TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600001–40.2021.6.06.0028 – CLASSE 12626 – JUAZEIRO DO NORTE – CEARÁ Relator: Ministro Sérgio Banhos Agravantes: João Paulo Teixeira Ramos e outros Advogados: José Boaventura Filho – OAB: 11867/CE e outros Agravado: Gilmar Luiz Bender Advogados: Sérgio Gurgel Carlos da Silva – OAB: 2799/CE e outros Agravado:... Leia conteúdo completo
TSE – 6000014020216059904 – Min. Sergio Silveira Banhos
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600001–40.2021.6.06.0028 – CLASSE 12626 – JUAZEIRO DO NORTE – CEARÁ Relator: Ministro Sérgio Banhos Agravantes: João Paulo Teixeira Ramos e outros Advogados: José Boaventura Filho – OAB: 11867/CE e outros Agravado: Gilmar Luiz Bender Advogados: Sérgio Gurgel Carlos da Silva – OAB: 2799/CE e outros Agravado: Gledson Lima Bezerra Advogados: José Erinaldo Dantas Filho – OAB: 11200/CE e outra Agravado: Giovanni Sampaio Gondim Advogados: Hélio Parente de Vasconcelos Filho – OAB: 34231/CE e outro DECISÃO João Paulo Teixeira Ramos, José Ailton de Andrade Viana, Cícera Damiana dos Santos Leandro e Letícia Leandro de Souza interpuseram agravo em recurso especial (ID 157769712) em face de decisão do Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (ID 157769706) que negou provimento a recurso especial (ID 157769694) manejado em desfavor do acórdão (ID 157769656) que, por maioria, rejeitou as preliminares suscitadas e, no mérito, por maioria, deu provimento a recurso para reformar a sentença do Juízo da 28ª Zona Eleitoral daquele Estado e julgar improcedentes a AIJE 0600238–1.2020.6.06.0028 e a AIME 0600001–40.2021.6.06.0028, ajuizadas em face dos agravados, candidatos eleitos aos cargos de prefeito e vice–prefeito do Município de Juazeiro do Norte/CE, nas Eleições de 2020, por entender não comprovada a prática de abuso do poder econômico. Eis a ementa do aresto recorrido (ID 157769658): ELEIÇÕES 2020. PREFEITO E VICE–PREFEITO. RECURSOS ELEITORAIS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. ILEGITIMIDADE CIDADÃO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. MÉRITO. USO DE HELICÓPTERO. CARREATA. EMPRESÁRIO DOADOR. DERRAME DE SANTINHOS. DISTRIBUIÇÃO DE COMBUSTÍVEIS. TESTEMUNHAS CONTRADITÓRIAS. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA. GRAVIDADE E POTENCIALIDADE. DOCUMENTOS OFICIAIS DE AVIAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. AÇÕES AUTÔNOMAS. RECURSOS PROVIDOS. AÇÕES IMPROCEDENTES. 1 – PRIMEIRA PRELIMINAR: DA AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE DO RECURSO INTERPOSTO POR GLEDSON BEZERRA E GIOVANNI SAMPAIO. REJEIÇÃO. Ainda que os Recorrentes tenham reproduzido grande parte de narrativa fático–jurídica constante em memoriais, emerge dos autos que se insurgiram contra as motivações centrais lançadas na sentença combatida, consistente no reconhecimento do abuso de poder econômico decorrente da utilização de helicóptero em campanha com derramamento de propaganda eleitoral. Restou explicitado, inclusive, as razões pelas quais, contrariamente ao Magistrado de primeiro grau, não ficou demonstrada qualquer interferência ou desequilíbrio no pleito, com claras manifestações à prova produzida. Na linha da jurisprudência do STJ, conquanto atendida a coerência e vinculação ao teor da decisão recorrida, a reiteração das razões anteriormente apresentadas não constitui ofensa ao princípio da congruência. 2 – SEGUNDA PRELIMINAR: DA REUNIÃO DOS PROCESSOS – AIJE/AIME E PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. REJEIÇÃO. A Ação de Investigação Judicial Eleitoral e a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo possuem objetos completamente distintos da Prestação de Contas de Campanha. São ações autônomas e com consequências distintas. A AIJE e AIME visam tutelar a normalidade e a legitimidade das eleições com consequências gravosas, tais como cassação de registro de candidatura, diploma ou mandato, bem como declaração de inelegibilidade. Por outro lado, a prestação de contas, que enseja aprovação ou desaprovação, objetiva uma análise técnica dos recursos envolvidos na campanha, permitindo a realização de contrastes e avaliações, com o objetivo de identificar divergências entre os dados constantes no processo e a realidade da campanha eleitoral. Não há comunhão de pedidos ou causas de pedir deduzidos nos processos referidos, que possam resultar em vinculação entre as decisões a serem proferidas nas referidas demandas, de sorte a não incidir o disposto no art. 96–B, da Lei nº 9.504/97. Nos termos da Jurisprudência do TSE, o resultado atingido em uma AIJE ou AIME não vincula necessariamente a decisão a ser tomada na PC, e vice–versa, não bastando, assim, que as contas tenham sido reprovadas para que se chegue, automaticamente, à aplicação das severas sanções. 3 – TERCEIRA PRELIMINAR: DA INOVAÇÃO FÁTICA EM SEDE RECURSAL. REJEIÇÃO. As postagens apresentadas no parecer da PRE referem–se a fotos, panfletos e argumentos fáticos, que foram apontados, abordados e analisados em toda a demanda, por todas as partes do processo, desde a origem, seja em Petição Inicial, Contestação ou Alegações Finais, não havendo que falar em documento, fato ou argumento novo. Não há, portanto, sequer violação ao contraditório e a ampla defesa, em primeiro e segundo grau, e tratando–se unicamente de provas já apreciadas, a tempo e modo por cada ator processual, sua valoração, por ocasião do julgamento dos recursos interpostos, será detidamente realizada no mérito. 4 – MÉRITO. Da análise da documentação constante dos autos, verifica–se que um fato é incontroverso, qual seja, o sobrevoo da aeronave de matrícula PR–GCJ – de propriedade da empresa Tecnolity, cujo sócio administrador é o investigado Sr. Gilmar Bender –, no início e final da carreata dos candidatos demandados, ocorrida no dia 24/10/2020, em Juazeiro do Norte. Além de vídeos, fotografias e postagens em redes sociais, o próprio piloto da aeronave declarou em Juízo que efetuou o sobrevoo no ato de campanha, nos momentos referidos, ocasião em que soltou papéis picados metalizados. Tais informações são corroboradas, ainda, por documentos de órgãos oficiais de aviação, que precisaram os horários de pouso e decolagem da aeronave PR–GCJ no Aeroporto de Juazeiro do Norte/CE, bem como que resultou em 2 (dois) momentos, em torno de 20min cada, na concentração e no término da carreata dos candidatos promovidos. Por sua vez, a utilização de mencionado helicóptero no dia 14/11/2020, não foi confirmada por nenhum documento oficial. Esses que coincidem com os relatos do piloto da aeronave investigada, que resolutamente informou que, nesse dia, efetuou voo apenas em Fortaleza, Eusébio, Miraíma e Iguatu. Assim, não há como concluir, com base nas provas dos autos, sem o uso de conjecturas e presunções, que o helicóptero, matrícula PR–GCJ, seja o responsável pelo derrame de santinhos/panfletos na véspera do pleito. 5 – As denúncias oriundas do Sistema Pardal (TSE), referentes à existência de helicóptero em Juazeiro do Norte no dia 14/11/2020, não apresentam evidências contundentes que conduzam à certeza de tal constatação. O ID 15421977 refere–se apenas a áudio do relato de uma denunciante de que havia aeronave, sem que se ouvisse sequer barulho de helicóptero ao fundo. Os IDs 15422077, 15422377, 15422427 mostram vídeos em que apenas são vistos papéis voando, mas nenhum helicóptero. Os IDs 15422177, 15422277 e 15422477 apresentam vídeos e imagens pelas quais se vê apenas papéis no chão. Importa ressaltar que os depoimentos das testemunhas arroladas pelos autores, apresentam declarações tendenciosas e contraditórias com as provas dos autos. Referidas testemunhas, assim, revelam circunstâncias que retiram ou, pelo menos, diminuem a credibilidade de suas declarações, seja em virtude de suas próprias atitudes ou circunstâncias, seja em razão das tendências políticas (preferências ideológico–partidárias) expressadas nas suas declarações. 6 – Verifica–se do Relatório de Despesas Efetuadas, que integra a prestação de contas dos candidatos demandados, o registro de combustível adquirido no Posto Fontes, no valor de R$ 13.000,00 (treze mil reais), documento apresentado não só pelos Impugnados na AIME, mas inclusive pela própria parte autora. Tal prática, ademais, está devidamente prevista na Resolução–TSE nº 23.607/2019 como gasto eleitoral, desde que direcionada para fins específicos, entre eles, participação de veículos em carreatas. 7 – As circunstâncias e as peculiaridades do caso específico demonstram, a teor dos artigos 38, caput, e 40–B da Lei Eleitoral, artigo 19, §§ 1º e 7°, da Resolução–TSE n° 23.610/2019, dos arts. 241 e 243, VIII, do Código Eleitoral, que a estratégia de apoplexia evidencia a promoção da candidatura dos Recorrentes e de seu partido, visto que a prática somente a beneficia diretamente e de forma inescusável. Assim, essa prática, infelizmente, comum de campanha, induz a responsabilidade do candidato pelo derrame. Não induz, entretanto, à conclusão cristalina de que 100% do material fabricado fora distribuído pelos candidatos e partidos e mediante o uso de helicóptero. Referida prática, ensejaria aqui a aplicação de multa, todavia, sendo o prazo legal de protocolo da ação até 48 horas após o pleito (RE 164–34.2016.6.06.0064), resta impossível nas presentes ações de AIJE e AIME, interpostas após referida data. 8 – As alegações de Fake News/desinformação/informação falsa/informação sabidamente inverídica não se sobressaem, há vista que, de fato, o julgamento do processo de registro de candidatura, que enseja anotações oficiais de “deferido com recurso” ou “indeferido com recurso”, significa, juridicamente, que o candidato está “liberado” para todo e qualquer ato de campanha. É exatamente o que dispõe o artigo 16–A da lei eleitoral. Quando um candidato concorre ao cargo eletivo “sub judice”, não é possível saber se a decisão final será ou não favorável, e a lei permite que ele participe efetivamente do processo eleitoral, evitando prejuízos irreparáveis, tanto ao candidato como para a sociedade. Não há impedimentos à participação no processo democrático. Restou, assim, evidente a intenção de mostrar ao eleitorado, de outra forma, que aqueles poderiam exercer seu direito de voto teclando na urna o número dos investigados/impugnados. Ou seja, os candidatos estavam “liberados” para permanecer do pleito, e podiam receber votos/ser votados. Essa foi exatamente a conclusão extraída da representação RP 0600201–81.2020.6.06.0028. 9 – Percebe–se que a confecção do panfleto não utilizou de boa técnica jurídica, mas não se pode afirmar, categoricamente, que ocorreu o uso de técnicas de marketing, visando exclusivamente enganar a população, através de abuso de poder, ensejando desequilibro no pleito, por ato de natureza grave. Há dúvida razoável e não prova robusta. São circunstâncias apenas indiciárias, de modo que o reconhecimento do ilícito demandaria a existência de outras provas aptas a corroborar a existência de uma fraude. Dada a natureza das esferas de proteção a que se submete a presente ação, não deve a questão ser debatida sob o enfoque frio (i) do direito do consumidor, (ii) do direito marcário e (iii) do direito concorrencial. Embora similares na essência, posto que a propaganda deve ser marcada pela boa–fé, transparência, lealdade, confiança, e com uso de informações claras e precisas, deve–se considerar que, no caso, não se tem atribuição de desinformação ou ofensas a terceiros e nem texto propriamente enganoso/fraudulento na prática (juridicamente não tem a redação correta, clara e adequada). 10 – Na hipótese, não há como identificar gravidade apta a comprometer a legitimidade das eleições a breve aparição de um único helicóptero em sobrevoo ao início e término de uma carreata, realizada há mais 20 (vinte) dias antes do pleito eleitoral. As demais condutas atribuídas aos demandados – uso de helicóptero no dia 14/11/2020, distribuição de santinhos com Fake News por meio aéreo e de compra indevida de combustível – foram fatos que sequer restaram comprovados de forma robusta nos autos e, por tal razão, não cabe, para fins de decisão condenatória, o uso de ilações, presunções e conjecturas. Exige–se, pois, provas inconcussas, inequívocas, inabaláveis. 11 – A prestação de contas de campanha, a AIJE e AIME são ações diversas, e o resultado atingido em uma não vincula necessariamente a decisão a ser tomada na outra, não bastando, assim, que as contas tenham sido reprovadas para que se chegue, automaticamente, à aplicação de severas sanções (Precedentes do TSE). 12 – Registre–se que as doações efetuadas pelo empresário investigado/impugnado à campanha dos candidatos, no valor total de R$ 255.000,00 (duzentos e cinquenta e cinco mil reais), foram todas contabilizadas na prestação de contas da campanha em evidência, conforme se vê em Demonstrativo de Receitas Financeiras, bem como realizadas através de transferências bancárias, em total atendimento ao disposto no art. 21, § 1º, da Resolução–TSE nº 23.607/2019. 13 – Não está comprovada a prática de abuso de poder econômico ou político decorrente da utilização de um helicóptero no dia 24/10/2020 e dos demais fatos noticiados na Inicial, os quais não restaram comprovados. Entende–se pela ausência de demonstração de que o uso de helicóptero nestes casos, tenha representado risco à normalidade e à legitimidade das eleições levadas a efeito no Município de Juazeiro do Norte – uma das cidades que mais cresce e está entre as 5 mais ricas do Estado, não sendo novidade para a população o uso de aeronave –, seja pela quantidade, forma, conteúdo e alcance da publicidade divulgada, seja da análise da repercussão no pleito, fatores esses que integram a potencialidade. Afinal, segundo os autores o valor de 1 (uma) hora de voo em aeronave similar, custaria a quantia de R$ 6.000,00 (seis mil reais). 14 – Recursos conhecidos e providos. Opostos embargos de declaração (ID 157769668), foram eles rejeitados em acórdão assim ementado (ID 157769688): ELEIÇÕES 2020. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ELEITORAL. PREFEITO. ABUSO DE PODER E CAPTAÇÃO E GASTO ILÍCITO DE RECURSO. AS OBSCURIDADES, CONTRADIÇÕES E OMISSÕES QUANTO AOS FUNDAMENTOS QUE LEVARAM AO PROVIMENTO DOS RECURSOS NÃO SE SUSTENTAM QUANDO COTEJADAS COM OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO EMBARGADO. EFEITO DEVOLUTIVO DA APELAÇÃO. PERSPECTIVA DA PROFUNDIDADE (DIMENSÃO VERTICAL). EXTENSÃO (DIMENSÃO HORIZONTAL). PRINCÍPIO TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APPELLATUM. ANÁLISE. MOTIVAÇÃO. ÂMBITO PROCESSUAL INADEQUADO PARA A DESCONSTITUIÇÃO DE ATO JUDICIAL REGULARMENTE PROFERIDO. MULTA. NÃO CABIMENTO. EMBARGOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. 1 – A interposição do Recurso Eleitoral se deu unicamente pelas partes rés da ação, de forma a se limitar esta Corte ao efeito devolutivo do recurso, determinado pelo recorrente, sendo ele quem delimita o que será “devolvido” ao conhecimento do Tribunal. Deste modo, o objeto da devolutividade é o mérito do recurso interposto pela parte ou, melhor, a extensão da cognição do Tribunal é delimitada exatamente pela extensão da impugnação. Todavia, é sabido também que, afora o efeito devolutivo, que viabiliza a apreciação pelo Tribunal ad quem de todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado da decisão objeto do recurso, por força do efeito devolutivo insculpido no art. 1.013, § 1º, do CPC, há também o efeito translativo, que autoriza o Tribunal a reconhecer de ofício matéria de ordem pública, mesmo que não alegada nas razões ou contrarrazões do apelo (REsp 873.732/BA , Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 16.4.2009). 2 – Em observância ao efeito translativo recurso, foi que esta Corte apreciou e julgou todas as questões suscitadas e discutidas no processo, concluindo pela inexistência de todos os ilícitos eleitorais apontados na Inicial, consignando que não ocorreu ato com risco à normalidade e à legitimidade das eleições. Destacou–se que para a caracterização de abuso de poder os fatos devem ter aptidão de ofender o bem jurídico tutelado, de modo que há de se considerar não só a gravidade da conduta, mas também sua repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral. Ausente a gravidade, compreendida quando se leva em consideração a restrição a direitos fundamentais como vedação ao excesso, descabe cogitar da procedência dos pedidos veiculados. Se a soberania popular é princípio basilar do sistema democrático, deve ser ela entendida como aquela que garante e protege a vontade do povo, manifestada pelo voto. 3 – Registrou–se também que não se estava afastando as implicações decorrentes da ausência de contabilização de recursos financeiros ou doações ilícitas durante ato de campanha eleitoral dos candidatos demandados, pois tal circunstância foi devidamente aferida naquela seara, que, em análise técnica, como deve ser por ocasião de prestação de contas, resultou na desaprovação das mesmas. Destacou–se que processos como AIJE, AIME e prestação de contas são totalmente distintos e autônomos, de forma que “(¿) não se pode vincular a procedência da ação de impugnação de mandato eletivo a juízo positivo ou negativo acerca da prestação de contas, em razão da total independência desses processos e da diversidade de objetos (...)” (TSE, RESPE 77012, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJ – 10/11/2015, pág. 42). Assim, a conclusão pela inocorrência do artigo 30–A da lei eleitoral foi objeto de apreciação e motivação por esta Corte, quando reconheceu a inexistência de ilegalidade qualificada, marcada pela má–fé do candidato, suficiente para macular a necessária lisura do pleito. Na hipótese, ainda que desaprovadas as contas do recorrente, o que, por si só, não é suficiente para configurar o ilícito acima, é forçoso reconhecer para o caso a ausência de relevância jurídica capaz de vulnerar os bens jurídicos tutelados pela norma e acarretar a cassação do diploma dos candidatos. Acresce–se que a conclusão, no caso, pela ausência de prova robusta dos fatos que implicariam abuso de poder, também tem repercussão na análise do artigo 30–A, por serem exatamente os mesmos. 4 – Em verdade, os embargos de declaração não constituem meio hábil para reforma do julgado, sendo cabíveis somente quando houver no acórdão vício de contradição, de obscuridade, de omissão ou mesmo erro material, de forma que o inconformismo da parte com o acórdão não caracteriza vício que legitime a oposição, tampouco autoriza a rediscussão de fundamentos já assentados no acórdão impugnado. Além do mais, não dão ensejo aos embargos o tão só acatamento de tese contrária à pretendida pelos embargantes. 5 – No caso, não se vislumbra a existência de quaisquer dos vícios descritos no artigo 275 do Código Eleitoral, restando patente, em verdade, o inequívoco propósito do embargante de promover uma rediscussão da matéria por vias transversas, em razão de estar inconformado com o resultado do julgado, que não confirmou a sentença de primeiro grau, sendo esta opção que favoreceria o recorrente. É que não se prestam os embargos a solucionar matérias que dizem respeito a um juízo reprobatório acerca do senso de justiça da decisão, devendo a contradição afirmada se respaldar nos fundamentos internamente aventados no acórdão. 6 – Não é aplicável a imposição de multa do art. 1.026, § 2º do CPC. Não foram demonstrados, na espécie, a má–fé processual e o intuito manifestamente protelatório por parte do ora embargante. De acordo com a jurisprudência do TSE, o caráter protelatório dos embargos de declaração é evidenciado quando o embargante se limita a reproduzir teses suscitadas anteriormente e já enfrentadas pelo órgão julgador, destacando que o simples fato de inexistir os vícios no acórdão não é suficiente para aplicação de multa, notadamente quando ausente demonstração de retardar a apreciação definitiva do processo. Desta forma, estes embargos de declaração, primeiros embargos, foram manejados como forma legítima de aperfeiçoar a decisão judicial a fim de superar eventuais vícios, ainda que sem sucesso, tanto que ensejou parecer ministerial favorável e trata–se de petição da parte autora, pelo menos, em tese, a maior interessada na celeridade processual. 7 – Embargos conhecidos e desprovidos. Os agravantes alegam, em suma, que: a) o recurso está consubstanciado em ofensa aos arts. 1.022 do Código de Processo Civil, 22 da Lei Complementar 64/90 e 30–A da Lei 9.504/97, além da existência de dissenso jurisprudencial, conforme invocado na decisão agravada; b) houve usurpação de competência pela Presidência da Corte Regional Eleitoral, quando realizou o exame de admissibilidade do recurso especial, visto que adentrou o mérito recursal; c) não pretende o reexame do conjunto fático–probatório, vedado pelo verbete sumular 24 deste Tribunal Superior, mas o reenquadramento jurídico do fato de que “não há abuso de poder consistente na prática de uso de aeronave de empresa privada, o que configura fonte vedada, portanto, para derrame de material publicitário em proveito de candidato a prefeito, no interior do Ceará” (ID 157769712, p. 14); d) o acórdão recorrido atinente ao julgamento dos embargos de declaração omitiu–se acerca da tese de abuso do poder econômico à luz do art. 30–A da Lei 9.504/97, o que destoa do entendimento de outros tribunais regionais, os quais, em casos análogos, reconhecem a configuração de abuso do poder econômico, visto que a utilização de aeronave doada por pessoa jurídica para atos de campanha viola a paridade de armas entre os candidatos, dado que um deles foi beneficiado por doação de fonte vedada; e) de acordo com recente julgado do TSE no RO–El 0605635–14, a utilização de recursos recebidos de pessoa jurídica, a fim de alavancar campanha política de candidato, com gastos não declarados em prestação de contas, configura abuso do poder econômico e justifica a declaração de inelegibilidade; f) há similitude fática entre o precedente do TSE e a hipótese dos autos. No caso do RO–El 0605635–14, referente ao Estado de Minas Gerais, com mais de 15 milhões de eleitores, houve captação ilícita de R$ 257.000,00 para a campanha de um senador, enquanto, na espécie, Juazeiro do Norte tem apenas 183.286 eleitores e gasto equivalente a R$ 48.000,00 para a campanha do prefeito eleito Gledson Lima Bezerra, “ou seja, em MG (candidato a Senador condenado) foram gastos ilicitamente R$ 0,016 por cada eleitor, e em Juazeiro do Norte foram gatos ilicitamente R$ 0,261 por cada eleitor, numa proporção 16 vezes maior do que em MG” (ID 157769712, p. 24); g) houve omissão quanto à apreciação do fato de ter havido despejo de santinhos a partir de uma aeronave na véspera da eleição e ao uso de helicóptero de forma ilegal, sem a devida prestação de contas, ou se se tratou de “manifestação espontânea e unilateral da parte de Gilmar Luiz Bender, sem anuência dos candidatos envolvidos” (ID 157769712, p. 25), em violação ao art. 275 do Código Eleitoral; h) evidencia–se contrariedade aos arts. 30–A da Lei das Eleições e 22 da Lei Complementar 64/90, “mediante o emprego desproporcional de recursos patrimoniais privados, de forma a comprometer a legitimidade do pleito e a paridade de armas entre candidatos” (ID 157769712, p. 25). Requerem o conhecimento e o provimento do agravo, para possibilitar o exame do recurso especial eleitoral por esta Corte Superior, porquanto estão preenchidos todos os requisitos de admissibilidade. Postulam, ainda, o provimento do recurso especial, a fim de reformar o acórdão recorrido e julgar procedente a AIME, mantendo a sentença de primeiro grau, declarando a nulidade dos registros de candidatura e a inelegibilidade por oito anos, com a consequente decretação de cassação dos diplomas dos ora agravados. Foram apresentadas contrarrazões (ID 157769717). A douta Procuradoria–Geral Eleitoral manifestou–se pelo desprovimento do agravo (ID 158369152). É o relatório. Decido. O agravo é tempestivo. A decisão agravada foi publicada no DJE de 1º.7.2022 (ID 158372343), e o apelo foi interposto em 4.7.2022 (ID 157769712) por advogado habilitado nos autos (IDs 157769505 157769506, 157769507, 157769508 e 157769540). De início, assinalo que não assiste razão aos agravantes quanto ao argumento de que teria havido usurpação de competência deste Tribunal Superior por ocasião do juízo de admissibilidade, pois a orientação desta Corte quanto ao tema é pacífica no sentido de que “o exame pelo presidente de Tribunal Regional Eleitoral de questões afetas ao mérito do recurso especial, por ocasião do juízo de admissibilidade, não implica invasão de competência do TSE” (AgR–AI 3920–27, rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJE de 15.6.2011). No mesmo sentido: “O juízo de admissibilidade exercido pelo Tribunal a quo não é vinculativo e, portanto, não usurpa a competência do órgão ad quem” (AgR–AI 45–05, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 10.8.2018). O Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará negou seguimento ao recurso especial eleitoral pela incidência dos óbices previstos nos verbetes sumulares 24 e 28 do TSE e por ausência de indicação do dispositivo legal ou constitucional violado. Conquanto os agravantes tenham se insurgido contra os fundamentos da decisão denegatória, o apelo não poderia ser provido, ante a inviabilidade do próprio recurso especial. No caso, o Tribunal de origem, por maioria, deu provimento a recurso para reformar a sentença e julgar improcedente a presente ação, por entender não comprovada a prática de abuso do poder econômico ou político decorrente do uso indevido de helicóptero em campanha eleitoral e derrame de santinhos. Eis os fundamentos do acórdão regional (ID 157769659): Tratam os autos de Recursos Eleitorais interpostos por GILMAR LUIZ BENDER e, por GLEDSON LIMA BEZERRA e GIOVANNI SAMPAIO GONDIM, Prefeito e Vice–Prefeito, respectivamente, eleitos em 2020 no Município de Juazeiro do Norte, contra a sentença de primeiro grau, que julgou procedentes os pedidos formulados na Ação de Investigação Judicial Eleitoral 0600238–11.2020.6.06.0028 e na Ação de Impugnação de Mandato Eletivo 0600001–40.2021.6.06.0028. Em sentença os candidatos Investigados/Impugnados foram condenados pela prática de abuso de poder econômico, em razão de uso indevido de helicóptero em campanha e derrame de santinhos, por meio de referida aeronave com propaganda falsa sobre o registro de candidatura, o que resultou na cassação do diploma e do mandato do prefeito e do vice–prefeito eleitos em 2020, respectivamente, Glêdson Lima Bezerra e Giovanni Sampaio Gondim, além de declaração de inelegibilidade dos mesmos e de Gilmar Luiz Bender, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar de referido pleito. Como é cediço, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral tem como objeto a apuração e a consequente punição por uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, com vistas a proteger a normalidade e a legitimidade das eleições. Eis o que estabelece o art. 19 e seu parágrafo único e o art. 22 da Lei Complementar n.º 64/1990. Por sua vez, a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo tem previsão constitucional e também apresenta abuso de poder econômico como hipótese de cabimento. É o que preconiza o art. 14, § 10 da Magna Carta. O conjunto probatório dos autos envolve prova documental extensa com inclusão de fotografias, vídeos, documentos oficiais de órgãos de aviação, demonstrativos de prestação de contas, além de prova testemunhal obtida em Juízo. Em síntese apontam: Utilização de helicóptero, objeto de doação ilegal e/ou caixa 2, para uso em evento de campanha e derrame de santinhos; e distribuição de gasolina não declarada como gasto de campanha. Desta forma, passo a tratar, a seguir, de cada ilicitude apontada. DA UTILIZAÇÃO DE HELICÓPTERO EM CAMPANHA: De acordo com as Iniciais, o Sr. Gilmar Luiz Bender foi ativo apoiador, incentivador e, sobretudo, principal financiador da campanha eleitoral de Glêdson Lima Bezerra e Giovanni Sampaio, com doação realizada da ordem de R$ 255.000,00 (duzentos e cinquenta e cinco mil reais) à referida candidatura, representando 32,37% dos recursos totais da campanha. Consta que Gilmar Bender é sócio–administrador da empresa Tecnolity do Nordeste Ltda., a quem pertence o helicóptero, matrícula PR–GCJ, que sobrevoou todo o percurso da carreata dos candidatos demandados, no dia 24/10/2020 no município de Juazeiro do Norte, ocasião em que realizou uma grande chuva de santinhos pela cidade. Aponta que em outro episódio, no dia 14/11/2020, às vésperas do pleito, referida aeronave também teria realizado derramamento de material de campanha, desta feita, panfletos com a devida identificação de CNPJ da gráfica responsável, com informação de que a candidatura de Glêdson Bezerra estava “liberada”. Salientou–se que o uso de referido helicóptero não foi declarado na prestação de contas dos candidatos promovidos, configurando doação ilegal de campanha, proveniente de fonte vedada, eis que de propriedade de pessoa jurídica, ou caixa 2. Afirmou–se, ainda, que os panfletos distribuídos no dia 14/11/2020 traziam fake news quanto à candidatura de Glêdson Bezerra estar “liberada”, uma vez que, nesse dia, seu registro estava indeferido e sua reversão ocorreu apenas em 25/11/2020, pelo pleno do TRE. Em vista dos mesmos fatos e provas terem sido abordados e acostados nas Exordiais da AIJE e AIME, respectivamente, passo a referir, por questões práticas, apenas aos IDs do RE 0600238–11.2020.6.06.0028, para fins de melhor condução da análise das condutas indicadas. Com o objetivo de comprovar o alegado, a Exordial veio instruída com vários documentos referentes a vídeo de Gilmar apoiando Glêdson (ID 15416777); vídeo de Glêdson reconhecendo apoio de Gilmar (ID 15416827); relatório de doações na PC de Glêdson (ID 15416877); extrato bancário com as doações de Gilmar (IDs 15416927 e 15416977); CNPJ da empresa Tecnolity (ID 15417027); composição societária da empresa Tecnolity (ID 15417077); contrato de locação de imóvel (ID 15417157); matrícula do helicóptero (ID 15417177); ato notarial (ID 15417227); orçamento helicóptero (ID 15417277); vídeos do helicóptero carreata (IDs 15417327 a 15417577); Representação Eleitoral Por Fake News (ID 15417627); vídeo carreata (ID 15417677) e relatório de despesas na prestação de contas (ID 15417727). Por sua vez, apenas a peça de contestação de Gilmar Luiz Bender apresenta–se acompanhada de documento, qual seja, plano de voo (ID 15418777). Mais à frente, por força de diligências solicitadas em audiência (IDs 15421377 a 15421527), foram acostados vários ofícios emitidos por órgãos oficiais de aviação: ofício da CIOPAER (ID 15421627 – pág. 4), documentos da ANAC (ID 15421677 – págs. 3–5), ofício da AENA Brasil (ID 15421727 – págs. 4–6) e documentos CINDACTA (ID 15421777 – págs. 6–24), além de documentos relativos a denúncias oriundas do Sistema Pardal (TSE) (IDs 15421927 a 15422477). E, finalmente, foram acostados, em sede de recurso, peças da prestação de contas da campanha de Glêdson Bezerra e Giovanni Sampaio (PC 0601149–41.2020.6.06.0119) incluindo parecer técnico conclusivo (ID 16014527), parecer do Ministério Público Eleitoral local (ID 16014577) e sentença (ID 16014627). Saliente–se que referidos documentos foram submetidos ao devido contraditório com manifestação de ambas as partes (IDs 16472227 e 16477527) e também da Procuradoria Regional Eleitoral (ID 17006977). Da análise da documentação acima indicada, verifica–se que um fato é incontroverso, qual seja, o sobrevoo da aeronave de matrícula PR–GCJ – de propriedade da empresa Tecnolity, cujo sócio administrador é o Investigado Sr. Gilmar Bender –, no início e final da carreata dos candidatos demandados, ocorrida no dia 24/10/2020, em Juazeiro do Norte. Além de vídeos, fotografias e postagens em redes sociais, o próprio piloto da aeronave, Sr. Cícero Yorio Pequeno Bulhões, declarou em Juízo que efetuou o sobrevoo no ato de campanha realizado no dia 24/10/2020, nos momentos referidos, ocasião em que soltou papéis picados metalizados. Tais informações são corroboradas, ainda, por documentos de órgãos oficiais de aviação, especificamente da AENA Brasil – AEROPORTOS DO NORDESTE DO BRASIL S/A, que precisou os horários de pouso e decolagem da aeronave PR–GCJ naquele dia no Aeroporto de Juazeiro do Norte/CE (ID 15421727 – pág. 5). Como visto, na Carta nº 2011ANB20210316, oriunda da AENA Brasil, o tempo de voo ali especificado coincidiu com o período de sobrevoo da aeronave no dia 24/10/2020, conforme declarado em depoimento pelo piloto Cícero Yorio, que resultou em 2 (dois) momentos, em torno de 20min cada, na concentração e no término da carreata dos candidatos promovidos. Por sua vez, a utilização de mencionado helicóptero em Juazeiro do Norte no dia 14/11/2020, não foi confirmada por nenhum documento oficial, seja pelo CIOPAER de Juazeiro (ID 15421627 – pág. 4), pela ANAC (ID 15421677 – pág. 4–5), pela AENA Brasil (ID 15421727 – pág. 5) e DECEA (ID 15421777). Novamente, as informações oficiais coincidem com os relatos do piloto da aeronave investigada, que resolutamente informou que, nesse dia, efetuou voo em Fortaleza, Eusébio, Miraíma e Iguatu. Vejamos: Depoimento de Cícero Yorio P
Data de publicação | 05/12/2022 |
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PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60000140 |
NUMERO DO PROCESSO | 6000014020216059904 |
DATA DA DECISÃO | 05/12/2022 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2020 |
SIGLA DA CLASSE | AREspEl |
CLASSE | Agravo em Recurso Especial Eleitoral |
UF | CE |
MUNICÍPIO | JUAZEIRO DO NORTE |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | representação |
PARTES | CICERA DAMIANA DOS SANTOS LEANDRO, GILMAR LUIZ BENDER, GIOVANNI SAMPAIO GONDIM, GLEDSON LIMA BEZERRA, JOAO PAULO TEIXEIRA RAMOS, JOSE AILTON DE ANDRADE VIANA, LETICIA LEANDRO DE SOUZA |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos |
Projeto |