TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600649–47.2020.6.16.0005 – CLASSE 12626 – PARANAGUÁ – PARANÁ Relator: Ministro Sérgio Banhos Agravante: Coligação Pra Fazer Muito Mais Advogados: Luiz Gustavo de Andrade – OAB: 35267/PR e outros Agravados: Aramis Soares do Nascimento Júnior e outro Advogada: Suzieny Baptista de Oliveira – OAB: 53441/PR... Leia conteúdo completo
TSE – 6006494720206159872 – Min. Sergio Silveira Banhos
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600649–47.2020.6.16.0005 – CLASSE 12626 – PARANAGUÁ – PARANÁ Relator: Ministro Sérgio Banhos Agravante: Coligação Pra Fazer Muito Mais Advogados: Luiz Gustavo de Andrade – OAB: 35267/PR e outros Agravados: Aramis Soares do Nascimento Júnior e outro Advogada: Suzieny Baptista de Oliveira – OAB: 53441/PR DECISÃO A Coligação Pra Fazer Muito Mais interpôs agravo (ID 144868588) em face de decisão do presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (ID 144868388) que negou seguimento a recurso especial (ID 144868288) manejado visando à reforma de acórdão daquela Corte (ID 144866638) que, por maioria, deu parcial provimento a recurso, a fim de acolher a preliminar de nulidade da sentença e, aplicando a teoria da causa madura, julgar improcedente a ação de investigação judicial eleitoral proposta pela agravante em desfavor dos ora agravados, Aramis Soares do Nascimento Junior e Luciano Colodel, por suposta prática de abuso do poder político, econômico e uso indevido dos meios de comunicação, nos termos do art. 22 da Lei Complementar 64/90. Eis a ementa do acórdão recorrido (ID 144866638): ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER POLÍTICO, ECONÔMICO E USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. INTERNET. SENTENÇA DE EXTINÇÃO POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. ACOLHIMENTO. INCIDÊNCIA DO ART. 1013, § 3º, I DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. TEORIA DA CAUSA MADURA. MÉRITO. POSTAGEM DE MENSAGENS E VÍDEOS NA PÁGINA PESSOAL DO CANDIDATO NA REDE SOCIAL FACEBOOK. AUSÊNCIA DE GRAVIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. No atual estágio da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a internet pode ser enquadrada como meio de comunicação sujeito à sindicância por AIJE – Ação de Investigação Judicial Eleitoral. 2. Decretada nula a sentença, o Tribunal deve julgar a causa se esta estiver suficientemente instruída. Inteligência do art. 1013, § 3º, I do Código de Processo Civil. 3. Apenas os casos que extrapolem o uso normal das ferramentas virtuais é que podem configurar o uso indevido dos meios de comunicação social, sem prejuízo da apuração de eventual propaganda irregular, que possui limites legais distintos da conduta prevista no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 (TSE, AIJE nº 060186221, Acórdão, rel. Min. Og Fernandes, rel. desig. Min. Jorge Mussi, DJE 26/11/2019). 4. Não configura abuso de poder político, econômico ou uso indevido dos meios de comunicação a mera postagem de mensagens e vídeos na página pessoal de candidato na rede social Facebook, ainda que contenha críticas ao adversário. 5. Recurso Parcialmente Provido. Ação de Investigação Judicial Eleitoral julgada improcedente. Foram opostos embargos de declaração (ID 144867188), os quais foram rejeitados em acórdão com a seguinte ementa (ID 144867688): EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. EMBARGOS CONHECIDOS E REJEITADOS. 1. Nos termos do art. 275 do Código Eleitoral, os Embargos de Declaração destinam–se a suprir omissão, corrigir erro material, afastar obscuridade ou eliminar contradição existente no julgado. 2. Inexistindo vícios na decisão, rejeitam–se os Embargos de Declaração, que não se prestam à mera rediscussão de matéria já decidida. 3. Embargos conhecidos e rejeitados. A agravante alega, em suma, que: a) não incide o verbete sumular 24/TSE, pois os fatos estão comprovados no acórdão regional, sendo necessário apenas o seu reenquadramento jurídico; b) o julgamento no Tribunal de origem se deu por apertada maioria, no qual três julgadores entenderam que os fatos seriam suficientes para comprovar a existência de grave abuso a ensejar a inelegibilidade por oito anos; c) extrai–se do acórdão regional a gravidade da conduta, tendo em vista que o agravado se utilizou de suas redes sociais para propagar inverdades (fake news) pelo período de um ano; d) o voto condutor do acórdão impugnado argumentou que as postagens ofensivas no ano de 2019 não tiveram quantidade significativa, todavia, essa tese não afasta o abuso; e) o conteúdo das postagens foi devidamente prequestionado pela Corte de origem, o qual indica que o agravado lhe imputava a prática de crime e utilizava palavras ofensivas para difamá–la quanto à sua suposta relação com os servidores públicos; f) o voto vencido destacou a quantidade de notícias falsas postadas e propagadas em seu desfavor; g) o caráter eleitoreiro das ofensas foi reconhecido pelos juízes estaduais nas ações de dano moral, os quais atestaram o seu caráter abusivo e sua vinculação com o pleito eleitoral; h) não procede o argumento da decisão agravada no sentido de que os fatos indicados no recurso especial não teriam sido abordados na instância ordinária; i) conforme entendimento deste Tribunal, a oposição dos embargos de declaração é suficiente para prequestionar a matéria invocada; j) a gravidade da conduta ficou demonstrada no acórdão regional, por meio da quantidade de seguidores, de compartilhamentos e de visualizações das postagens ao longo de mais de um ano. Requer o conhecimento e o provimento do agravo, a fim de que o recurso especial seja conhecido e provido. Não foram apresentadas contrarrazões, conforme se verifica nos autos (ID 144868838). A douta Procuradoria–Geral Eleitoral, no parecer ofertado nos autos (ID 157192359), manifestou–se pelo desprovimento do agravo. É o relatório. Decido. O agravo é tempestivo. A decisão agravada foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico de 25.6.2021, sexta–feira, conforme certidão nos autos (ID 144868488), e o apelo foi interposto em 30.6.2021, quarta–feira (ID 144868588), por advogado habilitado nos autos (ID 144861788). O Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná negou seguimento ao recurso especial por entender que o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame da matéria fático–probatória dos autos, providência vedada nesta via recursal, nos termos do verbete sumular 24/TSE. A agravante infirmou o fundamento da decisão agravada, no entanto, o apelo não merece ser provido, diante da inviabilidade do próprio recurso especial. Conforme relatado, o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, por maioria, acolheu a preliminar de nulidade da sentença e, aplicando a teoria da causa madura, julgou improcedente a ação de investigação judicial eleitoral proposta pela agravante em desfavor dos ora agravados, Aramis Soares do Nascimento Junior e Luciano Colodel, por suposta prática de abuso do poder político, econômico e uso indevido dos meios de comunicação, nos termos do art. 22 da Lei Complementar 64/90. Por oportuno, reproduzo os fundamentos do acórdão regional (ID 144866688): II.i. Nulidade da sentença – Aplicação da Teoria da Causa Madura II.i.a. Como relatado, na sentença (id 21757266) o juízo da 5ª Zona Eleitoral– Paranaguá julgou extinta a Ação de Investigação Judicial Eleitoral, pela inadequação da via eleita, nos termos do art. 485, VI do CPC. O recorrente requer que seja declarada a nulidade da sentença, ante a aplicação da teoria da asserção, a fim de que seja julgado o mérito da ação proposta, tendo em vista a aplicabilidade da teoria da causa madura. Eis o fundamento da sentença: FUNDAMENTAÇÃO A petição inicial simplesmente veicula pedido e causa de pedir absolutamente incompatíveis entre si, eis que inidôneo o fundamento à obtenção da pretensão lançada. Noutros termos: ainda que confirmadas sejam as alegações do autor, no sentido de que o representado vem praticando irregularidades no período de pré–campanha e segue após tal período, tais fatos não implicariam em cassação do registro ou diploma, tampouco gerariam inelegibilidade. E, principalmente, não é a AIRC o instrumento processual adequado para tanto. Das alegações do autor não decorre logicamente o pedido. Afirma que o representado praticou condutas irregulares durante o período de pré–campanha, e traz aos autos postagens e críticas em desfavor do Prefeito Marcelo Elias Roque. Com efeito, os fatos alegados podem, em tese, ter consequências com base na legislação eleitoral. Contudo, tal se processa nos termos da Resoluções 23.608 e 23.610, ambas de 2020, cuja máxima consequência, além do dever de eventual supressão de postagens irregulares, é a aplicação de multa, sem qualquer hipótese impeditiva de registro de candidatura, cassação deste ou do diploma. Isto posto, a pretensão de cassação do registro ou do diploma com base em propaganda prematura ou em excesso de críticas (ainda que além do razoável e suscetíveis de efetivamente gerar abalo moral, o que deve ser analisado pelos juízos competentes) é completamente inidônea. Vê–se que, a bem da verdade, o intento da parte autora é meramente de criar embaraço ao candidato que lhe é oposição. Trata–se de claro desvirtuamento do acesso à jurisdição, procurando trazer a campanha eleitoral (e algumas lamentáveis disputas dela inerentes) para dentro do processo judicial, o que é completamente inadequado. Vale destacar que os temas tratados, praticamente já são objeto de análise nos próprios processos mencionados pela parte autora, de modo que tais processos servirão aos intentos para os quais foram criados. Por fim, prudente destacar que em momento algum houve efetiva comprovação de qualquer abuso de poder econômico (em nenhum momento se fundamenta que o poder econômico do requerido estaria sendo a causa dos fatos alegados), do poder político (idem) e até mesmo dos meios de comunicação. Em que pese com relação a esta última hipótese haja efetiva fundamentação na peça inaugural, ainda assim (caso se superasse a inadequação da via eleita) não vislumbro tenha havido referido abuso, pois efetivamente o alcance das postagens em questão não demonstraram gravidade suficiente que não pudessem ser facilmente rebatidas com o resultado das próprias ações judiciais que tiveram resultados favoráveis (ainda que em caráter liminar) ao candidato da coligação autora. Isto posto, e porque insuscetível de conhecimento a ação em questão, deve ser extinta. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO EXTINTA a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral, pela inadequação da via eleita, extinguindo o feito nos termos do artigo 485, VI, CPC. Sem custas ou honorários advocatícios. Intimações e diligências necessárias. Oportunamente, arquivem–se. José Jairo Gomes ensina que a AIJE é o meio processual adequado para combater os atos de abuso lato sensu e também é o remédio jurídico destinado a corrigir os atos de abuso praticados ainda antes do início do processo eleitoral stricto sensu, nestes termos: A AIJE é o meio processual adequado para combater os atos de abuso lato sensu. Ou seja, todo e qualquer ato de abuso – seja de poder político, de autoridade, econômico ou uso indevido dos meios de comunicação social que tenha interferência na normalidade do pleito, independentemente de adequação típica prévia, pode (e deve) ser objeto dessa ação, que é o meio jurídico adequado para combater os atos de abuso de poder que se consubstanciam em conceitos jurídicos indeterminados e apresentam caráter de generalidade. A AIJE também é o remédio jurídico adequado para combater os atos de abuso praticados ainda antes do início do processo eleitoral stricto sensu (ou seja, antes do período em que são realizadas as convenções partida– rias), embora a distância do fato em relação ao prélio enfraqueça a possibilidade de êxito da ação, porque mais rarefeita a possibilidade de afetar o bem jurídico tutelado – que é a normalidade e legitimidade do pleito. (Direito Eleitoral, 6ª ed., Verbo Jurídico, p. 642) Na espécie, a Coligação “Pra Fazer Muito Mais” alega que Aramis Soares do Nascimento Junior teria utilizado o seu perfil pessoal na rede social Facebook (https://www.facebook.com/pichaco.nascimento) desde o ano de 2019 para empreender uma campanha de ostensivos ataques à honra do Prefeito Municipal de Paranaguá à época dos fatos, Marcelo Elias Roque, postando mensagens e vídeos com conteúdos inverídicos que demonstrariam a sua pretensão de disputar as eleições do ano de 2020 e, dessa forma, estaria caracterizado o abuso de poder político, econômico e o uso indevido dos meios de comunicação. Conforme será tratado a seguir, a jurisprudência do TSE caminha no sentido de considerar a internet como meio de comunicação social para fins do disposto no art. 22 da LC n° 64/1990. Assim, em que pese o entendimento do juízo a quo pela inadequação da via eleita, tenho que a Ação de Investigação Judicial Eleitoral é a ação adequada para a discutir o uso indevido dos meios de comunicação, no caso a utilização da internet por meio da rede social Facebook, bem como de eventual abuso de poder econômico ou político e, dessa forma, a nulidade da sentença é medida que se impõe a fim de possibilitar a análise do mérito da ação. II.i.b. Daniel Amorim Assumpção Neves leciona que, para que seja aplicada a teoria da causa madura nos termos do art. 1013, § 3º, I do CPC, o processo deve estar em condições de imediato julgamento, assim destacando: A aplicação da regra ora comentada se mostra dependente exclusivamente de uma circunstância: sendo anulada a sentença de primeiro grau em razão do equívoco do juiz em extinguir o processo sem a resolução do mérito, o tribunal passará ao julgamento imediato do mérito sempre que o único ato a ser praticado for a prolação de uma nova decisão a respeito do mérito da demanda. Havendo qualquer outro ato a ser praticado antes da prolação da nova decisão, o tribunal deverá devolver o processo ao primeiro grau de jurisdição. (Manual de Direito Processual Civil, 12ª ed., 2020, Juspodivm, p. 1657 e 1658) Quanto ao rito processual, verifica–se que o procedimento adotado pelo juízo de origem foi o disposto no art. 22 da LC nº 64/1990. Todavia, não foi observado o constante do inciso X, ao dispor que, encerrado o prazo da dilação probatória, as partes, inclusive o Ministério Público, poderão apresentar alegações no prazo comum de 2 (dois) dias. A ausência de intimação das partes para apresentação de alegações finais poderia ensejar a decretação de nulidade da sentença e determinação de retorno dos autos para realização desse ato processual. Porém, no caso, não se verifica prejuízo a justificar o retorno dos autos, eis que não houve sequer produção de provas e, além disso, os recorridos, como eventuais prejudicados, em que pese devidamente intimados, não apresentaram contrarrazões ao Recurso. Esta Corte já decidiu que a supressão da fase de alegações finais prevista no art. 22, X da Lei Complementar nº 64/1990 deve ser alegada pela parte que seria, em tese, prejudicada. Confira–se: [...] A par disso, os fatos alegados nos autos estão devidamente comprovados, eis que foram juntadas as mensagens e vídeos postados pelo recorrido na sua rede social, que são provas incontroversas. Diante do exposto, deve ser acolhida a preliminar, cassando–se a decisão do juízo a quo que julgou extinto o processo pela inadequação da via eleita e, superada essa questão, com fundamento na teoria da causa madura, analisado o mérito do Recurso, diante do efeito devolutivo em profundidade (art. 219 do Código Eleitoral c/c art. 1013, § 3º, I do Código de Processo Civil), vez que o processo encontra–se em condições de imediato julgamento. II.ii. Mérito No mérito, a discussão nos autos cinge–se à suposta prática de abuso de poder político, econômico e uso indevido dos meios de comunicação pelo recorrido Aramis Soares do Nascimento Junior em favor de sua candidatura, diante da veiculação de publicações em sua página na rede social Facebook. II.ii.a. A ação de investigação judicial, na forma do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990, tem cabimento diante da constatação de abuso de poder econômico, abuso do poder de autoridade, utilização indevida dos meios de comunicação social, em benefício de candidato, partido ou coligação, in verbis: [...] Com as alterações advindas com a Lei Complementar n° 135/2010, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral passou a levar em consideração uma análise qualitativa do ato sindicado, ou seja, o alto grau de reprovabilidade da conduta (gravidade), em detrimento de um exame meramente quantitativo, voltado, por exemplo, à verificação objetiva da diferença de votos como balizadora da potencialidade (critério não mais aferível). Nesse sentido: [...] II.ii.b. A internet como meio de comunicação social para fins do disposto no art. 22 da LC n° 64/1990 Luiz Carlos dos Santos Gonçalves conceitua veículos de comunicação social como os órgãos de imprensa escrita – os jornais, as revistas, livros e boletins –, o rádio e a televisão. (Direito Eleitoral, Atlas, 3ª ed., p. 299). No tocante à possibilidade de se considerar a internet como meio de comunicação social para fins do disposto no art. 22 da LC n° 64/1990, não se desconhece a jurisprudência desta Corte que, no julgamento do processo nº 0603975–98.2018.6.16.0000, de relatoria do e. Des. Tito Campos de Paula, entendeu que o uso indevido dos meios de comunicação requer a comprovação da utilização de veículos de imprensa, como rádio, jornal ou televisão, em benefício de determinado candidato, seja pela concessão, em seu favor, de espaço privilegiado na mídia, ou pela crítica abusiva aos demais concorrentes e que aplicativos de mensagens e contas pessoais em redes sociais não se enquadram no conceito legal, em Acórdão assim ementado: [...] Todavia, na linha em que caminha a jurisprudência do TSE, deve ser entendido que, diante do uso massivo da internet nas disputas eleitorais, sobretudo devido à popularização dos smartphones, do reduzido custo envolvido, bem como do amplo alcance das redes sociais e aplicativos, essa questão merece melhor reflexão. O e. Min. Amar Gonzaga, ao proferir seu voto no Recurso nº 3102, anotou que, “ainda que a utilização indevida de veículo de comunicação social – notoriamente realizado por meio de rádio, televisão e imprensa escrita – seja a hipótese mais comum dessa espécie de infração, o caput do art. 22 da LC n° 64/90 contempla igualmente o uso indevido do próprio meio de comunicação social.” Acrescentando que “essa redação ampla autoriza, a meu juízo, que a Justiça Eleitoral atue, no âmbito da Internet, para punir a utilização abusiva de impulsionadores de conteúdo por redes sociais ou sites de conteúdo, a disseminação de notícias falsas (fake news), bem como outras condutas praticadas em ambientes virtuais”. (REspE nº 3102, Acórdão, rel. desig. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 27/06/2019). Em outro precedente, o TSE entendeu que apenas os casos que extrapolem o uso normal das ferramentas virtuais é que podem configurar o uso indevido dos meios de comunicação social, sem prejuízo da apuração de eventual propaganda irregular, que possui limites legais distintos da conduta prevista no art. 22 da Lei Complementar 64/1990. Confira–se: [...] Nesses termos, em consonância com a jurisprudência desta Corte Eleitoral que sempre prestigiou a liberdade de expressão e de comunicação, bem como na linha em que caminha a jurisprudência do TSE, somente situações que extrapolem o uso normal das ferramentas virtuais é que podem, eventualmente, configurar o uso indevido dos meios de comunicação social. Fixadas essas premissas passo à análise do caso concreto. II.ii.c. Ausência de gravidade O autor apontou as postagens de mensagens e vídeos pelo recorrido Aramis no seu perfil pessoal na rede social Facebook acima descritos, como configuradoras de abuso dos meios de comunicação. A propósito, nos termos da jurisprudência do TSE, o uso indevido dos meios de comunicação social configura–se quando há abundante exibição de determinado candidato em prejuízo dos demais opositores. Além disso, o abuso deve ter gravidade concreta com força suficiente para interferir na liberdade do voto e afetar a normalidade e a legitimidade das eleições: [...] II.ii.d. Mensagens postadas na página pessoal do recorrido Aramis na Rede Social Facebook Na espécie, a recorrente afirma que são inúmeras as publicações na rede social Facebook falaciosas e tendenciosas do representado Aramis contra o representante desde o ano de 2019. Apresentou, a título de exemplo, as seguintes postagens: [...] O recorrente apresentou cópia do perfil do recorrido Aramis no Facebook nos ids. 21755366 e 21755316, onde constam aproximadamente 20 publicações de mensagens no período de maio a setembro de 2020. Na contestação, o recorrido afirma que as provas trazidas pelo autor se referem a expressão de opinião, exercício de democracia, na qualidade de pessoa “do povo”, por ele realizadas muito antes do período eleitoral, que não falam do “candidato Marcelo”, mas sim exprimem a indignação da pessoa de eleitor, munícipe, revoltado com a administração realizada pelo prefeito. Argumenta que o seu número de seguidores no Facebook é ínfimo perante os seguidores do autor. Afirma que possui questões pessoais com Marcelo, como pessoas/cidadãos normais, sendo que a partir do momento em que decidiu se candidatar ao cargo público, que coincidentemente é o mesmo em que é candidato o autor, nenhuma postagem foi realizada para denegrir ou prejudicar a campanha de Marcelo e, dessa forma, deveria ser levado em consideração 2 (dois) momento distintos, pois a “briga” pessoal existente entre os dois é totalmente diferente dos 2 (dois) candidatos ao cargo de prefeito. Em relação às ações ajuizadas por Marcelo, aduz que ainda não existe decisão judicial transitada em julgado. Da análise das provas apresentadas, em relação às mensagens não se verifica que houve exposição massiva do recorrido Aramis em prejuízo dos demais opositores, seja porque a maioria delas foi realizada no ano de 2019, quando ainda não estava definido quem seria candidato pelos partidos oponentes, seja pelo número diminuto de mensagens que vão desde o ano de 2019 até o período eleitoral de 2020. II.ii.e. Vídeos postados na página pessoal do recorrido Aramis na Rede Social Facebook e ações ajuizadas por Marcelo em face de Aramis O recorrente apresentou na petição inicial 12 vídeos postados na página pessoal do Facebook do recorrido, que foram copiados na seguinte URL: https://drive.google.com/drive/folders/1s6UqIghiu5r5PPZTm__FwuoIzWadWQFg?usp=sharing. Desses vídeos, o recorrente se insurge na petição inicial e no Recurso, especificamente contra 3 deles, quais sejam: Video 1. [...] O vídeo foi publicado em 1º de junho de 2020 (URL: https://www.facebook.com/pichaco.nascimento/videos/1657136137758469). Ata notarial de verificação com a degravação do conteúdo do vídeo id. 21754616. O recorrente afirma que, no vídeo, o recorrido utilizou adjetivos como “fraco”, “medíocre” e “ditador”, asseverando que foi uma das publicações mais gravosas, pois chegava a acusar o próprio pai do Representante. Apresentou os seguintes trechos: Aramis – 23':15”“ Esse jeito tirano, tirano é que gosta de censura.” Aramis – 23':50”“ Cara o pior de tudo é aquele quatorze que tem lá Câmara Municipal que tão tudo aqui ó no bolso.” Aramis – 24':01”“ Como teu pai dizia, teu pai pelo menos era homem de dizer eu tenho no bolso eles, teu pai era homem de falar isso sabe, de conluio com aqueles cretinos lá, patifes lá patifes que não querem fazer, qual é a função do vereador , é fazer acerto com o prefeito pra ter cargo pra todo mundo lá” Aramis – 25':37”“ Não pode chamar aquele bosta de bosta, se chamar aquele merda de bosta da confusão.”Aramis Nascimento, novamente, induz a população de que Marcelo é corrupto: Aramis – 33':00”“ Isso tem o meu nome isso é gratificante de se ter entendeu, não você ser conhecido a boca pequena como ladrão, é que são vagabundo, você é ladrão, você roubou tem agora antes não tinha porra nenhuma. Dos documentos juntados, verifica–se que Marcelo Elias Roque ajuizou Ação de Indenização por Danos Morais cumulada com Ação de Obrigação de Fazer e Pedido de Antecipação de Tutela em face de Aramis Soares do Nascimento Junior, processo que foi autuado sob o nº 0015458–42.2020.8.16.0129 no Juizado Especial Cível de Paranaguá, no qual, em 15/07/2020 (id. 21754466), foi determinado que o recorrido retirasse o referido vídeo da internet. Vídeo 2: [...] A publicação foi realizada no dia 14 de dezembro de 2019. O recorrente alegou que, no vídeo, Aramis chegou a afirmar que Marcelo o ameaçou de morte por intermédio de terceiros, sem qualquer prova mínima de suas alegações. Apresentou os seguintes trechos do vídeo: o Sr. Tiago Ferreira veio aqui agora fazer uma ameaça para mim, com uma pistola e um facão, dentro do carro, ele o filho, um gol g5 verde, placa HOI–9627. Já fui na polícia, na delegacia da polícia militar, já passei os detalhes, tá bom? isso aí é o homem, é o homem que protege o prefeito, se acontecer alguma coisa comigo, eu deixo aqui registrado, isso foi coisa do seu Tiago Ferreira a mando de seu prefeito, que ele manda fazer as coisas e continua:–mas isso não vai me assustar, a noite vou fazer minha live, tá bom? pode mandar matar, prefeito, manda matar, é desse jeito que está Paranaguá, tá bom? mandar esses canalhas que está junto com você aí... O recorrente ajuizou ação autuada sob nº 0010603–54.2019.8.16.0129 no Juizado Especial Cível de Paranaguá (id. 21754166), na qual foi deferido pedido liminar em 29/01/2020, tendo sido determinada a retirada do vídeo do Facebook. Vídeo 3: Trata–se de live realizada por Aramis em sua rede social Facebook no dia 14 de setembro de 2020 (URL: https://www.facebook.com/pichaco.nascimento/videos/1752226071582808), na qual o recorrente afirma que o recorrido trata os servidores municipais na base da “chibata”, que persegue os servidores e os maltrata, utilizando inúmeras palavras de baixo calão, xingamentos, etc. [...] Apresenta os seguintes trechos: Aramis – 34':45 'Vocês que fizeram concurso, por Deus, vocês tinham que entrar na justiça com uma ação coletiva pedindo esse dinheiro de volta, porque ninguém sabe no que foi feito esse dinheiro, não é explicado nada. Continua: Aramis – 40':19' Paranaguá é comandada por uma quadrilha, que se instalou no poder, pode mandar me matar Marcelo Elias Roque propôs ação no Juizado Especial Cível de Paranaguá que foi autuada sob o nº 0015458–42.2020.8.16.0129 (id. 21755216), no qual foi deferida a tutela de urgência requerida, determinando–se que o recorrido removesse de suas redes sociais a publicação sob comento em 23/09/2020. O representante informa na inicial que ajuizou pelo menos nove demandas judiciais em face do recorrido, das quais 3 foram destacadas acima, que demonstrariam de forma inequívoca a utilização dos meios de comunicação por Aramis com o único propósito eleitoreiro. Apresentou a seguinte relação: [...] Conforme acima demonstrado, o recorrente apresentou 12 vídeos postados pelo recorrido Aramis na sua página pessoal da Rede Social Facebook, dos quais se insurgiu especificamente sobre 3 na petição inicial. A par disso, informou que ajuizou pelo menos nove demandas judiciais em face do recorrido, das quais 3 se referem à vídeos destacados na petição inicial. Analisando–se os vídeos, verifica–se que, em relação ao vídeo 2, no qual o recorrente alegou que Aramis chegou a aduzir que “Marcelo o ameaçou de morte por intermédio de terceiros”, trata–se de fato que pode, em tese, caracterizar crime e deve ser apurado pelas autoridades competentes. Nesses termos, não havendo qualquer conotação eleitoral no seu conteúdo, não há que se analisar nesta AIJE se trata–se ou não de notícia falsa, porquanto os fatos já são objeto das ações nº 0014857–36.2020.8.16.0129 e 0010603–54.2019.8.16.0129 em trâmite na Comarca de Paranaguá. Pontue–se que em relação ao demais vídeos, da mesma forma, não se verifica que tenham tido força suficiente para interferir na liberdade do voto e afetar a normalidade e a legitimidade das eleições, seja porque alguns deles foram retirados da página do recorrido no Facebook por determinação judicial antes da disputa eleitoral ou ainda pela diversidade de conteúdo abordado pelo recorrido. O que se verifica é que, de fato, em algumas das falas o recorrido, em tese, pode ter extrapolado o seu direito à liberdade de expressão. Todavia, é de se considerar no contexto dos vídeos a afirmação de Aramis de que Marcelo e ele possuem divergências pessoais entre si como cidadãos comuns e, ainda, que, na qualidade de gestor público do Município de Paranaguá, o recorrente estava sujeito a críticas e elogios. O argumento do recorrente de que ajuizou pelo menos nove demandas judiciais em face do recorrido, o que demonstraria de forma inequívoca a utilização dos meios de comunicação por Aramis com o único propósito eleitoreiro, não merece prosperar, porquanto não se pode olvidar que, nos termos do art. 57–D da Lei nº 9.504/1997, é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores e, diante do ajuizamento das ações a retromencionadas, tem–se que eventual conteúdo ofensivo já está sendo objeto de análise pelo juízo dessas ações. Destaque–se que, ainda que nas ações mencionadas pelo recorrente venha a ser reconhecida a ocorrência de eventual ilícito, nesta AIJE não se verifica a existência de ato abusivo e, por conseguinte, as sanções a serem aplicadas naquelas ações serão outras que não as impostas no art. 22 da LC 64/1990. Assim, considerando que no caso sob análise não houve impulsionamento de conteúdos e não há provas de que Aramis tenha extrapolado o uso normal das ferramentas virtuais, não está presente gravidade concreta com força suficiente para interferir na liberdade de voto e afetar a normalidade das eleições. A abuso de poder político de que trata o art. 22, caput da LC 64/1990, na esteira da jurisprudência consolidada do TSE, configura–se quando o agente público, valendo–se de sua condição funcional e em manifesto desvio de finalidade, compromete a igualdade da disputa e a legitimidade do pleito em benefício de sua candidatura ou de terceiros (TSE, RO 1723–65, Min. Admar Gonzaga, j. 07.12.2017). Para Rodrigo Lopez Zilio, caracteriza–se o abuso de poder econômico na esfera eleitoral quando o uso de parcela do poder financeiro é utilizada indevidamente, com intuito de obter vantagem, ainda que indireta ou reflexa, na disputa do pleito (Direito Eleitoral, 6ª ed., Verbo Jurídico, p. 644). Na espécie, não foi explicado pelo recorrente no que consistiria o suposto abuso de poder político e econômico alegado na petição inicial. As publicações sobre as quais se insurge o recorrente foram veiculadas no perfil pessoal do recorrido na rede social Facebook, sem indicação de impulsionamento. Não há comprovação de que os recorridos são agentes públicos, bem como de que houve a utilização de cargo em benefício de campanha eleitoral, ou ainda, de que tenha havido utilização de recursos financeiros. A respeito, o bem lançado parecer da Procuradoria Regional Eleitoral: A despeito do esforço argumentativo da parte investigante, ora recorrente, tenho que razão não lhe assiste quando defende a abusividade das condutas descritas na exordial. Embora não se desconheça o caráter notadamente ofensivo das publicações impugnadas – muitas delas imputando condutas delituosas e/ou ímprobas ao Prefeito–Municipal de Paranaguá/PR Marcelo Elias Roque – certo é que elas não revelam gravidade suficiente para atrair a incidência das gravíssimas consequências previstas pelo artigo 22,inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/99 (Lei das Inelegibilidades). Veja, quanto a esse ponto, que as teses de abuso de poder político/de autoridade e econômico sequer se sustentam. Não bastasse o fato de os investigados sequer ocuparem mandatos eletivos, cargos, empregos ou funções públicas, inexistem provas nos autos a respeito do eventual dispêndio de recursos financeiros para a veiculação das publicações impugnadas (v.g. impulsionamento). Assim, diante da ausência de abuso do poder econômico ou político, bem como de utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, o julgamento de improcedência da Ação de Investigação Judicial Eleitoral é medida que se impõe. Nas razões do recurso especial, a agravante aponta violação ao art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90, ao argumento de que ficou comprovado o uso indevido dos meios de comunicação, consubstanciado na realização de diversas publicações inverídicas na rede social Facebook do agravado Aramis Soares do Nascimento. Nesse sentido, sustenta que a gravidade da conduta ficou comprovada pelo número elevado de postagens ao longo do período de um ano, bem como pela quantidade de seguidores, compartilhamentos e visualizações das postagens. Inicialmente, observo que a agravante, embora tenha fundamentado o apelo especial em ambas as hipóteses previstas no art. 276, I, a e b, do Código Eleitoral, deix
Data de publicação | 08/03/2022 |
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PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60064947 |
NUMERO DO PROCESSO | 6006494720206159872 |
DATA DA DECISÃO | 08/03/2022 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2020 |
SIGLA DA CLASSE | AREspEl |
CLASSE | Agravo em Recurso Especial Eleitoral |
UF | PR |
MUNICÍPIO | PARANAGUÁ |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | propaganda na Internet |
PARTES | ARAMIS SOARES DO NASCIMENTO JUNIOR, COLIGAÇÃO PRA FAZER MUITO MAIS, LUCIANO COLODEL |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos |
Projeto |