TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600448–67.2022.6.10.0000 – CLASSE 12626 – SÃO LUÍS – MARANHÃO Relator: Ministro Sérgio Banhos Agravante: Domingos de Jesus Costa Advogado: Weberth Raiol Monroe – OAB: 24458/MA Agravado: Partido Democrático Trabalhista (PDT) – Estadual Advogados: Claudio Eduardo Sousa e Silva – OAB: 24247/MA e outros DECISÃO... Leia conteúdo completo
TSE – 6004486720226100224 – Min. Sergio Silveira Banhos
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600448–67.2022.6.10.0000 – CLASSE 12626 – SÃO LUÍS – MARANHÃO Relator: Ministro Sérgio Banhos Agravante: Domingos de Jesus Costa Advogado: Weberth Raiol Monroe – OAB: 24458/MA Agravado: Partido Democrático Trabalhista (PDT) – Estadual Advogados: Claudio Eduardo Sousa e Silva – OAB: 24247/MA e outros DECISÃO Domingos de Jesus Costa interpôs agravo em recurso especial eleitoral (ID 158108341) em face de decisão da Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (ID 158108336) que negou seguimento a recurso especial manejado contra acórdão daquela Corte (ID 158108327) que, por maioria, reformou parcialmente a sentença e julgou procedente, em parte, o pedido formalizado em representação eleitoral proposta pelo Partido Democrático Trabalhista (PTB), Diretório Estadual no Maranhão, condenando o agravante e outros representados ao pagamento de multa no valor individual de R$ 5.000,00, com fulcro no § 4º do art. 2º da Res.–TSE 23.610, por realizarem propaganda eleitoral antecipada negativa. Eis a ementa do acórdão recorrido (ID 158108324): ELEIÇÕES 2022. RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. PROPAGANDA ANTECIPADA NEGATIVA. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL. REJEIÇÃO. 1. No caso concreto, a exordial destaca postagens que, segundo sustenta o representante, retratam fatos sabidamente inverídicos, gravemente descontextualizados e que maculam a honra e imagem de pré–candidato, o que configuraria propaganda eleitoral antecipada negativa, atraindo assim a competência da Justiça Eleitoral para o julgamento. 2. Questão preliminar rejeitada. Fixação da competência da Justiça Eleitoral. MÉRITO I. DIVULGAÇÕES NOS PORTAIS DE NOTÍCIAS DOS RECORRENTES DOMINGOS DE JESUS COSTA E RAIMUNDO GARRONE PORTELA RICHARD SOBRINHO. FATOS GRAVEMENTE DESCONTEXTUALIZADOS. CONFIGURAÇÃO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 3. Impõe–se como regra a preservação e livre exercício de liberdades fundamentais, dentre as quais a de expressão e de imprensa, consoante redação do art. 220 da Constituição Federal, segundo o qual a ¿manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.' 4. Nada obstante, ante a máxima de que inexiste direito fundamental absoluto, há possibilidade de controle, pontual, calibrado e cirúrgico, pelo Poder Judiciário, desde que verificado ato abusivo no exercício das liberdades fundamentais. 5. Pela leitura das matérias divulgadas nos portais “Diário 98” e “IMaranhão”, constata–se que houve nítida intenção de vincular a imagem do então pré–candidato Weverton Rocha à operação deflagrada pela Polícia Federal, em que se apreendeu uma quantia expressiva de numerário, supostamente de origem ilícita. 6. Ante a descontextualização das informações, criou–se a impressão de que o então pré–candidato Weverton Rocha teria ligação com operação policial devido à apreensão do numerário ter ocorrido em um Condomínio em Barreirinhas, no qual ele possuiria um imóvel. 7. Neste contexto, a divulgação de fato gravemente descontextualizado é providência vedada pela legislação eleitoral (Art. 9º–A, Resol.–TSE nº 23.610/2019), o que, atrelada ao conteúdo eleitoral e ao momento em que propalada a indigitada matéria, conduz–se à conclusão da divulgação de propaganda eleitoral antecipada, de cunho negativo. 8. Desprovimento dos recursos interpostos por DOMINGOS DE JESUS COSTA e por RAIMUNDO GARRONE PORTELA RICHARD SOBRINHO. MÉRITO II. DIVULGAÇÃO NA REDE SOCIAL DOS RECORRENTES MATIAS MARINHO SIRQUEIRA E PEDRO IGOR RIBEIRO MORAES DE ALMEIDA. MATÉRIA DE CUNHO EMINENTEMENTE JORNALÍSTICO. AUSÊNCIA DE DESCONTEXTUALIZAÇÃO OU DO PRONUNCIAMENTO DE FATO SABIDAMENTE INVERÍDICO. LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DE IMPRENSA E DE INFORMAÇÃO. PROVIMENTO DO RECURSO. 9. Observado o conteúdo divulgado no Instagram “Xeque Mate Radio”, não há como sê–lo enquadrado no arquétipo das Fake News ou das notícias gravemente desvirtuadas, consoante vedação do art. 9º–A da Resolução TSE nº 23.610/2019. 10. Ademais, não há que se falar em fato sabidamente inverídico, já que o episódio noticiado efetivamente ocorrera, sendo a circunstância pessoal, da existência, ou não, de aliança política entre o sujeito apreendido na operação policial e o pré–candidato do Recorrido, questão não suscetível de tal enquadramento. 11. Na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), somente é possível falar–se na divulgação de fatos sabidamente inverídicos quando tal compreensão é perceptível de plano, saltando–se aos olhos, sem a necessidade qualquer tipo de investigação (TSE – Representação nº 060089488, Min. Sergio Silveira Banhos, Publicado em Sessão: 30/08/2018). 12. Objetivamente, não há como ser apontado qualquer desvirtuamento na matéria aqui destacada, já que apresentada em caráter informativo, sendo a eventual relação de amizade ou aliança política de pessoa presa na operação com parlamentar do Estado, fator de evidente interesse jornalístico e social. 13. Provimento dos recursos interpostos por MATIAS MARINHO SIRQUEIRA e por PEDRO IGOR RIBEIRO MORAES DE ALMEIDA. O agravante alega, em suma, que: a) o recurso se fundamenta na hipótese da letra b do inciso I do art. 276 do Código Eleitoral por constar clara divergência na interpretação dada pelos Tribunais Regionais de Pernambuco e do Tocantins, bem como pelo TSE, em relação a matérias de mesma natureza e fundamentos jurídicos; b) foi realizado aprofundado cotejo analítico do inteiro teor dos julgados comparados, juntados ao recurso especial em atendimento ao disposto no § 1º do art. 1.029 da Lei 13.105/2015, motivo pelo qual a decisão denegatória de seguimento do apelo especial se mostra equivocada por não identificar a similaridade existente entre os julgados apontados, além de não demonstrar a ausência de analogia apontada; c) o recurso especial não almeja o reexame fático–probatório, mas o reenquadramento jurídico dos fatos no sentido do entendimento do Tribunal Superior Eleitoral sobre a matéria; d) embora a representação tenha aduzido que as publicações impugnadas não se comprometeram com a realidade dos fatos, não foram juntadas provas de falsidade, calúnia ou difamação relacionadas às notícias; e) as publicações que ensejaram a representação não caracterizam ilícito eleitoral nem extrapolaram a livre manifestação do pensamento, de modo que o direito de liberdade de expressão deve ser preservado; f) as notícias impugnadas apenas divulgaram ao leitor informações sobre as investigações da Polícia Federal, retratando fatos verídicos em total compromisso com o dever jornalístico, não sendo veiculada informação falsa, atentatória à honra e imagem, nem desfavorecimento ou crítica à candidatura do parlamentar, de modo que a propaganda antecipada negativa não ficou caracterizada; g) a aplicação de qualquer multa por propaganda antecipada na espécie “propaganda negativa” é indevida por falta de previsão legal. Requer o destrancamento do recurso especial com o fim de possibilitar seu conhecimento e provimento. O agravado apresentou contrarrazões tanto ao agravo (ID 158108346) quanto ao recurso especial (ID 158108335) e requereu o não provimento dos respectivos apelos. A douta Procuradoria–Geral Eleitoral opinou pelo desprovimento do agravo (ID 158708882). É o relatório. Decido. O agravo é tempestivo. A decisão agravada foi publicada em mural em 16.9.2022 (ID 158108338), e o agravo foi interposto em 17.9.2022 (ID 158108341) em petição assinada eletronicamente por advogado habilitado nos autos (ID 158108289). O recurso especial também é tempestivo. O acórdão regional foi publicado em sessão no dia 26.8.2022, conforme registro de movimentação processual no PJE, e o apelo especial foi interposto no dia 27.8.2022 (ID 158108330) por advogado habilitado nos autos (ID 158108289). A Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão negou seguimento ao recurso especial eleitoral com base nos seguintes fundamentos: a) em relação à contrariedade expressa a dispositivo da Constituição ou da lei, o recorrente nada manifestou, baseando suas razões na liberdade de expressão contida no texto constitucional, e não apontou a afronta aos comandos legais, limitando–se a transcrever o teor; b) o recorrente não teve êxito também no quesito da demonstração de divergência jurisprudencial, tendo em vista que realizou cotejo analítico deficiente, apresentou excertos jurisprudenciais relacionados a circunstâncias distintas às do caso concreto, bem como se restringiu à transcrição de julgados, e não ao teor dos fatos que ensejaram as decisões; c) no tocante à alegação de que as publicações do agravante buscavam informar o eleitor sobre fatos de cunho investigativo da autoridade policial, a intensão argumentativa implica revisitar o contexto fático–probatório, procedimento vedado em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 24 do TSE. De início, observo que o agravante deixou de infirmar de forma exauriente, específica e objetiva os fundamentos da decisão agravada, limitando–se a reiterar, com discreto ajuste textual, a argumentação apresentada no recurso especial, mantendo incólumes, portanto, os fundamentos da decisão agravada no tocante à: a) inadequada tentativa de demonstração de divergência jurisprudencial por realizar cotejo analítico deficiente, mediante a apresentação de excertos jurisprudenciais relacionados a circunstâncias distintas às do caso concreto, além de se restringir à transcrição de julgados, e não ao teor dos fatos que ensejaram as decisões; b) pretensão de reexame dos elementos fático–probatórios para alcançar a compreensão de que a publicação almejava situar o leitor sobre fatos de cunho investigativo da autoridade policial, conclusão diversa da que foi alcançada pela Corte Regional. Sobre esse aspecto, a Procuradoria–Geral Eleitoral manifestou–se no sentido de que: “O agravo limita–se a reiterar as razões do recurso especial, sem refutar os fundamentos que conduziram à negativa de seguimento do recurso na origem. A circunstância atrai o óbice Súmula n. 26/TSE” (ID 158708882, p. 2). Assim, a ausência de impugnação específica aos fundamentos da decisão agravada atrai a incidência do verbete sumular 26 do TSE e inviabiliza o conhecimento do agravo, em consonância com o entendimento consolidado desta Corte de que “a ausência de impugnação específica aos fundamentos da decisão agravada implica deficiência de fundamentação, o que atrai o óbice previsto na Súmula nº 26/TSE” (AgR–REspEl 0601126–45, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 17.9.2020). No mesmo sentido, o entendimento do TSE se reafirma em relação à repetição dos fundamentos do recurso especial: “A parte agravante não impugnou especificamente os fundamentos da decisão agravada, limitando–se a reproduzir os fundamentos apresentados no recurso especial, o que inviabiliza o seu processamento. É inadmissível o recurso que deixa de impugnar especificamente fundamento da decisão recorrida que é, por si só, suficiente para sua manutenção (Súmula nº 26/TSE)” (AgR–REspe 114–75, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 13.3.2020). De toda sorte, ainda que superado esse óbice, o agravo não poderia ser provido, ante a inviabilidade do próprio recurso especial. Na espécie, o Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão deu provimento a dois dentre quatro recursos eleitorais, reformando parcialmente a sentença que condenava todos os representados ao pagamento de multa e manteve procedente, em parte, o pedido formalizado em representação eleitoral proposta pelo Partido Democrático Trabalhista (PTB), Diretório Estadual no Maranhão, condenando o agravante e outros representados ao pagamento de multa no valor individual de R$ 5.000,00, com fulcro no § 4º do art. 2º da Res.–TSE 23.610, por realizarem propaganda eleitoral antecipada negativa. Destaco o excerto do acórdão recorrido (ID 158108327): VOTO–DIVERGENTE Eminentes Membros, respeitado Procurador Regional Eleitoral, após ouvir atentamente o voto do Exmo. Senhor Relator, Dr. LUIS FERNANDO XAVIER GUILHON FILHO, entendi por bem divergir quanto à sua compreensão referente aos recursos eleitorais aviados nos autos por MATIAS MARINHO SIRQUEIRA e por PEDRO IGOR RIBEIRO MORAES DE ALMEIDA, responsáveis pela rede social ¿Xeque Mate Radio', no Instagram. Consoante o relatório muito bem lançado pelo Relator, teriam eles promovido propaganda eleitoral antecipada, de cunho negativo, à figura do então pré–candidato Weverton Rocha, filiado ao Recorrido – PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) –, ante a publicação de matéria jornalística com o seguinte título e conteúdo: ¿Policia Federal chega à república de Barreirinhas e prende aliado de Weverton Rocha. Corrupção | A Polícia Federal, durante a Operação Odacro, teria possivelmente prendido o empresário Eduardo DP, que figura como principal alvo da ação da PF e é aliado do senador Weverton Rocha (PDT). A operação foi deflagrada na manhã de hoje (20), nos municípios de São Luís, Dom Pedro, Codó, Santo Antônio dos Lopes e Barreirinhas. Com ela, os agentes desarticularam uma organização criminosa responsável por fraudes licitatórias, desvio e lavagem de dinheiro.' (Grifei) Observando atentamente o conteúdo em destaque, não há como sê–lo enquadrado no arquétipo das Fake News ou das notícias gravemente desvirtuadas, contexto no qual colaciono o art. 9º–A da Resolução TSE nº 23.610/2019: Art. 9º–A. É vedada a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos, devendo o juízo eleitoral, a requerimento do Ministério Público, determinar a cessação do ilícito, sem prejuízo da apuração de responsabilidade penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021) (Grifei) Ora, a única informação que relaciona a operação policial ao filiado do Recorrido é a afirmação de que aliado seu teria sido preso, sendo este – identificado como Eduardo DP – o principal alvo da ação. Efetivamente, não há que se falar em fato sabidamente inverídico, já que o episódio efetivamente ocorrera, sendo a circunstância pessoal, da existência, ou não, de aliança política questão não suscetível de tal enquadramento. [...] Como se percebe na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), somente é possível falar–se na divulgação de fatos sabidamente inverídicos quando tal compreensão é perceptível de plano, saltando–se aos olhos, sem a necessidade qualquer tipo de investigação. Não é, portanto, a situação das informações veiculadas pelos Recorrentes MATIAS MARINHO SIRQUEIRA e PEDRO IGOR RIBEIRO MORAES DE ALMEIDA, no Instagram ¿Xeque Mate Radio', em 20/07/2022, conforme afirmado pelo Recorrido. Outrossim, objetivamente, não há como ser apontado qualquer desvirtuamento na matéria aqui destacada, vez que apresentada em caráter informativo, sendo a eventual relação de amizade ou aliança política de pessoa presa na operação com parlamentar do Estado, fator de evidente interesse jornalístico e social. À pessoa do pré–candidato Weverton Rocha – filiado do Recorrido – inexiste imputação de crime ou acusação dessa natureza, de modo que uma eventual restrição do conteúdo propalado ocasionaria em impacto jurisdicional indesejável à liberdade de informação e de expressão dos meios de comunicação. Por oportuno, deve–se destacar que o debate e o livre mercado de ideias (MILL, 2017) são fundamentais durante as eleições para que os votantes possam conhecer o perfil de quem concorre, suas propostas e formar seu juízo de convencimento. Outrossim, noutro patamar de fatos, ¿parece claro que a propagação deliberada de informações falsas empobrece o debate público e torna mais difícil para os cidadãos exercitarem o direito de receber informações de várias fontes, e no final é um obstáculo para participar nas decisões democráticas' (ORGANIZATION OF AMERICAN STATES, 2019, p. 17). É certo que as fake news podem ¿afetar a higidez do sistema eleitoral', no entanto a ¿criminalização de condutas limitadoras da veiculação e do acesso a informações podem trazer reflexos sobre a liberdade de expressão e de informação, ínsitas ao exercício das prerrogativas eleitorais no ambiente democrático, causando, em lugar de avanços, potenciais retrocessos' (VELLOSO, CARLOS. In Eleições e Democracia na Era Digital, 2022, p. 21). Com efeito, as postagens apontadas, nesta quadra fática, não podem ser compreendidas como desinformação ou fake news, considerando que os fatos, conforme já dito, efetivamente ocorreram. Nesta conjuntura, reputo fundamental a lição da Professora Aline Osório: ¿[...] o processo de ponderação deve considerar não apenas o maior grau de proteção e o peso superlativo atribuído à liberdade de expressão política, mas também o princípio democrático, que exige o debate mais amplo possível sobre assuntos relacionados à coisa pública e a pessoas responsáveis por sua gestão, de modo a garantir o controle pelo cidadão. Portanto, nas hipóteses de alegação de violações a direitos da personalidade – por exemplo, pela divulgação de informação questionando a idoneidade de um candidato às eleições –, a proteção da honra, da imagem e da vida privada deve ser sopesada não só com a liberdade de expressão, mas também com a democracia.' Ante o exposto, em consonância com o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (PRE), apresentado em banca, pedindo todas as vênias às posições em sentido contrário, DOU PROVIMENTO aos recursos eleitorais formulados por MATIAS MARINHO SIRQUEIRA e por PEDRO IGOR RIBEIRO MORAES DE ALMEIDA, responsáveis pelo Instagram ¿Xeque Mate Radio'. VOTO DO RELATOR Conforme relatado, as matérias divulgadas pelos Representados, ora Recorrentes, atribuem ao então pré–candidato Weverton Rocha a participação em operação da Polícia Federal, a qual investiga desvio de verbas públicas. Relativamente às premissas teóricas que motivaram a decisão de procedência do pedido, transcrevo, por entender pertinente, trecho da decisão impugnada, verbis: Inicialmente, cumpre apontar que o artigo 36–A, inciso V, da Lei 9.504/97, com redação conferida pela Lei 13.165/15, prevê expressamente que a divulgação de posicionamentos pessoais sobre questões políticas não configura propaganda eleitoral antecipada, podendo ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet. Com efeito, impõe–se como regra a preservação e livre exercício de liberdades fundamentais, dentre as quais a de expressão e de imprensa, consoante redação do art. 220 da Constituição Federal, segundo o qual a ¿manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.' Não obstante, ante a máxima de que inexiste direito fundamental absoluto, há possibilidade de controle, pontual, calibrado e cirúrgico, pelo Poder Judiciário, desde que verificado ato abusivo no exercício das liberdades fundamentais. Inexiste, portanto, qualquer espécie de blindagem ou imunidade constitucional a sanções quando houver extrapolação dos limites ao exercício do direito de informar e de se expressar, sendo, neste sentido, consolidado o entendimento do Supremo Tribunal Federal, conforme se verifica do julgado a seguir: [...] Ademais, conforme já assentado pelo STJ quando do julgamento Recurso Especial n° 1374177 2011.01.10851–2, de relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, ¿apesar do direito à informação e à liberdade de expressão serem resguardados constitucionalmente – mormente em épocas eleitorais, em que as críticas e os debates relativos a programas políticos e problemas sociais são de suma importância, até para a formação da convicção do eleitorado –, tais direitos não são absolutos. Ao contrário, encontram rédeas necessárias para a consolidação do Estado Democrático de Direito: trata–se dos direitos à honra e à imagem, ambos condensados na máxima constitucional da dignidade da pessoa humana'. A lisura do pleito deve ser resguardada, sob pena de esvaziamento da tutela da propaganda eleitoral (TSE, Representação 0601530–54/DF Rel. Min, LUÍS FELIPE SALOMÃO, DJe DE 18.3.2021). Como bem assentou o Min. Alexandre de Morais, ¿a liberdade de expressão não permite a propagação de discursos de ódio', inclusive pelos pré–candidatos, candidatos e seus apoiadores antes e durante o período de propaganda eleitoral, uma vez que a liberdade do eleitor depende da tranquilidade e da confiança nas instituições democráticas e no processo eleitoral. Dentre os excessos que a legislação eleitoral visa punir, chamamos especial atenção para: o uso de recursos públicos ou privados, a fim de financiar campanhas elogiosas ou que tenham como objetivo denegrir a imagem de candidatos; a divulgação de notícias sabidamente inverídicas; a veiculação de mensagens difamatórias, caluniosas ou injuriosas ou o comprovado vínculo entre o meio de comunicação e o candidato. A regulamentação desse direito/dever no âmbito da propaganda eleitoral na internet encontra expressão no artigo 38, caput, da Resolução TSE nº. 23.610/19, que determina que ¿a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático'; assim como no artigo 9º–A da mesma norma, que veda ¿(...) a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral'. Isto compendiado, e analisando detidamente os elementos probatórios coligidos aos autos, entendo que houve, a toda evidência, propaganda negativa extemporânea vez que os Representados, ora Recorrentes, antes do período permitido, extrapolaram os limites da liberdade de expressão e de imprensa. Para melhor compreensão da matéria fática, assento que todos os Recorrentes reproduziram imagens de uma mala aberta contendo diversas cédulas de dinheiro, associando o nome do candidato Weverton Rocha aos seguintes títulos das notícias: a) ¿A montanha de dinheiro impressiona: 1 milhão de reais. O total foi apreendido pela PF esta manhã em São Luís. O dinheiro viria do Orçamento Secreto, defendido por Weverton e Rocha Rocha'; b) ¿ESCÂNDALO: PF apreende mais de R$ 1 milhão na casa de suspeito ligado a aliados de Weverton Rocha e Roberto Rocha na CODEVASF'; c) ¿PF apreendeu R$ 1,3 milhão em dinheiro vivo em condomínio do senador Weverton Rocha em Barreirinhas.' Pela leitura das matérias divulgadas, constata–se que houve nítida intenção de vincular a imagem do então pré–candidato Weverton Rocha à operação deflagrada pela Polícia Federal, em que se apreendeu uma quantia expressiva de numerário, supostamente de origem ilícita. O Recorrente responsável pela página Diário98, por exemplo, divulga uma foto da mala de dinheiro, afirmando que ¿A montanha de dinheiro impressiona: 1 milhão de reais. O total foi apreendido pela PF esta manhã em São Luís. O dinheiro viria do Orçamento Secreto, defendido por Weverton e Rocha Rocha.' (Id 17907218) Ademais, cria–se a falsa impressão de que o então pré–candidato Weverton Rocha teria ligação com operação policial devido à apreensão do numerário ter ocorrido em um Condomínio em Barreirinhas, no qual ele possuiria uma casa. Com efeito, em nenhum momento das matérias em análise houve a divulgação da pessoa que realmente teria sofrido a busca e apreensão, o que demonstra, evidentemente, o propósito dos ora Recorrentes de desinformar a sociedade sobre o verdadeiro investigado, ao tempo em que associam o candidato Weverton Rocha aos fatos em razão, exclusivamente, deste possuir uma propriedade dentro do condomínio no qual se deu a investigação. Por entendo oportuno, transcrevo excerto do judicioso parecer exarado pelo Procurador Regional Eleitoral Auxiliar, eminente Dr. José Leite Filho, litteris: ¿Na espécie, sob qualquer leitura que se faça, as postagens indiciam uma intencional descontextualização, não ocultando a intenção de interferir no pleito. Quem se inteira da matéria, de modo completo, compreende que o pré–candidato pelo partido representante não é alvo da medida judicial noticiada, nem figura na ação, sob qualquer ângulo. Inobstante, referido pré–candidato foi o principal e único foco das chamadas das postagens, seja ressaltando aspectos completamente desconectados com a ação judicial (a propriedade de casa no mesmo condomínio do alvo, situação de fato também compartilhada por outros pré–candidatos), seja sugerindo direta implicação com o dinheiro encontrado (¿PF apreendeu R$ 1,3 milhão em dinheiro vivo em condomínio do senador Weverton Rocha em Barreirinhas').' (Grifo no original) (Id 17914295) De mais a mais, reproduzo trecho da fundamentação externada na sentença recorrida: ¿As matérias também incorrem em grave violação, na medida em que imputam, ainda que indiretamente, alegações ofensivas à honra do então pré–candidato ao cargo de Governador do Estado. E ainda mais grave, em uma das postagens o Representado, também moderador do blog, permitiu a manutenção de comentários ofensivos à honra do pré–candidato como: ¿esse senador safado, bandido, ladrão', ¿ladrão do dinheiro público', 'pilantra'. Neste contexto, a divulgação de fato sabidamente inverídico, com aparente finalidade de vincular a figura do pré–candidato a atividades de organização criminosa, como no caso, parece suficiente a configurar propaganda eleitoral negativa, na linha da jurisprudência desta CORTE, segundo a qual a configuração do ilícito pressupõe ¿ato que, desqualificando pré–candidato, venha a macular sua honra ou a imagem ou divulgue fato sabidamente inverídico' (AgR–REspe 0600016–43, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO). In casu, não resta dúvida de que as postagens sequenciadas tem o nítido propósito de incutir no eleitorado a pecha de criminoso e corrupto a um dos pré–candidatos, através da construção de uma narrativa falsa para fazer crer que as verbas desviadas se destinaram à suposta ¿mansão', móveis e veículos. E foram produzidas outras várias postagens no mesmo sentido, para reforço da falsa narrativa. A insensata disseminação de conteúdo gravemente descontextualizado e com tamanha magnitude pode vir a comprometer a lisura do processo eleitoral, ferindo valores, princípios e garantias constitucionalmente asseguradas, notadamente a liberdade do voto e o exercício da cidadania. Desse modo, entendo que as publicações veiculadas na página dos Representados, ora Recorrentes, ultrapassaram os lindes da liberdade de expressão e imprensa, ofendendo os direitos da personalidade do pré–candidato da representante e se amoldando à hipótese de propaganda eleitoral antecipada negativa em razão da grave descontextualização dos fatos.' Diante do exposto, de acordo com o parecer ministerial apresentado em banca, VOTO PELO DESPROVIMENTO do recurso, para manter a condenação dos representados ao pagamento, individual, da multa disposta no art. 2°, §4º, da Resolução TSE nº 23.610/2019, arbitrada no patamar mínimo de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando não haver informação de reiteração de conduta vedada pelos Representados. Pela leitura do excerto acima, depreende–se que a representação alveja postagens construídas de modo diferente sobre um mesmo fato. Vê–se também que o Tribunal maranhense não identificou desvirtuamento da matéria original nas publicações online de Matias Marinho Siqueira e de Pedro Igor Ribeiro Moraes de Almeida, fator determinante para o provimento dos recursos eleitorais destes representados. Por ter obtido sorte contrária, o recorrente interpôs o apelo nobre com fundamento nos incisos I e II do § 4º do art. 121 da Constituição Federal sem vir a desenvolver, entretanto, nenhum raciocínio relacionado à violação de disposição expressa da Constituição ou da lei, circunstância que atrai a incidência do verbete sumular 27 do TSE. Em razão disso, a análise do recurso se restringirá à hipótese de suposta divergência jurisprudencial, prevista no inciso II do § 4º do art. 121 da Constituição. Nesse contexto, ao expor as razões recursais e na tentativa de compor o cotejo analítico, alegando haver coincidência no objeto, o recorrente argumenta que os Tribunais dos casos paradigmas fizeram prevalecer a liberdade de expressão quando discutiram a existência de propaganda antecipada negativa em notícias com fatos referentes a pré–candidato. Todavia, observo que o recorrente não cumpriu as exigências de extrair objetivamente as características fáticas e jurídicas dos casos confrontados, bem como de fazer um paralelo entre esses pontos e as teses discutidas para demonstrar que as situações comparadas são parecidas e obtiveram destinos diferentes, motivo pelo qual há óbice ao apelo especial por incidência da Súmula 28 do TSE. Sobre o assunto, esta Corte Superior assentou o entendimento de que, “para fins de demonstração da divergência jurisprudencial, não basta a indicação de julgados contendo teses jurídicas diversas daquelas aplicadas nos autos; é necessária a demonstração, de maneira analítica, da semelhança entre as situações concretas decididas” (AgR–AREspE 0600235–80, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 3.2.2022). Igualmente: “A mera transcrição de ementas de julgados, sem a realização de cotejo analítico, de modo a evidenciar–se a similitude fática entre as hipóteses confrontadas, não é suficiente para inaugurar a via recursal com fundamento no art. 276, I, b, do Código Eleitoral, a teor da Súmula nº 28/TSE” (AgR–REspEl 0600027–47, rel. Min. Carlos Horbach, DJE de 6.12.2021). No que se refere à matéria de fundo, o recorrente articula o raciocínio de que, “levando em consideração o conteúdo meramente informativo das postagens, não há que se falar em propaganda antecipada negativa, já não presentes elementos capazes de configurá–la” (ID 158108330, p. 11). No ponto, a pretensão recursal se insurge pela conclusão do Tribunal maranhense que deduziu existir propaganda eleitoral negativa na divulgação de fatos gravemente descontextualizados com o propósito de vincular o candidato da representante à operação policial em que se apreendeu quantia expressiva de numerário, supostamente de origem ilícita. Sobre o assunto, não é possível de plano obter conclusões diversas daquelas obtidas pela Corte Regional, de que não houve grave descontextualização na postagem, não houve intenção de vincular a imagem do pré–candidato e de que não foi divulgada propaganda eleitoral negativa. Assim, revisar a compreensão obtida pelo Tribunal maranhense demandaria o reexame dos elementos fático–probatórios, exercício que enfrenta óbice pela incidência da Súmula 24 do TSE. Ademais, o entendimento desta Corte Superior é o de que “a desqualificação de pré–candidato ou de agremiação partidária, que macule sua honra ou imagem ou divulgue fatos sabidamente inverídicos, configura propaganda eleitoral antecipada negativa” (Rec–Rp 0600557–60, red. para o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, PSESS em 1º.9.2022). Diante disso, a conclusão da Corte Regional está de acordo com o entendimento deste Tribunal Superior a respeito da matéria, incidindo, na espécie, o teor do verbete sumular 30 do TSE, “aplicável igualmente aos recursos manejados por afronta a lei” (AgR–REspe 448–31, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 10.8.2018). Por essas razões, nos termos do art. 36, § 6º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, nego seguimento ao agravo em recurso especial eleitoral interposto por Domingos de Jesus Costa. Publique–se. Intime–se. Ministro Sérgio Silveira Banhos Relator
Data de publicação | 21/03/2023 |
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PALAVRA PESQUISADA | Fake News |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60044867 |
NUMERO DO PROCESSO | 6004486720226100224 |
DATA DA DECISÃO | 21/03/2023 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2022 |
SIGLA DA CLASSE | AREspEl |
CLASSE | Agravo em Recurso Especial Eleitoral |
UF | MA |
MUNICÍPIO | SÃO LUÍS |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Propaganda eleitoral irregular |
PARTES | DOMINGOS DE JESUS COSTA, PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) - ESTADUAL |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos |
Projeto |