TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO Nº 0601774–80.2018.6.00.0000 CLASSE 11541 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relator: Ministro Carlos Horbach Representante: Coligação Brasil Acima de Tudo, Deus Acima de Todos (PSL/PRTB) e outro Advogados: Karina de Paula Kufa e outros Representados: Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. e outros DECISÃO Trata–se de representação, com pedido de medida liminar, formalizada pela Coligação Brasil Acima de Tudo, Deus Acima de Todos e por seu candidato à Presidência da República, Jair Messias Bolsonaro, contra Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. e os responsáveis por diferentes perfis nas redes sociais Facebook e Instagram, na qual se alega a realização de propaganda eleitoral negativa contra o candidato representante consubstanciada na proliferação de notícias falsas. Aduzem, em síntese, que as redes sociais em questão abrigam diversas postagens que difundem a existência de um grupo de WhatsApp formado por apoiadores da candidatura da coligação representante, o qual estaria preparando uma ofensiva contra eleitores pertencentes a minorias no dia da eleição. Registram, ainda, que as postagens tentam vincular tal grupo à família de seu candidato a presidente da República. Registre–se, de início, que duas das URLs indicadas não são passíveis de remoção, seja por que relativas a um perfil inteiro, sem a individualização da postagem impugnada – https://www.facebook.com/djamila.ribeiro.1 –, seja por que não mais disponível para acesso, tendo sido removida pelo usuário ou pela própria plataforma – https://www.instagram.com/p/BpASRDNH7BF/?utm_source=ig_share_sheet&igshid=1av3oaf9y9p26. Quanto às demais, é importante registrar que a Constituição prevê a liberdade de expressão como garantia fundamental ao exercício da cidadania, consubstanciando pressuposto do regime democrático. Tal disposição constitucional se reflete no âmbito da legislação eleitoral, como se pode depreender do art. 22, § 1º, da Res.–TSE nº 23.551/2017, que consagra “a livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet”. Por outro lado, considerando a natureza eminentemente libertária do ambiente virtual, a mesma Res.–TSE nº 23.551/2017, no caput de seu art. 33, ao tratar da retirada de materiais postados na rede, estabelece que “a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático”. Nesse contexto, os pedidos de remoção de conteúdos de redes sociais devem ser analisados com todo o cuidado, de modo a evitar intervenções indevidas e desnecessárias na democrática disputa de ideias que viceja na Internet. Assim, é recomendável o estabelecimento de balizas claras e objetivas que permitam separar os casos em que tal interferência é justificável daqueles em que ela se apresenta como despicienda e, até mesmo, danosa. O primeiro referencial se retira do art. 21, § 1º, in fine, da mencionada Res.–TSE nº 23.551/2017, o qual explicita que a liberdade de manifestação do eleitor é “passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos”. Essa possibilidade de limitação, porém, não é automática, ou seja, podem ser estipulados critérios complementares a indicar a limitação, ou não, da liberdade de expressão; o que resta ainda mais evidente quando se interpreta o art. 22 em consonância com o art. 33 da resolução sob enfoque. Em outras palavras, quando a liberdade de manifestação do eleitor se concretiza por meios virtuais, como no caso dos autos, em que utilizadas redes sociais, devem ser cotejados outros aspectos complementares, de modo exatamente a não tolher a liberdade do debate democrático na Internet. Um primeiro referencial complementar a ser verificado é o do estabelecimento, no âmbito da própria rede social, do contraditório de ideias, por meio do qual as informações veiculadas são postas em xeque, submetendo–as ao soberano juízo crítico do eleitor. Intervenções em debates nos quais estabelecido o contraditório caracterizariam atitude paternalista da Justiça Eleitoral, pressupondo a ausência de capacidade do eleitor para avaliar os conteúdos que lhe são apresentados. Com efeito, se o debate democrático já se estabeleceu no ambiente virtual, não há razão para a atuação corretiva do Estado, por meio de um provimento jurisdicional. Ademais, um segundo critério deve ser definido, qual seja, o da potencialidade lesiva das postagens cuja remoção se busca. O referencial do potencial lesivo é utilizado pela jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral em diferentes matérias, nas quais a ilicitude da conduta deve ser avaliada em conjunto com sua aptidão para desequilibrar o pleito. O potencial lesivo de material postado na Internet já foi objeto de consideração pelo Plenário do TSE, que o considerou como elemento fundamental para a caracterização da irregularidade do conteúdo, como se pode verificar no julgamento da Rp nº 81770/DF, rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 23.10.2014. Evidentemente, há de se considerar de modo distinto conteúdos veiculados em sítio com livre e grande acesso, numa página de rede social com milhares de seguidores ou num perfil pessoal com poucas conexões, cujo alcance orgânico é ínfimo, pois cada uma dessas possibilidades de divulgação de ideias na Internet tem potencial lesivo diferenciado. Em síntese, tratando–se de conteúdos veiculados no ambiente especialmente livre da Internet, além da ofensa à honra ou da constatação da patente falsidade, há de se considerar a existência de contraditório na própria rede e o potencial lesivo da postagem, que pode ser avaliado, por exemplo, pelo número de compartilhamentos, de comentários ou de reações de apoio ou rejeição dos demais usuários. É com base nesses parâmetros que devem ser analisadas, cuidadosa e individualmente, as postagens impugnadas na presente representação. As postagens relacionadas nas demais URLs indicadas na exordial apresentam um reduzidíssimo índice de compartilhamentos, a evidenciar a ausência de potencial lesivo e de capacidade para desequilibrar o pleito em curso, o que torna desnecessária sua remoção. Ante o exposto, indefiro a liminar pleiteada, determinando a citação da representada identificada na inicial. Publique–se. Brasília, 20 de outubro de 2018. Ministro CARLOS HORBACH Relator