TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) N. 0600849–45.2022.6.00.0000 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relatora: Ministra Cármen Lúcia Representante: Coligação Brasil da Esperança Advogados(as): Eugênio José Guilherme de Aragão e outros(as) Representados(as): Flávio Nantes Bolsonaro e outros(as) DECISÃO REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO A PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PRETENSÃO DE REMOÇÃO DE VÍDEO VEICULADO NO TWITTER, TIKTOK E KWAI. TÉRMINO DO PROCESSO ELEITORAL. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. PEDIDO DE COMINAÇÃO DE MULTA. DESCABIMENTO EM CASO DE PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA E SABIDAMENTE INVERÍDICA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. Relatório 1. Representação, com requerimento liminar, ajuizada pela Coligação Brasil da Esperança contra Flávio Nantes Bolsonaro, Eduardo Nantes Bolsonaro, Damares Regina Alves, Luciano Hang, Gilberto Silva, Milton Neves Filho, Rodrigo Lorenzini Zucco, Andre Luis Silva de Miranda, Carina Belome Lemes, Odécio Rodrigues Carneiro, Agacy Vieira de Melo Junior, Ricardo Arruda Nunes, Silvio Navarro Perejon Júnior, Eduardo Cavendish Carvalho, Silvio Luiz Perez Machado de Souza; pelos responsáveis pelos perfis @kimpaim no Twitter, @taokei no Twitter, @RoseBacellar no Twitter, @viniciuscpf82 no Twitter, @juniormelorn_ no Twitter, @direitaparanaoficial no Facebook, @MAvancaBrasil no Twitter, @EMorengueira no Twitter, @juniormelorn no Twitter, @Paullo_Gustavo no Twitter, @Pacheco_Voltou_ no Twitter, @exclusao1 no TikTok, @gisa.hair no TikTok, @filhodojoaquimteixeira no TikTok, @kamilla_goncalves no TikTok, @opatria no TikTok, “Patriota Oficial” no Kwai; e pelo responsável pelo sítio https://novaiguacu24h.com.br/. Alega–se a prática de propaganda eleitoral irregular na internet, nas redes sociais Twitter, TikTok e Kwai, pela veiculação de vídeo com o fim de induzir o eleitor a acreditar que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva seria favorável à violência doméstica. A representante alega que “as fake news espalhadas pelos Representados não têm qualquer compromisso com a verdade e são simplesmente alegações inverídicas e desonestas. A verdade, portanto, é uma só. O ex–presidente Luiz Inácio Lula da Silva nunca incentivou ou incitou a violência de gênero ou violência doméstica. Ao contrário: promoveu políticas públicas e foi em seu governo a publicação da Lei Maria da Penha, o que apenas atesta o caráter desinformador das publicações em comento” (ID 157956523, p. 24). Requer a concessão de tutela de urgência para que “seja determinado aos Representados que removam os conteúdos desinformadores objeto desta ação, sob pena de multa a ser arbitrada por esta c. Corte” (ID 157956523, p. 37). Requer que os representados “se abstenham de veicular outras notícias e/ou publicações que contenham o mesmo teor, sob pena de multa, a ser arbitrada por esta c. Corte” (ID 157956523, p. 40). Pede a confirmação da medida liminar para “determinar que as matérias/publicações sejam removidas e que os Representados se abstenham de veicular outras desinformações com o mesmo teor e a condenação por propaganda irregular e a consequente aplicação da multa de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), conforme previsto no art. 36 da Lei n. 9.504/97, a cada um dos Representados” (ID 157956523, p. 40). 2. O representado Luciano Hang apresentou contestação depois de ter ciência “pela mídia da existência da presente representação eleitoral”. Assevera que “as alegações da autora não passam de mero descontentamento com o legal, lícito e regular compartilhamento de informações, críticas e exposição que se sujeitam os candidatos a cargos políticos, sobretudo aos cargos de Presidente da República, no cenário atual da política nacional” (ID 157998587, p. 13). Pede o indeferimento da medida liminar. 3. O representado Rodrigo Lorenzini Zucco informou que “ao verificar o PJE deparou–se com a presente representação, e que mesmo antes da decisão do MM. juízo já removeu a publicação objeto da ação” (ID 158211806). Pede o arquivamento da reclamação e a sua exclusão do polo passivo. Examinados os elementos constantes dos autos, DECIDO. 4. A controvérsia dos autos refere–se à suposta propaganda eleitoral negativa consistente na divulgação de vídeo “descontextualizando a manifestação do candidato, induzindo que ele teria afirmado que se pode cometer violência doméstica em outro lugar que não o Brasil. Isto é, as publicações descontextualizadas incutem a ideia de que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva estimularia o cometimento do crime de violência doméstica, o que não condiz com a realidade” (ID 157956523, p. 40). Os pedidos da representante estão limitados: à confirmação da decisão liminar, para determinar “que as matérias/publicações sejam removidas e que os Representados se abstenham de veicular outras desinformações com o mesmo teor”, e à “condenação por propaganda irregular e a consequente aplicação da multa de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), conforme previsto no art. 36 da Lei n. 9.504/97, a cada um dos Representados” (ID 158126543, p. 24). 5. No que se refere ao primeiro pedido, de remoção das publicações e abstenção de novas veiculações, o final do processo eleitoral, devido à realização do segundo turno das eleições de 2022, conduziu à perda superveniente do objeto desta representação. Nos termos do § 7º do art. 38 da Resolução n. 23.610/2019 deste Tribunal Superior, “realizada a eleição, as ordens judiciais de remoção de conteúdo da internet não confirmadas por decisão de mérito transitada em julgado deixarão de produzir efeitos, cabendo à parte interessada requerer a remoção do conteúdo por meio de ação judicial autônoma perante a Justiça Comum”. É no mesmo sentido a jurisprudência deste Tribunal Superior. Cite–se, por exemplo: “(...) a pretensão recursal não comporta êxito, porquanto, segundo o disposto no art. 33, § 6º, da Res.–TSE 23.551/2017, encerrado o período eleitoral, as ordens judiciais de remoção do conteúdo da internet proferidas por esta Justiça especializada, independentemente da manutenção dos danos gerados pelas inverdades divulgadas, deixam de surtir efeito, devendo a parte interessada redirecionar o pedido, por meio de ação judicial autônoma, à Justiça Comum.” (R–Rp n. 0601635–31/DF, Relator o Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 6.5.2019) Portanto, tem–se a carência superveniente de interesse processual, impondo–se a extinção da representação sem resolução de mérito no que se refere ao pedido de remoção e abstenção de veiculação de propaganda, nos termos do inc. VI do art. 485 do Código de Processo Civil: “Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (...) VI – verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual.” 6. Quanto ao segundo pedido, de cominação de sanção pecuniária aos representados, tratando–se de caso de propaganda eleitoral negativa na internet, não há falar em aplicação da multa do § 3º do art. 36 da Lei n. 9.504/1997. A jurisprudência deste Tribunal Superior se firmou no sentido de que a multa prevista no § 3º do art. 36 da Lei n. 9.504/1997 só é cabível em casos de propaganda eleitoral antecipada ilícita. Assim, por exemplo: “Não–configurada a propaganda extemporânea, afasta–se a sanção de multa” (AgRgRespe n. 26.718/SC, Relator o Ministro Carlos Ayres Britto, DJ 4.6.2008). No caso dos autos, porém, o que se tem é a alegação de propaganda eleitoral negativa realizada no período autorizado. 7. A veiculação de conteúdo de cunho calunioso, difamatório, injurioso ou sabidamente inverídico, que atente contra a honra ou a imagem de candidato no período em que a propaganda eleitoral está autorizada, reclama uma única providência jurídica, o exercício de direito de resposta, não se admitindo a cominação de multa na hipótese. É o que se extrai do art. 58 da Lei n. 9.504/1997: “Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.” Portanto, também nesse ponto não há interesse jurídico a justificar o processamento e o julgamento de mérito da presente representação. 8. Pelo exposto, alteradas as condições jurídico–processuais e sendo incabível a multa na espécie, julgo extinta a representação, sem resolução do mérito, pela perda do objeto e, consequentemente, do interesse processual (inc. VI do art. 485 do Código de Processo Civil), ficando prejudicada a liminar. Publique–se e intime–se. Com o trânsito em julgado, arquive–se. Brasília, 2 de dezembro de 2022. Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora