TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549) Nº 0600264–59.2020.6.25.0002 (PJe) – BARRA DOS COQUEIROS – SERGIPERELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAESRECORRENTE: COLIGAÇÃO EXPERIENCIA E TRABALHO, A BARRA NO RUMO CERTO Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANO FREIRE FEITOSA – SE0003173RECORRIDO: MARCELO SILVA DOS SANTOSAdvogado do(a) RECORRIDO: MARCELO SILVA DOS SANTOS –... Leia conteúdo completo
TSE – 6002645920206249984 – Min. Alexandre de Moraes
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549) Nº 0600264–59.2020.6.25.0002 (PJe) – BARRA DOS COQUEIROS – SERGIPERELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAESRECORRENTE: COLIGAÇÃO EXPERIENCIA E TRABALHO, A BARRA NO RUMO CERTO Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANO FREIRE FEITOSA – SE0003173RECORRIDO: MARCELO SILVA DOS SANTOSAdvogado do(a) RECORRIDO: MARCELO SILVA DOS SANTOS – SE0012287 DECISÃO No Recurso Especial (ID 112290038) – amparado na violação dos arts. 243, IX; 325 e 326 do Código Eleitoral e 22, X; 27, § 1º; 91 e 92 da Res.–TSE 23.610/2019, bem como em dissídio jurisprudencial – a Recorrente sustenta, em síntese, que: a) não pretende o reexame fático–probatório dos autos, mas apenas o seu reenquadramento jurídico; b) as postagens impugnadas configuram propaganda eleitoral negativa, ante a difusão de ofensas à honra e à imagem do candidato da coligação; c) foi atribuída ao candidato a pecha de racista e corrupto, com suposto vínculo a esquemas de fraude, sem, todavia, haver nenhuma prova nesse sentido; e d) a conduta se subsume ao tipo de calúnia, difamação e injúria. O Ministério Público Eleitoral manifestou–se pela negativa de seguimento ao recurso (ID 149623638). É o breve relato. Decido. Trata–se, na origem, de Representação proposta pela Coligação “Experiência e Trabalho, a Barra no Rumo Certo” contra Marcelo Silva dos Santos, consubstanciada na prática de propaganda eleitoral negativa em razão do envio de mensagens a grupo de Whatsapp com o objetivo de violar a honra de seu adversário político, Alberto Macedo, associando–o a supostos esquemas de fraudes e apelidando–o de 'Alberto/Multiserv'. O Tribunal Regional Eleitoral manteve a improcedência da ação, diante da ocorrência de 'meras críticas de natureza política, sem desbordar dos limites do seu direito à liberdade de expressão”. Para a Corte Regional, “a veiculação de mensagens no whatsapp desnatura, em regra, seu caráter propagandista diante de seu acesso restrito, salvo se demonstrado potencial de viralização, o que não se verificou in casu” (ID 112289588). O direito fundamental à livre manifestação de pensamento, consagrado constitucionalmente, deve ser exercido dentro do binômio LIBERDADE com RESPONSABILIDADE. A Constituição protege a liberdade de expressão no seu duplo aspecto: o positivo, que é exatamente 'o cidadão pode se manifestar como bem entender', e o negativo, que proíbe a ilegítima intervenção do Estado, por meio de censura prévia. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre os governantes, que nem sempre serão “estadistas iluminados”, como lembrava o JUSTICE HOLMES ao afirmar, com seu conhecido pragmatismo, a necessidade do exercício da política de desconfiança (politics of distrust) na formação do pensamento individual e na autodeterminação democrática, para o livre exercício dos direitos de sufrágio e oposição; além da necessária fiscalização dos órgãos governamentais. No célebre caso Abrams v. United States, 250 U.S. 616, 630–1 (1919), OLIVER HOLMES defendeu a liberdade de expressão por meio do mercado livre das ideias (free marketplace of ideas), em que se torna imprescindível o embate livre entre diferentes opiniões, afastando–se a existência de verdades absolutas e permitindo–se a discussão aberta das diferentes ideias, que poderão ser aceitas, rejeitadas, desacreditadas ou ignoradas; porém, jamais censuradas, selecionadas ou restringidas pelo Poder Público que deveria, segundo afirmou em divergência acompanhada pelo JUSTICE BRANDEIS, no caso Whitney v. California, 274 U.S. 357, 375 (1927), “renunciar a arrogância do acesso privilegiado à verdade”. No âmbito da Democracia, a garantia constitucional da liberdade de expressão não se direciona somente à permissão de expressar as ideias e informações oficiais produzidas pelos órgãos estatais ou a suposta verdade das maiorias, mas sim garante as diferentes manifestações e defende todas as opiniões ou interpretações políticas conflitantes ou oposicionistas, que podem ser expressadas e devem ser respeitadas, não porque necessariamente são válidas, mas porque são extremamente relevantes para a garantia do pluralismo democrático (cf. HARRY KALVEN JR. The New York Times Case: A note on the central meaning of the first amendment in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 14, p. 435). Todas as opiniões existentes são possíveis em discussões livres, uma vez que faz parte do princípio democrático “debater assuntos públicos de forma irrestrita, robusta e aberta” (Cantwell v. Connecticut, 310 U.S. 296, 310 (1940), quoted 376 U.S at 271–72). O direito fundamental à liberdade de expressão, portanto, não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também àquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias (Kingsley Pictures Corp. v. Regents, 360 U.S 684, 688–89, 1959). A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático, como ressaltado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, na ADI 4451, de minha relatoria (DJE de 6/3/2019). Observe–se, porém que a liberdade de expressão, em seu aspecto positivo, permite posterior responsabilidade cível e criminal pelo conteúdo difundido, além da previsão do direito de resposta. Dessa maneira, a plena proteção constitucional da exteriorização da opinião (aspecto positivo) não significa a impossibilidade posterior de análise e responsabilização por eventuais informações injuriosas, difamantes, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas, mas não permite a censura prévia pelo Poder Público. Nesse cenário, a livre circulação de pensamentos, opiniões e críticas visam a fortalecer o Estado Democrático de Direito e à democratização do debate no ambiente eleitoral, de modo que a intervenção desta JUSTIÇA ESPECIALIZADA deve ser mínima em preponderância ao direito à liberdade de expressão. Ou seja, a sua atuação deve coibir práticas abusivas ou divulgação de notícias falsas, de modo a proteger a honra dos candidatos e garantir o livre exercício do voto. Nesse sentido: RESpe 0600025–25.2020, de minha relatoria. No caso dos autos, a insurgência do Recorrente repousa na hipótese de que 'o demandado estigmatiza o candidato utilizando–se do jogo de palavras “Alberto/Multiserv”, a fim de sugerir elo entre o postulante ao cargo eletivo e a pessoa jurídica', aparentemente responsável por ilícitos na região. Por outro lado, afirma que 'o reclamante ainda acusa o candidato a vice–prefeito de proferir injúrias raciais, em vídeo altamente tendencioso, onde o candidato apenas está elogiando o trabalho desenvolvido por uma cidadã', circunstância que prejudicaria sua imagem enquanto candidato. Estas as imagens objeto da impugnação: Assim, dos documentos presentes nos autos, sobre os quais o acórdão regional faz expressa referência, embora sem transcrever as mensagens, não se pode inferir elementos suficientes à comprovação do ilícito, na medida em que, mesmo em tom mais ácido, não se identificou nada além do que seria o direito de crítica. O investigado encaminha trecho de matéria jornalística que trata sobre suspeita de contratos irregulares, em coro com o discurso já feito pela chapa de oposição ao candidato da Recorrente. Acresço que o próprio Recorrente nas razões recursais aponta apenas genericamente a ocorrência do ilícito, amparada na alegada propagação de ofensas, sob a 'pecha de corrupto”, ou ainda, que no vídeo encaminhado ao grupo de Whatsapp, se atribui o crime de racismo ao vice da coligação. Na hipótese dos autos, sequer o inteiro teor da gravação impugnada foi apresentado, o que reforça a atipicidade da conduta ou, ao menos, impede aqui a aferição sobre a tipicidade. No caso dos autos, o acórdão recorrido é claro ao afastar a denominada 'viralização' do conteúdo impugnado, rejeitando ainda o potencial de repercussão da mensagem a um grande número de pessoas. Ao contrário, ficou assente o acesso restrito do grupo no aplicativo de mensagens, sequer havendo descrição de quantas pessoas integram este grupo, tampouco elementos outros que indiquem que houve qualquer repercussão que extrapolasse aquele ambiente restrito. Quanto ao mais, a Coligação não se desincumbiu do ônus de comprovar o dissídio jurisprudencial, sendo insuficiente, para tanto, a mera transcrição de ementas. Destaco que o quadro comparativo colacionado pela Recorrente apenas apresenta a conclusão dos julgados sem, contudo, demonstrar a imprescindível similitude fática entre eles. Incidência da Súmula 28 do TSE. Ante o exposto, NEGO SEGUIMENTO ao Recurso Especial, com base no art. 36, § 6º, do RITSE. Publique–se. Brasília, 11 de outubro de 2021. Ministro ALEXANDRE DE MORAES Relator
Data de publicação | 15/10/2021 |
---|---|
PALAVRA PESQUISADA | Notícias Falsas |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60026459 |
NUMERO DO PROCESSO | 6002645920206249984 |
DATA DA DECISÃO | 15/10/2021 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2020 |
SIGLA DA CLASSE | REspEl |
CLASSE | RECURSO ESPECIAL ELEITORAL |
UF | SE |
MUNICÍPIO | BARRA DOS COQUEIROS |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Recurso Especial Eleitoral |
PARTES | COLIGAÇÃO EXPERIENCIA E TRABALHO, A BARRA NO RUMO CERTO, MARCELO SILVA DOS SANTOS |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Alexandre de Moraes |
Projeto |