RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 40-51.2016.6.18.0053 - PIAUÍ (53ª Zona Eleitoral - Cocal)Relator: Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho NetoRecorrentes: Gilson da Rocha Fernandes e outro Advogados: Leandro Cavalcante de Carvalho e outroRecorrido: Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) - Municipal Advogados: Diego Augusto Oliveira Martins e outroDECISÃOTrata-se de recurso especial... Leia conteúdo completo
TSE – 405120166180053 – Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 40-51.2016.6.18.0053 - PIAUÍ (53ª Zona Eleitoral - Cocal)Relator: Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho NetoRecorrentes: Gilson da Rocha Fernandes e outro Advogados: Leandro Cavalcante de Carvalho e outroRecorrido: Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) - Municipal Advogados: Diego Augusto Oliveira Martins e outroDECISÃOTrata-se de recurso especial interposto por Gilson da Rocha Fernandes e Eudes Ventura da Silva contra acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (TRE/PI) que negou provimento a recurso eleitoral e, por consequência, manteve a condenação dos recorrentes ao pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pela prática de propaganda eleitoral extemporânea negativa.Eis a ementa do acórdão regional:RECURSO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. LEI Nº 9.504/97. CONTEÚDO NEGATIVO. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 36, § 3º, DA LEI Nº. 9504/97. RECURSO DESPROVIDO.1 - O art. 36-A, caput, da Lei nº 9.504/97, trata de propaganda positiva, jamais podendo se transmutar em um permissivo legal tendente a abolir condutas antiéticas ou antidemocráticas, por meio das quais as campanhas eleitorais mais parecem troca de acusações entre os adversários do que propriamente a apresentação de propostas de governo e de plataformas políticas.2 - Não tendo o recorrente se limitado a tecer críticas à atual administração municipal, uma vez que, utilizando-se de palavras com apelo vexatório, pretendeu denegrir a imagem do atual prefeito e então pré-candidato à reeleição, ultrapassando sobremaneira o legítimo exercício do direito à liberdade de expressão, resta configurada propaganda eleitoral negativa.3 - Observância dos princípios de razoabilidade e proporcionalidade na fixação do quantum da multa no r. decisum questionado.4 - Manutenção da sentença.5 - Recurso desprovido. (Fls. 164-164v)Os recorrentes apontam violação aos arts. 275 do Código Eleitoral, 36 e 36-A da Lei nº 9.504/97; 5º, XIV, IX, e 220, § 1º, da Constituição Federal.Alegam que o acórdão regional não teria levado em conta os argumentos trazidos na instrução processual, os quais provam que a decisão de primeiro grau não tem fundamento. Afirmam que não há falar em propaganda eleitoral antecipada, porquanto, à época dos fatos, não havia candidatos escolhidos em convenção. Defendem que, para a caracterização da responsabilidade, necessária seria a comprovação do prévio conhecimento acerca dos fatos narrados, inexistente nos autos. Asseveram que, na publicação questionada, não houve alusão a eventual candidatura, nem pedido de voto. Sustentam que apenas informaram à população sobre os problemas da cidade, nos limites da liberdade de imprensa. Indicam divergência jurisprudencial no tocante à interpretação do art. 27, § 2º, da Res.-TSE nº 23.370/11. Colacionam precedentes de outros TREs e desta Corte no sentido de que a mera crítica à política governamental não configura propaganda ofensiva. O presidente do TRE/PI inadmitiu o processamento do recurso especial (fls. 195-198).Sobreveio interposição de agravo, ao qual dei provimento, com base no art. 36, § 4º, do RITSE, apenas para melhor exame do recurso especial, e determinei a intimação do PSDB para contrarrazoar o apelo (fls. 286-288).A Procuradoria-Geral Eleitoral opinou pelo não conhecimento do agravo e, caso conhecido, pelo seu provimento parcial, para conhecimento do recurso especial apenas quanto à alegação de violação a lei, que, nessa parte, deveria ser desprovido (fls. 279-284).Nas contrarrazões ao apelo nobre (fls. 291-326), o PSDB apresenta a seguinte argumentação: a) impossibilidade de rediscussão da matéria fática em sede de recurso especial;b) ausência de demonstração de violação a lei ou de divergência jurisprudencial; c) existência de propaganda eleitoral antecipada negativa mediante postagem no Blog Cocal Notícias, com o nítido propósito de denegrir a imagem do então pré-candidato à reeleição; d) as peculiaridades do caso demonstram o conhecimento prévio dos recorrentes acerca da propaganda impugnada. É o relatório. Decido. Preliminarmente, afasto a apontada violação ao art. 275 do Código Eleitoral, porquanto os recorrentes sequer opuseram embargos de declaração perante a Corte de origem.Quanto ao mérito, o recurso merece prosperar.Na espécie, o TRE/PI assentou a prática de propaganda eleitoral antecipada negativa consistente na veiculação de mensagem pelo primeiro recorrente, Gilson da Rocha Fernandes, em portal eletrônico de propriedade do segundo recorrente, Eudes Ventura da Silva, com o objetivo de denegrir a imagem do então pré-candidato à reeleição ao cargo de prefeito do Município de Cocal/PI, extrapolando o exercício do direito à liberdade de expressão.Confira-se o seguinte excerto do voto condutor do acórdão regional: No decisum vergastado, o juízo de piso entendeu que houve propaganda eleitoral extemporânea, consistente na veiculação em portal eletrônico de propriedade de um dos Representados, Sr. EUDES VENTURA DA SILVA, de nota emitida pelo Representado GILSON DA ROCHA FERNANDES, então pré-candidato à prefeitura do município de Cocal/PI, cujo conteúdo visou denegrir a imagem de adversário político e então pré-candidato à reeleição, o atual prefeito Rubens de Sousa Vieira.Em sua sentença, consignou o MM. juiz a quo que:'Depreende-se da publicação anexada às fls. 22/23, exibida em postagem do blog cocal notícias na data de 21/07/2016, conforme link expresso às fls. 21, a comprovação que foi veiculada propaganda antecipada negativa pelo futuro candidato ao cargo de prefeito para o pleito eleitoral de 2016 em Cocal-PI, o Sr. 'Gilson da Serraria' em detrimento de seu adversário político e pré-candidato à reeleição, o atual prefeito, Rubens de Sousa Vieira.Verifica-se, assim, que a propaganda negativa demonstrada nos autos claramente associa o nome do representado GILSON DA ROCHA FERNANDES, 'Gilson da Serraria', à sua candidatura de prefeito, bem como deixa transparecer a narrativa de supostos fatos desabonadores à imagem política de seu adversário político, o atual prefeito municipal e pré-candidato, Rubens de Sousa Vieira.'[...]O caso em exame trata de propaganda eleitoral negativa, por meio da qual se pretende desqualificar as qualidades do adversário em benefício de outrem. Na lição do eminente eleitoralista José Jairo Gomes (Direito Eleitoral, 12º Ed. São Paulo: Atlas 2016, p. 484), 'a propaganda negativa tem por fulcro o menoscabo ou a desqualificação dos candidatos oponentes, sugerindo que não detém os adornos morais ou a aptidão necessária à investidura em cargo eletivo. Os fatos que a embasam podem ser total ou parcialmente verdadeiros, e até mesmo falsos...'.A seguir, a íntegra da nota postada no multicitado blog:'O Pré-candidato Gilson da Serraria procurou a nossa reportagem para responder sobre o resultado de pesquisa divulgada nesta quinta-feira 21 de Julho no Portal 180 graus, pesquisa feita pelo instituto BRVOX.NOTA DE GILSON DA SERRARIADizendo o seguinte:Que o Prefeito 'PROGRAMADO PARA MENTIR' divulga uma pesquisa sonhadora sendo que ele ou leu de cabeça para baixo ou a pesquisa foi feita dentro da casa dele.Sendo que a verdade é outra, eu Gilson da Serraria pré candidato tenho pesquisa interna que o resultado é de 52% para mim e 21% para ele, para que ele tivesse um bom resultado teria que ter pago os direitos dos professores. Não ter enganado a maioria dos pais de família com falsas promessas, não ter mandado uma Lei de Trânsito prejudicando as famílias cocalenses e nem ter perdido um partido do tamanho do PMDB.Baseado em depoimentos da população a história é bem diferente, o que é que o povo diz? Votei, não voto mais. ME ENGANOU. ENGANOU MEU PAI, MINHA MÃE, MEU TIO, MINHA TIA, MEU AVÔ, MINHA VÓ, MEU IRMÃO, MINHA IRMÃ, MEU FILHO, MINHA FILHA, MEU SOBRINHO, MINHA SOBRINHA, MEU GENRO, MINHA NORA etc. Finalizando Ele está perdido.'Com efeito, verifica-se que, do teor da mensagem veiculada no portal eletrônico COCAL NOTÍCIAS, em 21/07/2016, portanto, em data anterior ao permitido pela legislação eleitoral (a partir de 16/08/2016), o recorrente GILSON DA ROCHA FERNANDES, pré-candidato ao cargo de prefeito de Cocal/PI, não se limitou a tecer críticas à atual administração municipal, pois, utilizando-se de palavras com apelo vexatório, pretendeu denegrir a imagem do atual prefeito e então pré-candidato à reeleição, ultrapassando sobremaneira o legítimo exercício do direito à liberdade de expressão, numa patente configuração de propaganda eleitoral negativa.[...]Ademais, não há que se falar em ausência de pedido explícito de voto, a fim de caracterizar a exceção prevista no art. 36-A, caput, da Lei nº 9.504/97, com redação dada pela minirreforma eleitoral (Lei nº 13.165/2015). É que tal dispositivo trata de propaganda positiva, jamais podendo se transmutar em um permissivo legal tendente a abolir condutas antiéticas ou antidemocráticas, por meio das quais as campanhas eleitorais mais parecem troca de acusações entre os adversários do que propriamente a apresentação de propostas de governo e de plataformas políticas.Com efeito, o recorrente GILSON DA ROCHA FERNANDES não teceu qualquer consideração acerca de suas qualidades pessoais, tampouco expôs plataformas, projetos políticos, planos de governo ou mesmo seu posicionamento pessoal sobre questões relacionadas ao bem-estar da sociedade (art. 36-A e incisos da Lei das Eleições).Pelo contrário, ao declinar na mensagem objeto da presente ação frases como 'PREFEITO PROGRAMADO PARA MENTIR', (...), '...Votei, não voto mais, ME ENGANOU. ENGANOU MEU PAI, MINHA MÃE...' (...), 'Finalizando Ele está perdido', feriu de morte princípios básicos de urbanidade e civilidade, tão carentes ainda no processo eleitoral brasileiro, onde os mais prejudicados são os eleitores, os quais anseiam por dias melhores para sua cidade, não mais admitindo ter de ouvir discursos inflamados, recheados de expressões desrespeitosas, cujo único objetivo é denegrir a imagem do adversário.Assim, como bem observou o Procurador Regional Eleitoral, em seu parecer de fls. 158/159-v, 'não se trata de mera crítica à atuação do gestor municipal, visto que não se vislumbra qualquer debate de ideias, tratando-se de verdadeira propaganda eleitoral negativa, com intenção de atribuir qualidade negativa ao adversário político, diante do eleitorado.' (Fls. 166-168 - grifei)O entendimento do Tribunal Regional merece reparos, uma vez que não há elementos descritos na moldura fática do voto condutor que possam caracterizar extrapolação do direito à liberdade de expressão e pensamento. No julgamento do REspe nº 29-49/RJ, de relatoria do Ministro Henrique Neves da Silva, DJe de 25.8.2014, esta Corte Superior fixou parâmetros para a caracterização de propaganda eleitoral antecipada veiculada, especialmente, por meio das mídias eletrônicas, tal como na espécie.Eis a ementa do referido julgado:ELEIÇÕES 2012. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. INTERNET. FACEBOOK. CONTA PESSOAL. LIBERDADE. MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. PROVIMENTO.1. A utilização dos meios de divulgação de informação disponíveis na internet é passível de ser analisada pela Justiça Eleitoral para efeito da apuração de irregularidades eleitorais, seja por intermédio dos sítios de relacionamento interligados em que o conteúdo é multiplicado automaticamente em diversas páginas pessoais, seja por meio dos sítios tradicionais de divulgação de informações.2. A atuação da Justiça Eleitoral deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático.3. As manifestações identificadas dos eleitores na internet, verdadeiros detentores do poder democrático, somente são passíveis de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos.4. A propaganda eleitoral antecipada por meio de manifestações dos partidos políticos ou de possíveis futuros candidatos na internet somente resta caracterizada quando há propaganda ostensiva, com pedido de voto e referência expressa à futura candidatura, ao contrário do que ocorre em relação aos outros meios de comunicação social nos quais o contexto é considerado. 5. Não tendo sido identificada nenhuma ofensa à honra de terceiros, falsidade, utilização de recursos financeiros, públicos ou privados, interferência de órgãos estatais ou de pessoas jurídicas e, sobretudo, não estando caracterizado ato ostensivo de propaganda eleitoral, a livre manifestação do pensamento não pode ser limitada.6. Hipótese em que o Prefeito utilizava sua página pessoal para divulgação de atos do seu governo, sem menção à futura candidatura ou pedido expresso de voto.Recurso provido para julgar improcedente a representação. (REspe nº 29-49/RJ, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 25.8.2014 - grifei)Na mesma linha, transcrevo, ainda, a ementa do seguinte julgado:ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. NAO CONFIGURAÇÃO. DESPROVIMENTO.1. As opiniões políticas divulgadas nas novas mídias eletrônicas, sobretudo na internet, recebem proteção especial, em virtude da garantia constitucional da livre manifestação do pensamento.2. Não sendo identificadas, no caso, ofensa à honra de terceiros, falsidade, utilização de recursos financeiros, públicos ou privados, interferência de órgãos estatais ou de pessoas jurídicas e não estando caracterizado ato ostensivo de propaganda eleitoral, não há que se falar em propaganda eleitoral extemporânea.3. Agravo regimental desprovido. (AgR-REspe nº 926-67/PB, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 25.4.2016)Registre-se que a doutrina adverte quanto aos riscos decorrentes da excessiva proteção conferida pela legislação e pela jurisprudência eleitoral à honra e à reputação dos políticos e candidatos em detrimento da liberdade de expressão no âmbito da propaganda eleitoral na Internet. A propósito, destaco o seguinte trecho da obra Direito Eleitoral e Liberdade de Expressão¹, na qual a ilustre autora discorre, de forma crítico-construtiva, sobre a dogmática jurídica da propaganda eleitoral veiculada na Internet: A nova regulamentação da propaganda eleitoral na Internet não serviu, porém, para impedir as restrições indevidas à liberdade de expressão. Pelo contrário, a Lei nº 9.504/1997 conferiu diversos instrumentos para a censura de manifestações espontâneas nas redes sociais, como a exclusão de publicações e a suspensão do acesso a websites. O §3º do art. 57-D (incluído pela Lei nº 12.891/2013), por exemplo, fixou que 'sem prejuízo das sanções civis e criminais aplicáveis ao responsável, a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação do ofendido, a retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatos em sítios da Internet, inclusive redes sociais'. Já o art. 57-I prevê que 'a requerimento de candidato, partido ou coligação (...) a Justiça Eleitoral poderá determinar a suspensão, por vinte e quatro horas, do acesso a todo conteúdo informativo dos sítios da Internet que deixarem de cumprir as disposições desta Lei', com a possibilidade de duplicar o período de suspensão a cada reiteração de conduta. A lei permite, ainda, a aplicação de todas as penalidades previstas na lei ao provedor de conteúdo e de serviços multimídia que hospeda a divulgação da propaganda eleitoral de candidato, de partido ou de coligação, sempre que 'no prazo determinado pela Justiça Eleitoral, contado a partir da notificação de decisão sobre a existência de propaganda irregular, não tomar providências para a cessação dessa divulgação' (art. 57-F, LE).Mais uma vez, o maior problema está na excessiva proteção conferida pela legislação e pela jurisprudência eleitoral à honra e à reputação dos políticos e candidatos. Frequentemente, críticas e opiniões negativas veiculadas pelos eleitores, jornalistas e blogueiros na Internet, inclusive em tom jocoso, são caracterizadas como 'dano à honra' ou como 'agressões e ataques a candidatos'. Como resultado, a Internet tem sido alvo de uma enxurrada de processos judiciais durante os pleitos. Decisões judiciais determinam a aplicação de multa, a remoção de posts, notícias, vídeos e demais conteúdos, a veiculação de respostas e a edição dos textos publicados ou mesmo a alteração dos títulos de matérias.Em casos extremos, as críticas na Internet têm dado ensejo até as sanções criminais. Durante as eleições de 2012, por exemplo, o diretor-geral do Google no Brasil teve contra si ordem de prisão e chegou a ser detido, em razão do descumprimento de determinação do TRE de Mato Grosso do Sul para que o Google retirasse vídeo do YouTube que veiculava críticas a candidato à disputa para a Prefeitura de Campo Grande.Para os cidadãos comuns, esse entendimento é especialmente perigoso. Na maioria dos casos, estes não dispõem de recursos para contratar advogados, nem lucram com as manifestações na rede. Assim, as decisões da Justiça Eleitoral exercem um poderoso efeito silenciador de seu discurso, levando-os a não publicar manifestações políticas, com receio da responsabilização. A violação à liberdade de expressão é patente. E mais, a impraticabilidade do controle da Justiça Eleitoral sobre todas as manifestações na internet faz que a atuação mais rígida nos casos que chegam à Justiça Eleitoral produza uma violação à paridade de armas entre os candidatos. O controle e a punição são impostos de forma necessariamente seletiva, beneficiando os candidatos e partidos que ingressam com mais ações judiciais. E por isso que, em regra, o controle sobre quais conteúdos e tons de crítica são ou não aceitáveis no debate público deve ser feito pelos próprios indivíduos, não podendo a Justiça Eleitoral estabelecer o padrão de crítica ou de civilidade aceitável nas campanhas.Há, é claro, a possibilidade de abusos e de produção de danos injustos à honra dos candidatos também na Internet. Informações falsas podem rapidamente se disseminar pela rede, valendo-se dos recursos de compartilhamento de publicações. Contudo, como defendido ao longo deste livro, a Justiça Eleitoral deve atuar apenas nos casos mais graves e sempre de forma excepcional. Nessas hipóteses, o dano injusto à reputação deve ser reparado preferencialmente por meio do direito de resposta, também assegurado na Internet (art. 57-D, LE), e por outros mecanismos que não envolvam a retirada de conteúdo. Essa mudança de compreensão a respeito da configuração de danos à honra em manifestações na Internet passa a ser ainda mais fundamental a partir das eleições municipais de 2016. Com a proibição do financiamento empresarial e o encurtamento do período eleitoral e da propaganda na TV e no rádio, a Internet e as redes sociais tendem a se transformar em um dos principais - senão o principal - instrumentos das campanhas eleitorais. (Grifei)Desse modo, de acordo com a moderna interpretação jurisprudencial e doutrinária acerca da propaganda eleitoral antecipada nas novas mídias eletrônicas, não há nenhuma irregularidade no texto impugnado, ainda que nele estejam contidas críticas incisivas em relação ao pré-candidato à reeleição.Por pertinentes, transcrevo excertos do voto por mim proferido no julgamento do REC-RP nº 380-29/DF, ocorrido em 7.8.2014, no qual se analisou hipótese de propaganda eleitoral antecipada negativa em discurso político realizado em ambiente restrito:A moldura fática delineada no caderno processual aponta para a incidência, na espécie, de discurso político, realizado no recinto de Clube de Maçonaria, na cidade de Barra do Corda/MA (ambiente restrito, portanto!), marcado por erronia e imprecisão, mas que não destoa da livre manifestação de pensamento e do direito de crítica. De outro lado, não há falar, a meu ver, em ofensa aos direitos de personalidade do pré-candidato Aécio Neves. Também não se está diante de comportamento cujo objetivo principal seja o de denegrir a imagem de adversário político, mesmo porque, como antes explicitado, nem se está no período eleitoral, e o Representado não se afigura pré-candidato à Presidência da República, mas sim ao cargo de Governador do Estado do Maranhão. [...][...]Com efeito, ainda da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, colhe-se o entendimento de que mesmo críticas desabonadoras sobre adversários políticos, desde que não ultrapassem o espectro de incidência de questões de interesse político comunitário, não caracterizam propaganda eleitoral antecipada negativa. Confira-se: PROPAGANDA PARTIDÁRIA. ALEGAÇÃO DE DESVIO DE FINALIDADE. CRÍTICA. GOVERNO. FILIADO. PRÉ-CANDIDATO. PROPAGANDA ANTECIPADA. INFRAÇÃO À LEI N° 9.504197. PEDIDO DE CASSAÇÃO DO PROGRAMA PREJUDICADO. PENA DE MULTA. IMPROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO.1. A realização de críticas, ainda que desabonadoras, sobre a atuação de filiados e de governo sob a direção de agremiação adversária não caracteriza propaganda eleitoral subliminar e fora do período autorizado em lei, desde que não ultrapassem o limite da discussão de temas de interesse político comunitário, como o ocorrido na hipótese dos autos.2. Improcedência da representação pela não-configuração de ofensa ao art. 36 da Lei das Eleições.(Rp n° 994 de 9.8.2007, Rel. Min. José Augusto Delgado, DJe de 4.9.2007). [...]No caso em discussão, as críticas (infelizes, reconheça-se!) feitas pelo Representado, fora do Congresso Nacional e antes do período eleitoral e da formalização de quaisquer candidaturas, não denotaram ofensas 'de todo alheias' à condição de Senador. Nem ultrapassaram, a meu ver, 'as ralas da crítica à atuação partidária' do pré-candidato Aécio Neves.[...]No caso, não vejo como aplicar as ressalvas porque, repise-se, não há, no conteúdo da fala impugnada, uma ofensa propriamente dita, mas sim uma crítica política, comum, aliás, ainda que imprecisa e de conteúdo errático. De outro lado, não há evidências materiais convincentes de que a manifestação política levada a efeito pelo Representado tenha assumido a forma indiscutível de propaganda eleitoral antecipada, na modalidade negativa. Não bastasse, o discurso tem (alguma) conexão com o mandato de Senador e muito bem poderia ter sido proferido da Tribuna do Congresso, sem maiores traumas eleitorais.[...]No caso concreto, como tantas vezes explicitado, com bem ponderou o d. representante do MPE, está-se diante de crítica política, ainda que infundada e imprecisa, sobre tema de interesse comunitário. E mesmo que a fala impugnada sugira, sim, intenção eleitoreira, não há como negar-lhe o cunho político-partidário. (fls. 8-18)Na mesma linha de raciocínio acima adotada, entendo que, no conteúdo da mensagem ora impugnada, não há ofensa propriamente dita, mas sim críticas políticas, ainda que desabonadoras e imprecisas, as quais são insuficientes para a configuração da propaganda eleitoral antecipada negativa.Registre-se, ainda, o quanto decidido na Rp nº 1279-27/DF, de minha relatoria, julgada em 23.9.2014, na qual a propaganda, ao contrário do que verificado na espécie, ultrapassou os limites da crítica e do debate político, ao promover mensagem injuriosa e ofensiva à honra da candidata. Reproduzo a ementa do respectivo acórdão:ELEIÇÕES 2014. ELEIÇÃO PRESIDENCIAL. PROPAGANDA ELEITORAL. DIREITO DE RESPOSTA. INSERÇÃO. OFENSA DIRETA A CANDIDATA. PROCEDÊNCIA.1. É assente nesta Corte que as críticas, mesmo que veementes, fazem parte do jogo eleitoral, não ensejando, por si sós, o direito de resposta, desde que não ultrapassem os limites do questionamento político e nem descambem para o insulto pessoal, para a imputação de delitos ou de fatos sabidamente inverídicos.2. Os representados não se limitaram a tecer críticas de natureza política a adversários, ínsitas ao debate eleitoral franco e aberto.3. Ao se valerem dos termos 'corrupção' e 'roubalheira', fizeram alusão direta a prática de crimes capitulados na legislação penal brasileira.4. O art. 58 da Lei nº 9.504/97 dispõe que 'a partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social'.5. Configurada ofensa à honra da candidata.6. Representação julgada procedente para conceder o direito de resposta de 1 (um) minuto no rádio (bloco das 12h) e 2 (dois) minutos na televisão (1 minuto no bloco das 13h e 1 minuto no das 20h30), que deverão ser veiculados durante o horário eleitoral gratuito do Partido representado, nos termos do art. 58, § 3º, III, da Lei nº 9.504/97. Portanto, as críticas a adversários políticos, mesmo que veementes, fazem parte do jogo democrático, de modo que a intervenção da Justiça Eleitoral somente deve ocorrer quando há ofensa à honra ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos, circunstâncias não verificadas na espécie. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, com base no art. 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, para julgar improcedente a representação e, consequentemente, afastar a multa aplicada aos recorrentes. Publique-se.Brasília, 26 de setembro de 2017.Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho NetoRelator(1) OSORIO, Aline. Direito Eleitoral e Liberdade de Expressão. Editora/Fórum, 2017, p. 347-349.
Data de publicação | 26/09/2017 |
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PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | SADP |
NÚMERO | 4051 |
NUMERO DO PROCESSO | 405120166180053 |
DATA DA DECISÃO | 26/09/2017 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2016 |
SIGLA DA CLASSE | RESPE |
CLASSE | Recurso Especial Eleitoral |
UF | PI |
MUNICÍPIO | COCAL |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | fato sabidamente inverídico |
PARTES | EUDES VENTURA DA SILVA, EUDES VENTURA DA SILVA, GILSON DA ROCHA FERNANDES, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) - MUNICIPAL |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto |
Projeto |