, não havendo nenhuma justificativa constitucional razoável para a interrupção durante o período eleitoral. Note–se que, em relação à liberdade de expressão exercida inclusive por meio de sátiras, a Corte Europeia de Direitos Humanos referendou sua importância no livre debate de ideias, afirmando que “a sátira é uma forma de expressão artística e de comentário social que, além da exacerbação e a deformação da realidade que a caracterizam, visa, como é próprio, provocar e agitar”. Considerando a expressão artística representada pela sátira, a Corte entendeu que: “sancionar penalmente comportamentos como o que o requerente sofreu no caso pode ter um efeito dissuasor relativamente a intervenções satíricas sobre temas de interesse geral, as quais podem também desempenhar um papel muito importante no livre debate das questões desse tipo, sem o que não existe sociedade democrática”. (ECHR, Caso Alves da Silva v. Portugal, Queixa 41.665/2007, J. 20 de outubro de 2009) A plena proteção constitucional da exteriorização da opinião (aspecto positivo) não significa a impossibilidade posterior de análise e responsabilização de pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores por eventuais informações injuriosas, difamantes, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas, mas não permite a censura prévia pelo Poder Público. Nesse cenário, a livre circulação de pensamentos, opiniões e críticas visam a fortalecer o Estado Democrático de Direito e à democratização do debate no ambiente eleitoral, de modo que a intervenção da Justiça Eleitoral deve ser mínima em preponderância ao direito à liberdade de expressão dos candidatos. Ou seja, a atuação da Justiça Eleitoral deve coibir práticas abusivas ou divulgação de notícias falsas, de modo a proteger o regime democrático, a integridade das Instituições e a honra dos candidatos, garantindo o livre exercício do voto (TSE, RESpe 0600025–25.2020 e AgR no Arespe 0600417–69, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES). A Constituição Federal não permite aos pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores, inclusive em período de propaganda eleitoral, a propagação de discurso de ódio, ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático (CF, art. 5º, XLIV, e art. 34, III e IV), tampouco a realização de manifestações nas redes sociais ou através de entrevistas públicas visando ao rompimento do Estado de Direito, com a extinção das cláusulas pétreas constitucionais – Separação de Poderes (CF, art. 60, §4º), com a consequente instalação do arbítrio. A Constituição Federal consagra o binômio “LIBERDADE e RESPONSABILIDADE”; não permitindo de maneira irresponsável a efetivação de abuso no exercício de um direito constitucionalmente consagrado; não permitindo a utilização da “liberdade de expressão” como escudo protetivo para a prática de discursos de ódio, antidemocráticos, ameaças, agressões, infrações penais e toda a sorte de atividades ilícitas. Liberdade de expressão não é Liberdade de agressão! Liberdade de expressão não é Liberdade de destruição da Democracia, das Instituições e da dignidade e honra alheias! Liberdade de expressão não é Liberdade de propagação de discursos mentirosos, agressivos, de ódio e preconceituosos! A lisura do pleito deve ser resguardada, sob pena de esvaziamento da tutela da propaganda eleitoral (TSE, Representação 0601530–54/DF Rel. Min, LUÍS FELIPE SALOMÃO, DJe DE 18.3.2021), e, portanto, as competências constitucionais dessa CORTE ELEITORAL, inclusive no tocante à fiscalização, são instrumentos necessários para garantir a obrigação constitucional de se resguardar eleições livres e legítima (TSE, RO–EL 2247–73 e 1251–75, redator para Acórdão Min. ALEXANDRE DE MORAES). A liberdade de expressão não permite a propagação de discursos de ódio e ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado de Direito (STF, Pleno, AP 1044, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES), inclusive pelos pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores antes e durante o período de propaganda eleitoral, uma vez que a liberdade do eleitor depende da tranquilidade e da confiança nas instituições democráticas e no processo eleitoral (TSE, RO–EL 0603975–98, rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe de 10/12/2021). Os excessos que a legislação eleitoral visa a punir, sem qualquer restrição ao lícito exercício da liberdade dos pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores, dizem respeito aos seguintes elementos: a vedação ao discurso de ódio e discriminatório; atentados contra a Democracia e o Estado de Direito; o uso de recursos públicos ou privados, a fim de financiar campanhas elogiosas ou que tenham como objetivo denegrir a imagem de candidatos; a divulgação de notícias sabidamente inverídicas; a veiculação de mensagens difamatórias, caluniosas ou injuriosas ou o comprovado vínculo entre o meio de comunicação e o candidato. A Constituição Federal não autoriza, portanto, a partir de mentiras, ofensas e de ideias contrárias à ordem constitucional, a Democracia e ao Estado de Direito, que os pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores propaguem inverdades que atentem contra a lisura, a normalidade e a legitimidade das eleições. A análise do caso demonstra a existência de plausibilidade jurídica do pedido, ao menos em juízo de cognição sumária; estando presentes os elementos que evidenciem a probabilidade do direito, tradicionalmente conhecida como fumus boni iuris, e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, o chamado periculum in mora; necessários para a concessão da medida liminar. A narrativa formulada pelo Representante pode ser segmentada em 3 (três) conjuntos de fatos: (1º) ilações sobre o envolvimento entre o grupo criminoso Primeiro Comando da Capital (PCC), o PT e o assassinato do ex–Prefeito Celso Daniel em 2002; (2º) supostas falas do pré–candidato Luis Inácio Lula da Silva igualando os pobres ao papel higiênico; e (3º) manifestações do ex–presidente sugerindo a existência de uma associação entre o PT, o fascismo e o nazismo. Em relação ao primeiro ponto, como é de conhecimento público e notório, o assassinato do ex–prefeito Celso Daniel se trata de caso encerrado perante o Poder Judiciário, com os responsáveis devidamente processados e julgados, estando cumprindo pena. Também é fato conhecido e amplamente divulgado que o Ministério Público de São Paulo encerrou definitivamente as apurações, não havendo notícia do envolvimento do Partido dos Trabalhadores ou de seus membros. Esse contexto evidencia, com clareza e objetividade, a divulgação de fatos sabidamente inverídicos. No vídeo divulgado pelo Canal “Dr. News”, da plataforma Youtube, o Deputado Federal Otoni Moura de Paulo Júnior promove uma ligação direta entre a morte de Celso Daniel e a “cúpula petista”, que supostamente aproveitava do dinheiro proveniente atividades criminosas praticadas pelo PCC. O Parlamentar chega a afirmar que “o mesmo STF que liberou o Lula, que liberou o Lula ladrão, é o mesmo STF que acolhe agora essa delação de Marcos Valério mostrando a sinergia do mal que havia entre o PT e o PCC”. Referido vídeo é acompanhado de texto que ratifica a desinformação, nos seguintes termos: “Descobriram PROVAS do envolvimento de LULA, STF com PCC para Golpe milionário...”. Patente, portanto, a participação do Deputado Federal Otoni Moura de Paulo Júnior na disseminação das notícias fraudulentas veiculadas pelo 'canal de youtube DR News”. A divulgação feita pelo Jornal da Cidade, por meio de sua revista “A Verdade”, ilustra o pré–candidato Luis Inácio Lula da Silva vestido com uma faixa, lembrando a presidencial, contendo as siglas do Partido dos Trabalhadores e da organização Criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), em clara alusão ao pleito eleitoral que se avizinha, chegando a propor que o ex–presidente seja “o candidato do crime organizado”. Nesse contexto, nesse juízo preliminar, a responsabilidade pela veiculação e divulgação das notícias fraudulentas direciona–se ao canal de youtube 'Dr News', ao Jornal da Cidade (revista 'A Verdade') e ao Deputado Federal Otoni Moura de Paulo Júnior. A divulgação de fato sabidamente inverídico, com aparente finalidade de vincular a figura do pré–candidato a atividades de organização criminosa, como no caso, parece suficiente a configurar propaganda eleitoral negativa, na linha da jurisprudência desta CORTE, segundo a qual a configuração do ilícito pressupõe 'ato que, desqualificando pré–candidato, venha a macular sua honra ou a imagem ou divulgue fato sabidamente inverídico' (AgR–REspe 0600016–43, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO). No que diz respeito aos outros dois fatos, envolvendo falas do pré–candidato Luis Inácio Lula da Silva, conforme indicado pelo Autor, já tiveram a sua veracidade desmentida em diversos meios de comunicação, restando assentado tratar–se de montagem que utiliza trechos recortados de falas e vídeos para passar a falsa ideia de que Lula teria comparado pobres com papel higiênico, bem relacionado o Partido dos Trabalhadores ao fascismo e ao nazismo. Nesse sentido, há inúmeras checagens trazidas pelo Autor. O Representante comprovou que o vídeo envolvendo o episódio do papel higiênico foi publicado por Max Guilherme, bem como que o Senador Flávio Bolsonaro, a Deputada Carla Zambelli, o veículo de comunicação “Minas Acontece”, Cláudio Carvalho, Hélio Lopes, o canal do YouTube “Políticabrasil24”, o usuário “Titio 2021” do aplicativo “gettr” , também o compartilharam em suas redes sociais. A mídia sobre a associação ao fascismo e ao nazismo foi compartilhado pelo perfil “Zaquebrasil”, da plataforma Gettr e por Gilney Gonçalves. Em juízo preliminar, antes da instrução probatória, não há como concluir quem seja o responsável pela edição e montagem dos vídeos, questão esta que demanda esclarecimento nesse sentido, ficando postergado para o mérito. Entretanto, embora não se tenha notícia sobre quem, de fato, produziu os vídeos, diante do nítido conteúdo fraudulento, há imediata necessidade de proibir aqueles que publicaram de os manterem no ar ou continuarem em sua propagação, notadamente diante do nítido caráter eleitoral. Há nítida percepção de que as mentiras divulgadas objetivam, de maneira fraudulenta, persuadir o eleitorado a acreditar que um dos pré–candidatos e seu partido, além de terem participaram da morte do ex–prefeito Celso Daniel, possuem ligação com o crime organizado, com o fascismo e com o nazismo, tendo, ainda igualado a população mais desafortunada ao papel higiênico. O sensacionalismo e a insensata disseminação de conteúdo inverídico com tamanha magnitude pode vir a comprometer a lisura do processo eleitoral, ferindo valores, princípios e garantias constitucionalmente asseguradas, notadamente a liberdade do voto e o exercício da cidadania. Ante o exposto, DEFIRO A LIMINAR (...) Esse mesmíssimo entendimento foi reiterado pelo Plenário desta Corte, em temática correlata à ora discutida na presente representação, no julgamento da Rp 0600557–60, red. p/ acórdão Ministro Ricardo Lewandowski, em que fiquei vencida isoladamente. Isso significa, portanto, que o caso destes autos é de reiteração, às vésperas das eleições, de divulgação de conteúdo expressa e judicialmente já reconhecido como desinformativo e ofensivo, o que impõe sua imediata remoção. Ante todo o exposto, defiro o pedido de tutela provisória de urgência, para determinar a remoção IMEDIATA E URGENTE do conteúdo questionado, que se encontra disponibilizado na Internet nas URLs: https://www.youtube.com/watch?v=JrdOiPHn644 https://www.youtube.com/watch?v=A7V3y7QTVPQ https://twitter.com/FlavioBolsonaro/status/1575499266982039552 https://twitter.com/Zambelli2210/status/1575326414735384576 https://twitter.com/EdRaposo_/status/1575438775106387968 https://twitter.com/MonicaMachado38/status/1575389639371898881 https://twitter.com/TerraBrasilnot/status/1575481561461424128 https://t.me/MOVIMENTOANTINOVONORMAL/209107 https://t.me/TEXUGO_DO_MEL/1600688 https://t.me/Conservadorismo1/73530 Oficiem–se COM URGÊNCIA os provedores de aplicação, para cumprimento da determinação judicial de remoção, no prazo de 24h, conforme preceito normativo previsto no art. 17, § 1º–B, da Res.–TSE nº 23.608/2019, aplicando–se multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em caso de descumprimento. Nos termos do art. 2º da Portaria–TSE nº 791/2022, encaminhem–se os autos à presidência desta Corte para que esta decisão seja submetida ao referendo do E. Plenário deste Tribunal. Proceda–se à citação dos representados para que apresentem resposta, no prazo de 2 (dois) dias, nos termos do art. 18 da Res.–TSE nº 23.608/2019. Transcorrido o prazo para apresentação de resposta, intime–se o representante do Ministério Público Eleitoral (MPE) para que se manifeste na forma do art. 19 da referida resolução. Publique–se. Brasília, 29 de setembro de 2022 (19h40). Ministra Maria Claudia BucchianeriRelatora
Data de publicação | 29/09/2022 |
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PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60130762 |
NUMERO DO PROCESSO | 6013076220225999872 |
DATA DA DECISÃO | 29/09/2022 |
ANO DA ELEIÇÃO | Não especificado |
SIGLA DA CLASSE | Rp |
CLASSE | REPRESENTAÇÃO |
UF | DF |
MUNICÍPIO | BRASÍLIA |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Propaganda eleitoral irregular |
PARTES | CARLA ZAMBELLI SALGADO, COLIGAÇÃO BRASIL DA ESPERANÇA, EDNARDO D AVILA MELLO RAPOSO, FLAVIO NANTES BOLSONARO, MARA CRISTINA GABRILLI, MICARLA ROCHA DA SILVA MELO, Perfil '@monicamachado38' no Twitter, Perfil 'AJ' no grupo 'MOVIMENTO ANTI-NOVO NORMAL' no Telegram, Perfil 'Rodrigo' no grupo 'Conhecimento Conservador' no Telegram, Perfil 'Vinicius Novais' no grupo 'BOLSONARO PRESIDENTE' no Telegram;, RADIO AURI VERDE DE BAURU LTDA |
PUBLICAÇÃO | MURAL |
RELATORES | Relator(a) Min. Maria Claudia Bucchianeri |
Projeto |