TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549) Nº 0600165–02.2021.6.20.0000 (PJe) – PARNAMIRIM – RIO GRANDE DO NORTERELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAESRECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORALRECORRIDA: RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOSAdvogados do(a) RECORRIDA: ERICK WILSON PEREIRA – RN0002723, THALES DE LIMA GOES FILHO – RN9380–A DECISÃO Trata–se de Recurso... Leia conteúdo completo
TSE – 6001650220216200192 – Min. Alexandre de Moraes
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549) Nº 0600165–02.2021.6.20.0000 (PJe) – PARNAMIRIM – RIO GRANDE DO NORTERELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAESRECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORALRECORRIDA: RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOSAdvogados do(a) RECORRIDA: ERICK WILSON PEREIRA – RN0002723, THALES DE LIMA GOES FILHO – RN9380–A DECISÃO Trata–se de Recurso Especial Eleitoral interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte (TRE/RN) que, por maioria, em sede de Mandado de Segurança, deferiu a ordem para cassar a decisão por meio da qual o Juízo Eleitoral, na Ação Penal nº 0600197–04.2021.6.20.0001, determinou, cautelarmente, o afastamento de Rhalessa Cledylane Freire dos Santos do exercício do cargo de Vereadora do Município de Parnamirim/RN, pelo prazo de cento e oitenta dias. O acórdão restou assim ementado: MANDADO DE SEGURANÇA – ELEIÇÕES 2020 – MEDIDA CAUTELAR CRIMINAL – AFASTAMENTO DO CARGO DE VEREADOR – PRAZO DE 180 DIAS – ORDEM JUDICIAL – ALEGAÇÃO DE FLAGRANTE ILEGALIDADE – AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO – OBSTRUÇÃO DA INSTRUÇÃO – REITERAÇÃO DELITIVA – MERA EXPECTATIVA – AUSÊNCIA DE CONCRETUDE FÁTICA – NÃO DEMONSTRAÇÃO – REQUISITOS PARA DEFERIMENTO DA CAUTELAR – NÃO PREENCHIMENTO – ILEGALIDADE DA ORDEM – DIREITO LÍQUIDO E CERTO CONFIGURADO – NULIDADE DA DECISÃO – CONFIRMAÇÃO DA LIMINAR – CONCESSÃO DA SEGURANÇA. Cinge–se a controvérsia à decisão judicial, proferida em 29/07/2021, pelo Juízo Eleitoral da 1ª Zona da Capital, no bojo do processo nº 0600197–04.2021.6.20.0001, que determinou o afastamento da impetrante do exercício do cargo eletivo de Vereador do município de Parnamirim/RN, pelo prazo de 180 dias, com fundamento no art. 282, I, do Código de Processo Penal. Para que o Magistrado possa aplicar, validamente, as medidas cautelares previstas no artigo 319, VI, do Código de Processo Penal, dentre as quais o afastamento da função pública, necessária a demonstração de sua necessidade, bem como o liame das funções exercidas com os atos sob investigação ou processamento e, ainda, que estas se mostrem suficientes para a garantia da ordem pública e/ou da ordem econômica, da instrução criminal e aplicação da lei penal, não constituindo sua imposição efeito automático da prática da infração penal. A leitura da decisão atacada leva à inexorável conclusão de que o Juízo impetrado deixou claramente de indicar as razões pormenorizadas e concretas que o levaram a decretar a medida acautelatória de afastamento do cargo. Na passagem que chegaria mais perto de uma desejável fundamentação, o Juízo afirma que “a manutenção da Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS que já, pelo menos aparentemente, praticou a conduta delineada na exordial, pode dificultar sobremaneira ainda mais a instrução criminal, já que trata–se de cargo com função de poder, com alta hierarquia, capaz de exercer influência e quiça, até mesmo temor reverencial sobre servidores públicos e funcionários daquela Casa Legislativa e até mesmo a população local”. A medida cautelar decretada aparenta adotar contornos excessivos, pois o fato apontado (“exercer influência e quiçá, até mesmo temor reverencial sobre servidores públicos e funcionários daquela Casa Legislativa e até mesmo a população local”) não ostenta nenhuma concretude fática, mas mera expectativa do Juízo ou do Órgão acusador. Quanto à probabilidade de reiteração delitiva como fundamento da cautelar, faz–se imprescindível a apresentação de elementos mínimos que apontem a continuidade do comportamento delitivo da acusada ou a iminência de assim proceder. No caso, tem–se que a atuação delituosa da impetrante se deu em torno de um único fato em apuração, a saber, o desvio de recursos públicos, por meio de uma única emenda parlamentar, depositada em favor da associação investigada em 31/12/2019, ainda na legislatura anterior. Segundo já decidiu o STJ, “a despeito da ligação, em tese, do aludido crime com a função pública ocupada e de ter a Paciente continuado a exercer o cargo em razão da sua reeleição, não se pode afirmar, hipoteticamente e de forma genérica, que a sua permanência no exercício do mandato pressupõe um risco à apuração dos fatos ou de reiteração das supostas práticas criminosas, pois não há notícias atuais sobre o cometimento de novos delitos ou de qualquer tentativa de obstrução da instrução processual por parte da Acusada” (HC 553310/SP, Relatora Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, DJe 27/11/2020). Na mesma linha de entendimento, o TSE já se manifestou, assentando que “Embora o magistrado possa, diante de fatos concretos que possam comprometer o andamento da instrução criminal, decretar a medida prevista no art. 319, VI, do Código de Processo Penal no caso dos autos, o ato se revestiu de manifesta ilegalidade, seja por violar o princípio da soberania popular, antecipando os efeitos das investigações judiciais eleitorais, seja porque não se vislumbra, na espécie, justo receio da utilização dos cargos públicos para a prática de infrações penais” (RHC 51542, Relator Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 09/06/2017). Importa também considerar que não mais subsiste um dos motivos que fundamentam o decisum atacado, qual seja, o fato de que “os órgãos de persecução penal estão impedidos de periciarem os malotes pertinentes a Vereadora em tela e a Câmara Municipal, em razão da decisão do Juiz Relator do Tribunal Regional Eleitoral no Mandado de Segurança nº 0600088–90.2021.6.20.0000”, haja vista que tal decisão (proferida pelo juiz então relator do feito, o Dr. Daniel Maia) foi revogada por esta Corte, no julgamento do aludido mandamus, realizado em 17/08/2021, em conjunto com os MS nºs 0600089–75 e 0600094–97, possibilitando–se à acusação o pleno conhecimento da documentação apreendida e o adequado exercício do seu mister na apuração dos fatos. Assim, ao menos até o presente momento e tendo como parâmetro os fatos até aqui colacionados e constantes das decisões recorridas, não foram expostas situações fáticas a indicar que o exercício da função de vereador, por si só, causaria alguma influência na continuidade das infrações penais pela impetrante, não podendo tal situação ser presumida, sob o risco do emprego da medida cautelar como antecipação de pena. Na eventualidade de outras provas emergirem da abertura desses malotes ou do comportamento dos acusados, nada impedirá o Ministério Público de requerer novamente em Juízo o afastamento da ora impetrante, mediante indicação de motivos fáticos e circunstanciais que justifiquem tal medida, tais como notícias atuais sobre o cometimento de novos delitos ou de qualquer tentativa de obstrução da instrução processual, os quais constituirão a indispensável fundamentação da respectiva decisão judicial. É de se ter como excessiva, ante a gravidade da medida decretada e tendo em vista que a impetrante já ficou afastada do cargo por 30 (trinta) dias, a decisão por meio da qual o Juízo deferiu a liminar requerida, por entendê–la necessária para “resguardar o Erário do Município de Parnamirim bem como impedir a prática ilegal, em tese, realizada por ela [impetrante] quando do exercício da vereança entre 2019 e 2020, de se repetir em virtude da função de poder que detém”. Concessão da segurança com a confirmação da liminar concedida anteriormente. Nas razões recursais, o Recorrente sustenta, em síntese: i) 'no caso em apreço, nem de longe restou configurada teratologia ou manifesta ilegalidade na decisão proferida pelo Juízo da 1ª Zona Eleitoral e impugnada no mandado de segurança em referência, razão pela qual o mandado de segurança em questão nem sequer deveria ter sido conhecido'; ii) 'não se está diante das hipóteses autorizados do excepcional manejo de mandado de segurança para atacar decisão judicial'; iii)violação ao art. 282, I e II, §§ 1º a 6º, c/c art. 319, VI, do Código de Processo Penal, pois, 'a partir de robusta prova colacionada pelo Parquet Eleitoral, as quais, inclusive, embasaram o ajuizamento da mencionada ação penal, foram apresentados fortes e concatenados indícios quanto à utilização do mandato eletivo ocupado pela impetrante, ora recorrida, para obtenção de recursos financeiros de forma fraudulenta, mediante o uso da Associação do Centro Social de Cultura e Lazer da Criança e do Adolescente (PROAMFA)'; iv) a decisão de primeiro grau lastreou–se 'na constatação de que a recorrida, juntamente com outros agentes políticos e particulares, implementou, no seio da câmara de vereadores do Município de Parnamirim/RN, uma verdadeira associação criminosa que, de forma organização e ardilosa, especializou–se na apropriação de recursos públicos'; v) o afastamento cautelar da recorrida atende 'à necessidade de resguardo à ordem pública, seriamente comprometida pela reiteração das práticas delitivas' , e à instrução criminal, 'dada a influência exercida pela impetrante no seio da Câmara Municipal'. O Vice–Procurador–Geral Eleitoral manifesta–se pelo provimento do Recurso Especial (ID 157444688). Em 26/4/2022, tendo em vista a ocorrência de equívoco na intimação do advogado da Recorrida, deferi pedido da defesa, determinando nova intimação para apresentação de contrarrazões ao Recurso Especial. Rhalessa Cledylane Freire dos Santos, em contrarrazões, requer o desprovimento do Recurso Especial. Afirma que a matéria objeto do Recurso já foi analisada por esta CORTE no Recurso Especial nº 0600179–83, ao qual o Relator, Ministro BENEDITO GONÇALVES, por decisão monocrática, negou seguimento e manteve o acórdão do TRE/RN que, no julgamento de mandado de segurança, deferiu a ordem para afastar a medida cautelar de afastamento do cargo imposta ao também vereador Ítalo de Brito Siqueira. No mais, argumenta inexistir substrato fático que justifique a medida cautelar. É breve o relato. Decido. De início, verifica–se que a controvérsia referente à admissibilidade do Mandado de Segurança impetrado na origem confunde–se com o próprio mérito do Recurso Especial, por pressupor a análise sobre a existência de teratologia ou flagrante ilegalidade nos fundamentos da decisão de primeiro grau. Consta dos autos que o Ministério Público ofereceu denúncia contra a Recorrida e outros acusados, imputando–lhes a prática dos crimes previstos nos artigos 299 e 312 do Código Penal e 350 do Código Eleitoral, e requereu seu afastamento cautelar do cargo de vereador. O Juízo da 1ª Zona Eleitoral de Natal/RN, em 29/7/2021, deferiu o pedido do Parquet, sob os seguintes fundamentos (ID 156992688): II.1. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA VEREADORA RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS Analisando a quota que tratou do pedido de afastamento da Vereadora Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS, entendo que estão presentes os requisitos que autorizam a medida cautelar pleitada. Senão veja–se. Conforme demonstrou–se na peça exordial acusatória, a denunciada RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS, vereadora reeleita, realizou a indicação da Emenda Aditiva nº 036/2018, no valor de R$ R$ 20.000,00 (vinte mil reais), destinada ao Projeto Amigos da Família – PROAMFA, através da subvenção social nº 201911036702, depositada na conta da Associação em 31 de dezembro de 2019. Todavia, parte dos recursos públicos retornaram para a vereadora RHALESSA, consoante se extraiu das conversas ocorridas entre ela e o PASTOR ALEX no período que compreende o dia 28/12/2019 até 20/04/2020 no aplicativo WhatsApp. Os diálogos expressos, envolvendo a Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS, o Sr. ÍTALO VEREADOR e Sr. Pastor ALEX para o retorno das emendas ao bolso da vereadora RHALESSA, os quais estão documentados quota (ID nº 91922708 – Pág. 6–8) indicando os pedidos expressos de pagamentos por parte da Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS ao Sr. ÍTALO VEREADOR, bem como conversas entre o Pastor ALEX e o Sr. Sr. ÍTALO VEREADOR indicando o cuidado para não deixar rastros do ilícito, dando uma aparência lícita ao recebimento dos valores por parte da vereadora RHALESSA. A referida Emenda Aditiva nº 036/2018, no valor de R$ R$ 20.000,00 (vinte mil reais) conseguida em virtude do cargo de vereadora que ocupa a Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS quando analisada em conjunto aos diálogos que indicam os pedidos expressos da Sra. Sra. RHALESSA e devolução de parte de tais valores a própria proponente da emenda em favor da Associação PROAMFA, somados a existência de notas fiscais falsas existentes na Prestação de Contas da então candidata são indícios fortíssimos e suficientemente capazes de demonstrar o uso do cargo pela vereadora de forma desvirtuada do compromisso republicano e de defesa do interesse público. Ou seja, a vereadora RHALESSA CLEDYLANE, aparentemente, utilizava–se das prerrogativas decorrentes do cargo eletivo que ocupava, qual seja, obter e destinar emendas aditivas ao orçamento do Município de Parnamirim para desviar dinheiro público, recebendo, após o pagamento aos fornecedores dos serviços e produtos a Associação PROAMFA, em retorno, parte dos valores de tais emendas, havendo nos autos a comprovação de emissão nota fiscal ideologicamente falsa, por produtos supostamente adquiridos pela Associação beneficiada pela subvenção social, de modo a disfarçar a operação. Inclusive, conforme consta do diálogo entre a vereadora RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS e o Pastor ALEX constante nos autos (ID nº 91922708 – Pág. 7–8) verifica–se a insistência e o pedido da Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS para receber os valores “em mãos”. Pois bem, as regras que regulamentam a concessão de medidas cautelares estão previstas no art. 282 do Código Penal: Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando–se a: I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; Considerando que os órgãos de persecução penal estão impedidos de periciarem os malotes pertinentes a Vereadora em tela e a Câmara Municipal, em razão da decisão do Juiz Relator do Tribunal Regional Eleitoral no Mandado de Segurança nº 0600088–90.2021.6.20.0000, malotes estes em que constam o material apreendido na busca e apreensão deflagrada pela Operação Dizimo, o que impede o aprofundamento e elucidação de parte da investigação, a manutenção da Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS que já, pelo menos aparentemente, praticou a conduta delineada na exordial, pode dificultar sobremaneira ainda mais a instrução criminal, já que trata–se de cargo com função de poder, com alta hierarquia, capaz de exercer influência e quiça, até mesmo temor reverencial sobre servidores públicos e funcionários daquela Casa Legislativa e até mesmo a população local. Além disso, tendo estudado, cuidadosamente, todos os documentos trazidos pelo denunciante (IDs nº 91922708, 91922710, 91922712, 91922713, 91922714, 91922723, 91922726, 91922729 e seguintes), compreendo, sem fazer um juízo conclusivo, que é verossímil a tese do Parquet de que modus operandi do esquema criminoso consiste, exatamente, em “transferir dinheiro público para entidades privadas e revertê–lo para os próprios vereadores indicadores da emenda parlamentar aditiva”. Desta sorte, é medida prudente deste Juízo, mirando resguardar o Erário do Município de Parnamirim bem como impedir a prática ilegal, em tese, realizada por ela quando do exercício da vereança entre 2019 e 2020, de se repetir em virtude da função de poder que detém, exercer o seu poder cautelar de determinar o afastamento da vereadora RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS, pelo prazo de 180 dias. É este, inclusive, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, quando decidiu que “se os delitos investigados guardam relação direta com o exercício do cargo, como na espécie, o afastamento do exercício da atividade pública constitui medida necessária para evitar a reiteração delitiva, bem como para impedir eventual óbice à apuração dos fatos”. (RHC 79.011/MG, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. 19/09/2017, DJe 27/9/2017). Isto posto, em relação a medida cautelar de AFASTAMENTO DAS FUNÇÕES PÚBLICAS da Vereadora Sra. RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS, por 180 dias, cabe o deferimento. Vê–se, assim, que o magistrado concluiu pela necessidade da medida cautelar em razão: i) dos indícios da prática dos crimes, considerado o 'uso do cargo pela vereadora de forma desvirtuado do compromisso republicano e de defesa do interesse público'; ii) da impossibilidade de realização de perícia nos elementos de convicção, obtidos em busca e apreensão, concernentes à Vereadora e à Câmara Municipal, tendo em vista liminar proferida pelo Relator do Mandado de Segurança nº 0600088–90.2021.6.20.0000, 'o que impede o aprofundamento e elucidação de parte da investigação'; iii) da possibilidade de a Recorrida dificultar a instrução criminal, 'já que se trata de cargo com função de poder, com alta hierarquia, capaz de exercer influência e quiça, até mesmo temor reverencial sobre servidores públicos e funcionários daquela Casa Legislativa e até mesmo a população local'; iv) da prudência da medida para impedir que os delitos, supostamente ocorridos durante o exercício do cargo entre 2019 e 2020, se repitam. Sobre o tema, a doutrina aponta que imposição de qualquer medida cautelar exige a existência de motivação idônea, que compreenda a 'demonstração concreta da hipótese da medida cautelar, dos seus pressupostos (o fumus commissi delicti, que se traduz na existência da infração e nos indícios de autoria); requisitos (uma das situações de perigo, legalmente tipificadas, geradas pelo estado de liberdade do imputado – o periculum libertatis)' (CAPEZ, Rodrigo. Prisão e medidas cautelares diversas. A individualização da medida cautelar no processo penal. p. 438). Isso significa, portanto, que a prova da existência do crime e os indícios de autoria, isoladamente considerados, não autorizam a imposição de nenhuma medida cautelar pessoal, revelando–se indispensável a demonstração concreta da situação de risco criada pela liberdade do acusado que evidencie a necessidade da cautelar (CAPEZ, Rodrigo. op. cit. p. 449). No mesmo sentido, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL firmou o entendimento segundo o qual, “de acordo com o art. 282 do Código de Processo Penal, as medidas diversas da prisão poderão ser aplicadas desde que demonstrada: (i) necessidade apara aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; e (ii) adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado” (AgR–HC 158.732, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe de 29/11/2018). Na mesma linha: AgR–HC 182.282, Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe de 26/5/2020; AgR–HC 187.505, Rel. Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, DJe de 5/7/2021. Na hipótese dos autos, é certo que a possibilidade de a Recorrida dificultar a instrução criminal, em razão do exercício de 'cargo com função de poder, com alta hierarquia, capaz de exercer influência e quiça, até mesmo temor reverencial sobre servidores públicos e funcionários daquela Casa Legislativa e até mesmo a população local', encontra–se baseada em mera presunção, inexistindo elemento fático que demonstre a prática de qualquer ato da acusada visando à interferência na produção probatória. Dessa forma, esse argumento, desacompanhadao da indicação de fato específico atribuído à Recorrida, não constitui fundamentação idônea, uma vez que a efetiva necessidade da imposição da medida cautelar com a finalidade de garantia a instrução processual deve ser demonstrada mediante elementos concretos, não podendo apoiar–se em presunções (HC 126.846, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe de 6/4/2015; HC 124.000. Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, DJe de 10/6/2016; HC 90.862, Rel. Min. EROS GRAU, Segunda Turma, DJ de 27/4/2007; HC 85.583, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, DJ de 16/9/2005). De igual modo, a apontada impossibilidade de realização de perícia nos elementos de convicção obtidos em busca apreensão, decorrente de decisão liminar proferida pelo Tribunal Regional Eleitoral, também não autoriza a imposição da cautelar, uma vez que a situação fática invocada não mais subsiste, pois, como ressaltado no acórdão recorrido, 'tal decisão (proferida pelo juiz então relator do feito, Dr. Daniel Maia) foi revogada por esta Corte, no julgamento do aludido mandamus, realizado em 17/08/2021, em conjunto com os MS nºs 0600089–75 e 06000094–97, possibilitando–se à acusação o pleno conhecimento da documentação apreendida e o adequado exercício do seu mister na apuração dos fatos'. Nada obstante, no que concerne à necessidade da medida para evitar a reiteração delitiva, o magistrado indicou o modus operandi utilizado para a prática dos atos delituosos, consistente em “transferir dinheiro público para entidades privas e revertê–lo para os próprios vereadores indicadores da emenda parlamentar aditiva”, bem como a vinculação direta dos crimes com o cargo desempenhado pela acusada. Vê–se, assim, que, no ponto, a medida cautelar de afastamento do cargo não está lastreada em meras conjecturas, mas nas circunstâncias concretas dos crimes, as quais evidenciam a gravidade das condutas e, consequentemente, a adequação e a necessidade da medida, notadamente em razão da relação dos delitos, cometidos contra Administração Pública, e o mandato eletivo. No mesmo sentido, a jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL firmou o entendimento no sentido de que as circunstâncias relacionadas ao fato e a gravidade concreta dos crimes demonstram “a necessidade da medida ante o justo receio de reiteração delitiva, notadamente porque é acusado da prática de crime ligado à atividade que até então exercia” (HC 178.389, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Red. p/ acórdão Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, DJe de 30/11/2020). Ainda: HC 158.217, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Red. p/ acórdão Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, DJe de 12/2/2020; AgR–ED–HC 180.241, Rel. Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, DJe de 24/9/2021; HC 179.306, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, DJe de 22/4/2020, assim ementado: HABEAS CORPUS – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – ÓBICE – INEXISTÊNCIA. Impróprio é ter a possibilidade de o ato ser atacado mediante recurso extraordinário como a revelar inadequada a impetração. HABEAS CORPUS – CABIMENTO. As medidas cautelares diversas da prisão implicam, de forma indireta, restrição ao direito de ir e vir, e, caso descumpridas, a teor do § 4º do artigo 282 do Código de Processo Penal, podem ensejar a custódia provisória, revelando–se suscetíveis de impugnação mediante o habeas corpus. CAUTELAR DIVERSA – SUSPENSÃO DE ATIVIDADE ECONÔMINCA. Uma vez assentada a vinculação dos supostos crimes praticados com o exercício da função, mostra–se viável a aplicação da medida cautelar alusiva à suspensão de atividade econômica. (HC 179.306, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, DJe de 22/4/2020). Sendo assim, inexistindo flagrante ilegalidade na decisão de primeiro grau, entendo assistir razão ao Ministério Público. Por fim, embora a Recorrida, nas contrarrazões, mencione que, por meio de decisão monocrática, o Ministro BENEDITO GONÇALVES negou provimento ao Recurso Especial do Ministério Público e manteve o acórdão do TRE/RN que, em sede de mandado de segurança, afastou a medida de afastamento do cargo imposta em primeira instância em desfavor do vereador Italo de Brito Siqueira, não houve qualquer indicação da identidade de situações jurídicas dos acusados, de modo que tal ato decisório não impede, em relação à acusada Rhalessa Cledylane Freire dos Santos, o restabelecimento da medida cautelar. Diante do exposto, com base no art. 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, DOU PROVIMENTO ao Recurso Especial, para restabelecer a decisão de primeira instância que determinou o afastamento cautelar da Recorrida do cargo de vereador, por 180 dias. Publique–se. Intime–se. Brasília, 12 de julho de 2022. Ministro ALEXANDRE DE MORAES Relator
Data de publicação | 12/07/2022 |
---|---|
PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60016502 |
NUMERO DO PROCESSO | 6001650220216200192 |
DATA DA DECISÃO | 12/07/2022 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2020 |
SIGLA DA CLASSE | REspEl |
CLASSE | RECURSO ESPECIAL ELEITORAL |
UF | RN |
MUNICÍPIO | PARNAMIRIM |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Direito de resposta |
PARTES | Ministério Público Eleitoral, RHALESSA CLEDYLANE FREIRE DOS SANTOS |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Alexandre de Moraes |
Projeto |