TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601510–24.2022.6.00.0000 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relatora: Ministra Maria Claudia Bucchianeri Representantes: Coligação Pelo Bem do Brasil e outro Advogados(as): Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e outros(as) Representados: Coligação Brasil da Esperança e outro Advogados(as): Eugênio José Guilherme de Aragão e outros(as)... Leia conteúdo completo
TSE – 6015102420225999872 – Min. Maria Claudia Bucchianeri
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601510–24.2022.6.00.0000 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relatora: Ministra Maria Claudia Bucchianeri Representantes: Coligação Pelo Bem do Brasil e outro Advogados(as): Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e outros(as) Representados: Coligação Brasil da Esperança e outro Advogados(as): Eugênio José Guilherme de Aragão e outros(as) DECISÃO Trata–se de representação, com pedido de liminar, ajuizada pela Coligação Pelo Bem do Brasil em desfavor da Coligação Brasil da Esperança, com fundamento no art. 53, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.504/1997, em razão de veiculação de propaganda eleitoral alegadamente irregular por ofensiva e veiculadora de informação gravemente descontextualizada, em bloco, no horário eleitoral gratuito. Na petição inicial, a representante alega, em síntese, que (ID 158245001): a) foi veiculada, durante o horário eleitoral gratuito, no período diurno, em 15.10.2022, propaganda em bloco, com fatos gravemente descontextualizados e falseados, ofensivos à imagem e honra do candidato à presidência da República Jair Messias Bolsonaro, imputando–lhe e a toda sua família práticas criminosas – como “rachadinha para desviar o dinheiro público”, “ligação com armas, milicianos e assassinos de aluguel” (p. 6), “tráfico de drogas, peculato, corrupção” (p.7) –, a ponto de encerrar a peça com o questionamento “isso é uma família ou uma quadrilha?”; b) “[...] o fio condutor da publicidade, pasme–se, não é qualquer assunto de interesse legítimo do eleitor sequioso de informações para a formulação de um juízo de valor mais qualificado para o momento do voto, mas simplesmente a própria ofensa (como tema!), grave e gratuita, ao adversário, desconectada de qualquer ideologia política típica de assuntos eleitorais – cáusticos que sejam – agasalhados pela liberdade de expressão” (p. 7); c) “para além do discurso, ilegal em si mesmo, há imagens que compõem o fundo da tela da narradora. Imagens dos familiares do Representante Jair Bolsonaro, acompanhadas de dizeres como “cruel”, “violência e corrupção” e “polícia bandida e o clã Bolsonaro”, seguidas de falas (falseadas) que não correspondem à narração proferida” (p. 8); d) “há clara imputação direta de crime contra o Representante”, porquanto a propaganda “sustenta que Bolsonaro saqueava os salários de seus assessores, sendo certo que inexiste qualquer investigação sobre o tema que relacione o Representante a tais práticas delituosas” (p. 9); e) na parte final do trecho impugnado, a propaganda propõe que “talvez a rachadinha seja a explicação para Família Bolsonaro ter comprado 51 imóveis com dinheiro vivo” (p. 9), apesar de a matéria da UOL que deu sustentação inicial a tais acusações já ter sido retificada. Liminarmente, requer a concessão de tutela de urgência, para que se proíba imediatamente a reexibição da peça objurgada, com expedição de ordem ao pool de emissoras para que promova a interrupção da transmissão, sob pena de multa de R$ 50.000,00, a ser arcada de maneira solidária pela emissora que fizer a transmissão, para cada vez que a inserção for veiculada. Ao fim, pede seja julgada procedente a representação, tornando efetiva a decisão liminar eventualmente concedida. É o relatório. Passo a apreciar o pedido de medida liminar. E, ao fazê–lo, para melhor compreensão da demanda, transcrevo o teor do trecho da propaganda em bloco impugnada: Narradora: Bolsonaro nunca andou certo, é um mau exemplo para os brasileiros. Bolsonaro: A minha especialidade é matar pô! Narradora: Sua família é conhecida pela proximidade com milicianos e assassinos de aluguel. Bolsonaro: Alguns são bandidos. Sim, são bandidos. Mas no contexto todo não. Narradora: Bolsonaro é ligado à indústria das arma. Bolsonaro: É escancarar a questão do armamento aqui. Eu quero todo mundo armado. Narradora: É visando o lucro dessa indústria que ele fala em mergulhar o Brasil numa guerra civil. Bolsonaro: Você só vai mudar infelizmente quando um dia nós partimos para uma guerra civil aqui dentro. Narradora: Violência e corrupção andam de mãos dadas com a família Bolsonaro. E de tudo isso surgiu o esquemão milionário da rachadinha. Bolsonaro e os filhos desviavam o salário dos funcionários para abastecer os cofres da família. Áudio atribuído a Andrea Siqueira Valle: Eu até dava muito problema porque o André nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido entendeu? Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou ó chega pode tirar ele porque ele nunca me devolve o dinheiro certo. Entrevistador: Se gritar pega a rachadinha não sobra um. Bolsonaro: Sobra pouca gente.. Entrevistador: o senhor ia sobrar não? Bolsonaro: Aí não vou falar de mim né? Narradora: O miliciano Queiroz era o operador do esquema, ele entregava cheques a Michele Bolsonaro. A primeira–dama, quem diria, é parte do esquema. Também pudera, ela sempre viveu perto do crime. Bolsonaro: Falar que a avó da Michelle há três há vinte e poucos anos aí foi condenada e cumpriu três anos de cadeia por tráfico de drogas. Está certo? A mãe dela também é a mesma coisa. O processo de falsidade ideológica. Narradora: Talvez a rachadinha seja explicação para a família Bolsonaro ter comprado cinquenta e um imóveis em dinheiro vivo, mas Bolsonaro decretou o sigilo de cem anos dos processos e a investigação parou. Bolsonaro: Eu não vou esperar foder a minha família toda? Narradora: Cem anos de sigilo também para os gastos de sua família no cartão corporativo do governo. São despesas milionárias, inclusive pra passear em horário de trabalho. Corrupção tamanho família, rachadinha para desviar o dinheiro público, ligações com armas, milicianos e assassinos de aluguel. Isso é uma família ou uma quadrilha? Consoante já tive a oportunidade de enfatizar em diversas decisões anteriores, entre elas a Rp nº 0600229–33/DF, o meu entendimento é no sentido do minimalismo judicial em tema de intervenção no livre mercado de ideias políticas, de sorte a conferir tratamento preferencial à liberdade de expressão e ao direito subjetivo do eleitor e da eleitora de obterem o maior número de informações possíveis para formação de sua escolha eleitoral, inclusive para aquilatar eventuais comportamentos supostamente desleais ou inapropriados. Por essa linha de raciocínio, filtragens discursivas a cargo do Poder Judiciário apenas se legitimariam naquelas hipóteses de desequilíbrio e de excesso capazes de vulnerarem princípios fundamentais outros, igualmente essenciais ao processo eleitoral, tais como a higidez e a integridade do ambiente informativo, a paridade de armas entre os candidatos, o livre exercício do voto e a proteção da dignidade e da honra individuais. No entanto, o Plenário desta Corte Superior, considerando o peculiar contexto inerente às eleições de 2022, com “grande polarização ideológica, intensificada pelas redes sociais”, firmou orientação no sentido de uma “atuação profilática da Justiça Eleitoral”, em especial no que concerne a qualquer tipo de comportamento passível de ser enquadrado como desinformativo (Rp no 0600557–60/DF, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, PSESS de 1º.9.2022, em que fiquei vencida isoladamente) e flagrantemente ofensivo. Também assim, o julgamento da Rp no 0600851–15, red. p/ o acórdão Min. Alexandre de Moraes, PSESS de 22.9.2022, ocasião em que esta Casa voltou a destacar o direito do eleitorado não apenas de ter acesso à mais ampla informação, mas, também e sobretudo, à informação “verdadeira” e “não fraudulenta”, com o que se conferiu a esta Casa um dever de filtragem mais fino. Em idêntico sentido, na sessão jurisdicional de 13.10, o Plenário desta Casa determinou, nos autos da RP 0601373–42, a remoção de matéria jornalística, sem nenhuma edição, veiculada ainda no ano de 2011 pela TV Record, envolvendo o debate público então travado em torno do combate a homofobia nas escolas, por se haver considerado que o título atribuído à mídia (19.05.2011 – kit gay causa polêmica) era desinformativo. Nesse mesmo julgamento, em que fiquei vencida ao lado do Ministro Sergio Banhos, o Ilustre Presidente desta Casa, Ministro Alexandre de Moraes, registrou que a associação de diversos fatos verdadeiros a uma conclusão inverídica também configura “fake news”. Sua Excelência também destacou que o só fato de determinadas matérias terem sido divulgadas em veículos tradicionais de imprensa não afasta eventual natureza desinformativa. Também na sessão de 13.10.2022, o Plenário desta Casa, vencidos os llustres Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Sergio Banhos e Carlos Horbach, determinou a imediata remoção dos conteúdos da URL mencionada no acórdão, nos autos da RP nº 0601372–57, por entender que, mesmo tratando–se de um vídeo estruturado a partir de conteúdo jornalístico, apresentava “desordem informacional” apta a conduzir as pessoas a uma conclusão falsa. No caso destes autos, mesmo na perspectiva do meu entendimento pessoal (menos interventivo do que o entendimento colegiado desta Casa), a hipótese é de ofensa ao art. 53, § 2º, da Lei nº 9.504/1997, derivada de peça publicitária basicamente composta de ofensas e acusações. Ora bem, a imputação de que o candidato e sua família são ligados a “assassinos de aluguel”, “milicianos”, “bandidos” é dissociada de qualquer lastro fático que permita a construção da respectiva narrativa, já que inexistem acusações formais nesse sentido, elemento que, no recente julgamento plenário da Rp 0601372–57, foi tido como necessário para a viabilidade de acusações como essa. Também assim a afirmação de que “violência e corrupção” “andam de mãos dadas com a família”, quando o candidato jamais foi acusado de qualquer crime violento ou mesmo de corrupção. Por outro lado, quer me parecer ser gravemente ofensiva a afirmação de que a primeira–dama seria “parte do esquema”, até porque “sempre viveu perto do crime”, pois sua “avó” e sua “mãe” seriam criminosas. Com todo o respeito devido, há inequívoca veiculação de ofensas pessoais que desbordam da crítica política, mesmo que ácida, rompendo por completo todos os limites já estabelecidos pela jurisprudência desta Corte para o pleito de 2022. Ora bem, esta Casa, em recentíssima decisão monocrática nos autos da Rp nº 0601416–76, deferiu tutela de urgência para determinar a imediata suspensão de propaganda eleitoral, no horário gratuito na televisão, que imputava ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva a pecha de “ladrão” e “corrupto”. Se é assim, também não se pode imputar ao outro candidato a pecha de ser ligado a “milicianos” e “assassinos de aluguel”, sem falar na igual imputação, descasada de lastro fático idôneo, de participação em crime de violência e de corrupção. Por tais razões e nesse juízo de cognição sumária, entendo existir plausibilidade jurídica na alegação da representante de violação ao art. 53, § 2º, da Lei nº 9.504/1997, considerada a veiculação de propaganda ofensiva à honra do candidato representante, o que é suficiente para deferir a medida liminar pleiteada. Ante todo o exposto, DEFIRO o pedido de tutela provisória de urgência para determinar a imediata suspensão da veiculação da propaganda eleitoral impugnada na televisão, em qualquer modalidade (inserções ou bloco), sob pena de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada divulgação. Nos termos do art. 2º da Portaria–TSE nº 791/2022, submeto a presente decisão ao referendo do E. Plenário. Proceda–se à citação da representada, Coligação Brasil da Esperança e o candidato Luiz Inácio Lula da Silva, para apresentar resposta, no prazo de 2 (dois) dias, nos termos do art. 18 da Res.–TSE nº 23.608/2019. Apresentada a defesa ou decorrido o prazo respectivo, intime–se o representante do MPE para que se manifeste na forma do art. 19 da mencionada resolução. Publique–se. Brasília, 16 de outubro de 2022. Ministra Maria Claudia Bucchianeri Relatora
Data de publicação | 17/10/2022 |
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PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60151024 |
NUMERO DO PROCESSO | 6015102420225999872 |
DATA DA DECISÃO | 17/10/2022 |
ANO DA ELEIÇÃO | Não especificado |
SIGLA DA CLASSE | Rp |
CLASSE | REPRESENTAÇÃO |
UF | DF |
MUNICÍPIO | BRASÍLIA |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Propaganda eleitoral irregular |
PARTES | COLIGAÇÃO BRASIL DA ESPERANÇA, COLIGAÇÃO PELO BEM DO BRASIL, JAIR MESSIAS BOLSONARO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA |
PUBLICAÇÃO | MURAL |
RELATORES | Relator(a) Min. Maria Claudia Bucchianeri |
Projeto |