index: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626)–0600275–08.2020.6.10.0002–[Propaganda Política – Propaganda Eleitoral – Internet, Representação]–MARANHÃO–SÃO LUÍS TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626) Nº 0600275–08.2020.6.10.0002 (PJe) – SÃO LUÍS – MARANHÃORELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAESAGRAVANTE: COLIGAÇÃO RESGATE O... Leia conteúdo completo
TSE – 6002750820206100480 – Min. Alexandre de Moraes
index: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626)–0600275–08.2020.6.10.0002–[Propaganda Política – Propaganda Eleitoral – Internet, Representação]–MARANHÃO–SÃO LUÍS TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626) Nº 0600275–08.2020.6.10.0002 (PJe) – SÃO LUÍS – MARANHÃORELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAESAGRAVANTE: COLIGAÇÃO RESGATE O AMOR PELA ILHAAdvogados do(a) AGRAVANTE: RAUL CESAR DA ROCHA VIEIRA – MA0014962, CARLA MONIQUE BARROS SOUSA – MA0021808, PEDRO CARVALHO CHAGAS – MA0014393, LUCAS RODRIGUES SA – MA0014884, AIRON CALEU SANTIAGO SILVA – MA0017878AGRAVADO: GUILHERME JUNIOR BEZERRA MULATOAdvogados do(a) AGRAVADO: PEDRO HENRIQUE GUIMARAES – MA0015667, HYAGO FERRO CAMELLO – MA0021453 DECISÃO Trata–se de Agravo interposto pela coligação “Resgate o amor pela ilha” contra decisão do Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (TRE/MA) que inadmitiu o Recurso Especial, ante a incidência das Súmulas 24, 28 e 30 do TSE (ID 152722588). O Recurso Especial foi interposto em face de acórdão que manteve sentença de improcedência de representação por propaganda eleitoral negativa, proposta em desfavor de Guilherme Junior Bezerra Mulato, proprietário do 'Blog Maramais', por ter atribuído ao candidato Duarte Júnior a autoria de piada discriminatória em face dos portadores do vírus HIV (ID 152722138). No Recurso Especial (ID 152722538), alega, em síntese: i) desnecessidade do reexame de fatos e provas; ii) violação aos arts. 36–A da Lei 9.504/97 e 22, X, da Res.–TSE 23.610/2019; iii) a liberdade de expressão não ampara a divulgação de mensagem ofensiva à honra ou a imagem; iv) as mensagens divulgadas no blog do Recorrido 'são caracterizadas por proferir injúrias e difamações contra o então pré–candidato e também seus apoiadores'; v) divergência jurisprudencial. Em suas razões (ID 152722838), a Agravante reitera as razões do Recurso Especial e, em acréscimo, aduz ofensa ao art. 57–D da Lei 9.504/97. O Vice–Procurador–Geral Eleitoral opina pela negativa de seguimento ao Recurso (ID 156938540). É o breve relato. Decido. Não conheço da alegada violação ao art. 57–D da Lei 9.504/97. A matéria não foi suscitada em Recurso Especial, constituindo flagrante inovação recursal. Ainda preliminarmente, o Recurso Especial é deficiente em confrontar o caso concreto com os arestos que pretensamente serviriam a demonstrar a divergência jurisprudencial, uma vez que não houve a realização adequada de cotejo analítico ou a demonstração de similitude fática entre os julgados paradigmas. Nesse sentido: “Incabível o conhecimento de dissídio jurisprudencial quando amparado em mera transcrição de ementas de julgado, sem que demonstrada a similitude fática entre as hipóteses confrontadas” (AgR–REspe 390–15, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe de 16/3/2021). No caso, há somente a transcrição de ementas, singelas anotações e conclusões construídas pela própria Recorrente, as quais não permitem atestar a similitude fática entre os casos confrontados. A comparação demanda a reprodução de trechos do voto condutor e do paradigma, nos quais se apresentem minimamente os pontos de identificação entre as situações contrastadas. Como se sabe, “o conhecimento do recurso especial pelo dissídio pretoriano requer a demonstração do dissenso por meio da transcrição dos trechos do acórdão recorrido e dos paradigmas trazidos a confronto, mencionadas as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos cotejados” (AI 45568, Rel. Min. OG FERNANES, DJe de 18/11/2019). Incidência da Súmula 28 do TSE. No mérito, a questão controvertida versa sobre a caracterização de propaganda eleitoral negativa na mensagem postada pelo Recorrido em seu blog, no dia 26/10/2020, intitulada 'Vídeo: Piada de Duarte Júnior contra portadores de HIV desagrada eleitores de São Luís', cujo teor consta do acórdão recorrido (ID 152722288): 'O vídeo gravado pelo próprio Duarte Júnior fazendo piada com um tema muito sério, que é o HIV, deve gerar dor de cabeça para o candidato a prefeito. Nas redes sociais, a piada, considerada de péssimo gosto, tem sido lembrada por eleitores sempre que o tema Saúde Pública é debatido. Publicado com exclusividade pelo blog Maramais em março, o vídeo foi gravado pelo próprio Duarte Júnior, e faz piada com um tema muito sério para milhares de famílias ludovicenses. No vídeo, Duarte lê o que aparentemente parece ser um resultado de exame de HIV do seu assessor e logo em seguida, em uma brincadeira de péssimo gosto, sugere que o auxiliar tenha lido o resultado errado, afirma que ele “tem Aids” e como se jogasse o celular com nojo e preconceito, diz que vai sair do carro. “Senhoras e senhores, hoje é um dia de muita alegria e surpresas, mesmo porque, veja só, Diego Ricci tá sorridente, por qual motivo Diego? – Eu não tenho Aids. – Ele não tem Aids, que legal. Olha que legal, e olha aqui o resultado, é sério. Diego, tú é louco, é bicho? Ei caralho, tú tá lendo errado cacete, tú tem aids, bicho. – com nojo – Me larga, vou sair desse carro.” Diz o pré–candidato a prefeito de São Luís. Para quem já passou por situação tensa como essa, e precisou conviver com o vírus, a piada é um verdadeiro tapa na cara da sociedade. Dados preocupantes O Maranhão ocupa o 1º lugar no ranking da taxa de mortalidade por Aids, segundo dados do Ministério da Saúde atualizados em 2018. Desses números, 45,3% estão na região metropolitana de São Luís. O comportamento infeliz de Duarte com um assunto tão sério é o oposto de Francisco Garcia, jovem maranhense com mais de 267 mil seguidores, portador de HIV e que dá palestras motivadoras. Nas redes sociais, Francisco Garcia repudiou a conduta reprovável de Duarte. “Assistir a uma cena igual a essa é no mínimo lamentável pra mim que fui diagnosticado com Aids e hoje vivo com HIV”, diz parte da publicação. Garcia relembrou que já esteve com Duarte, apresentou seu projeto social e chegou a postar o acolhimento do jovem parlamentar.” (grifei) O TRE/MA manteve a improcedência da ação, por entender que a publicação não extrapolou os limites da liberdade de expressão, pois não ofendeu a honra do candidato citado. Para a Corte Regional (ID 152722288): 'Trata–se de vídeo feito pelo próprio candidato da Recorrente, cuja autenticidade, em momento algum, foi questionada nos presentes autos. A Recorrente alega que a propaganda teve cunho difamatório, injurioso e calunioso, tendo atingido a honra do candidato em questão. No entanto, vê–se claramente que a postagem do Recorrido não ultrapassou os limites da liberdade de manifestação, expressão e informação. E isto por dois motivos: 1.º) a matéria do Blog emitiu, em síntese, uma opinião, qual seja, que a brincadeira de mau gosto levada a efeito pelo candidato poderia dar–lhe “dor de cabeça”, uma vez que vinha sendo lembrada pelo eleitorado; e 2.º) o blogueiro (Recorrido) postou o vídeo protagonizado pelo candidato em seu sítio eletrônico, o que permite aos espectadores assistirem e tirarem suas próprias conclusões. Neste prisma, não vislumbro a divulgação de fatos sabidamente inverídicos, uma vez que o Recorrente demonstrou embasamento fático em sua notícia.' O direito fundamental à livre manifestação de pensamento, consagrado constitucionalmente, deve ser exercido dentro do binômio LIBERDADE com RESPONSABILIDADE. A Constituição protege a liberdade de expressão no seu duplo aspecto: o positivo, que é exatamente 'o cidadão pode se manifestar como bem entender', e o negativo, que proíbe a ilegítima intervenção do Estado, por meio de censura prévia. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre os governantes, que nem sempre serão “estadistas iluminados”, como lembrava o JUSTICE HOLMES ao afirmar, com seu conhecido pragmatismo, a necessidade do exercício da política de desconfiança (politics of distrust) na formação do pensamento individual e na autodeterminação democrática, para o livre exercício dos direitos de sufrágio e oposição; além da necessária fiscalização dos órgãos governamentais. No célebre caso Abrams v. United States, 250 U.S. 616, 630–1 (1919), OLIVER HOLMES defendeu a liberdade de expressão por meio do mercado livre das ideias (free marketplace of ideas), em que se torna imprescindível o embate livre entre diferentes opiniões, afastando–se a existência de verdades absolutas e permitindo–se a discussão aberta das diferentes ideias, que poderão ser aceitas, rejeitadas, desacreditadas ou ignoradas; porém, jamais censuradas, selecionadas ou restringidas pelo Poder Público que deveria, segundo afirmou em divergência acompanhada pelo JUSTICE BRANDEIS, no caso Whitney v. California, 274 U.S. 357, 375 (1927), “renunciar a arrogância do acesso privilegiado à verdade”. No âmbito da Democracia, a garantia constitucional da liberdade de expressão não se direciona somente à permissão de expressar as ideias e informações oficiais produzidas pelos órgãos estatais ou a suposta verdade das maiorias, mas sim garante as diferentes manifestações e defende todas as opiniões ou interpretações políticas conflitantes ou oposicionistas, que podem ser expressadas e devem ser respeitadas, não porque necessariamente são válidas, mas porque são extremamente relevantes para a garantia do pluralismo democrático (cf. HARRY KALVEN JR. The New York Times Case: A note on the central meaning of the first amendment in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 14, p. 435). Todas as opiniões existentes são possíveis em discussões livres, uma vez que faz parte do princípio democrático “debater assuntos públicos de forma irrestrita, robusta e aberta” (Cantwell v. Connecticut, 310 U.S. 296, 310 (1940), quoted 376 U.S at 271–72). O direito fundamental à liberdade de expressão, portanto, não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também àquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias (Kingsley Pictures Corp. v. Regents, 360 U.S 684, 688–89, 1959). A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático, como ressaltado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL na ADI 4451, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe de 6/3/2019. Observe–se, porém, que a liberdade de expressão, em seu aspecto positivo, permite posterior responsabilidade cível e criminal pelo conteúdo difundido, além da previsão do direito de resposta. Dessa maneira, a plena proteção constitucional da exteriorização da opinião (aspecto positivo) não significa a impossibilidade posterior de análise e responsabilização por eventuais informações injuriosas, difamantes, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas, mas não permite a censura prévia pelo Poder Público. Nesse cenário, a livre circulação de pensamentos, opiniões e críticas visam a fortalecer o Estado Democrático de Direito e à democratização do debate no ambiente eleitoral, de modo que a intervenção desta JUSTIÇA ESPECIALIZADA deve ser mínima em preponderância ao direito à liberdade de expressão. Ou seja, a sua atuação deve coibir práticas abusivas ou divulgação de notícias falsas, de modo a proteger a honra dos candidatos e garantir o livre exercício do voto. Nesse sentido: REspe 0600025–25.2020, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe de 5/5/2021 Ainda sobre a matéria controvertida, cumpre enfatizar que a orientação jurisprudencial do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL é firme no sentido de que 'a configuração de propaganda eleitoral extemporânea, seja ela positiva ou negativa, exige a presença de pedido explícito de votos ou, mutatis mutandis, pedido explícito de não votos' (AgR–REspe 0600004–50, Rel. Min. SÉRGIO BANHOS, PSESS de 23/11/2020), 'ou ato que, desqualificando pré–candidato, venha a macular sua honra ou imagem ou divulgue fato sabidamente inverídico' (AgR–REspe 0600016–43, Rel. Min. LUÍS FELIPE SALOMÃO, DJe de 13/12/2021). Na hipótese dos autos, conforme bem concluiu o TRE/MA, a publicação do Recorrido está inserida no direito de livre manifestação de pensamento, tendo em vista que o conteúdo veiculado em seu blog apenas manifesta opinião, no sentido de que a 'piada' feita pelo candidato poderia causar–lhe 'dor de cabeça', pois lembrada pelos eleitores sempre que debatido o tema da saúde pública. Além disso, verifica–se que o Recorrido, na mencionada postagem, apenas divulgou o vídeo gravado pelo próprio candidato. De fato, do teor do conteúdo divulgado, não se revela possível extrair pedido explícito de não voto, bem como grave ofensa à honra do candidato, tratando–se somente do exercício do direito de crítica, inserido na liberdade de imprensa, pois, como bem destacou o eminente Ministro CELSO DE MELLO, o 'Supremo Tribunal federal tem destacado, de modo singular, em seu magistério jurisprudencial, a necessidade de preservar–se a prática da liberdade de informação, resguardando–se, inclusive, o exercício do direito de crítica que dela emana, por tratar–se de prerrogativa essencial que se qualifica como uma dos suportes axiológicos que conferem legitimação material à própria concepção do regime democrático' (AgR–Rcl. 31.117, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, DJe de 7/10/2020). O acórdão regional, portanto, está alinhado à jurisprudência do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, o que atrai a incidência do enunciado 30 da Súmula desta CORTE. Ante o exposto, NEGO SEGUIMENTO ao Recurso Especial, com base no art. 36, § 6º, do RITSE. Brasília, 31 de janeiro de 2020. Ministro ALEXANDRE DE MORAESRelator
Data de publicação | 02/02/2022 |
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PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60027508 |
NUMERO DO PROCESSO | 6002750820206100480 |
DATA DA DECISÃO | 02/02/2022 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2020 |
SIGLA DA CLASSE | AREspEl |
CLASSE | Agravo em Recurso Especial Eleitoral |
UF | MA |
MUNICÍPIO | SÃO LUÍS |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | propaganda na Internet |
PARTES | COLIGAÇÃO RESGATE O AMOR PELA ILHA, GUILHERME JUNIOR BEZERRA MULATO |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Alexandre de Moraes |
Projeto |