TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601854–44.2018.6.00.0000 (PJe) – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relator: Ministro Edson Fachin Representante: Coligação Brasil Acima De Tudo, Deus Acima De Todos Advogados: Karina de Paula Kufa – SP245404, Gustavo Bebianno Rocha –RJ081620 e outros Representante: Jair Messias Bolsonaro Advogada: Karina de Paula Kufa – SP245404... Leia conteúdo completo
TSE – 6018544420186000384 – Min. Edson Fachin
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0601854–44.2018.6.00.0000 (PJe) – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL Relator: Ministro Edson Fachin Representante: Coligação Brasil Acima De Tudo, Deus Acima De Todos Advogados: Karina de Paula Kufa – SP245404, Gustavo Bebianno Rocha –RJ081620 e outros Representante: Jair Messias Bolsonaro Advogada: Karina de Paula Kufa – SP245404 Representante: Antônio Hamilton Martins Mourão Advogados: Karina de Paula Kufa – SP245404, Gustavo Bebianno Rocha –RJ081620 e outros Representado: Fernando Haddad Advogados: Eugênio José Guilherme de Aragão – DF004935, Angelo Longo Ferraro – SP2612680S, Miguel Filipi Pimentel Novaes – DF5746900A e outros Representado: Coligação O Povo Feliz De Novo Advogados: Eugênio José Guilherme de Aragão – DF004935, Angelo Longo Ferraro – SP2612680S, Miguel Filipi Pimentel Novaes – DF5746900A e outros Representado: Google Brasil Internet LTDA. Advogados: Fabiana Regina Siviero Sanovick – SP147715, André Zanatta Fernandes de Castro – SP2465560A, Andrea Carla Ribeiro da Cruz – DF47289 e outros Representado: Facebook Serviços Online do Brasil LTDA. Advogados: Mila de Avila Vio – SP1950950A, Ricardo Tadeu Dalmaso Marques – SP3056300A, Isabela Braga Pompilio – DF14234 e outros Representado: Twitter Brasil Rede de Informação LTDA. Advogados: Andre Zonaro Giacchetta – SP1477020A, José Mauro Decoussau Machado – SP1731940A, Márcio de Oliveira Junqueira Leite – SP1878480A e outros DECISÃO ELEIÇÕES 2018. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. PRESIDENTE DA REPÚBLICA. VICE–PRESIDENTE. CONTEÚDO NEGATIVO OFENSIVO. FATO INVERÍDICO. REMOÇÃO DE CONTEÚDO. DIREITO DE RESPOSTA. PERDA DO OBJETO. TÉRMINO DO PERÍODO ELEITORAL. MULTA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ANALOGIA. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO EM RELAÇÃO AOS PROVEDORES DE CONTEÚDO (GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA. E TWITTER BRASIL REDE DE INFORMAÇÃO LTDA). REPRESENTAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. Trata–se de representação, com pedido de liminar, ajuizada pela Coligação Brasil Acima de Tudo, Deus Acima de Todos (PSL/PRTB), Jair Messias Bolsonaro e Antonio Hamilton Martins Mourão contra Fernando Haddad, Coligação o Povo Feliz de Novo (PT/PC do B/PROS), Google Brasil Internet Ltda., Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. e Twitter Brasil Rede de Informaço Ltda., por propaganda eleitoral irregular, consubstanciada em divulgação de notícia falsa e ofensiva à honra do terceiro representante. Na exordial, os representantes narram que, “no dia 19.10.2018 em Jacobina/BA, o cantor, compositor e violinista Geraldo Azevedo realizava seu show, quando fez discurso contrário à candidatura presidencial de Jair Bolsonaro, tendo afirmado que, quando preso pela ditadura em 1969, foi torturado pelo General Antonio Hamilton Mourão, que compõe a chapa autora no cargo de Vice–Presidente da República” (ID 575988 – Pág. 6). No ID 575988 – Págs. 6–8, indicam o link de acesso ao vídeo, postado no youtube, em que consta a gravação do fato narrado, e degravam a fala do cantor. Defendem que a notícia era sabidamente falsa, visto que “o General Antonio Hamilton Mourão [...] nasceu em 15 de agosto de 1953, contando atualmente 65 anos de idades. [sic] Em 1969, portanto, teria 16 anos de idade, cursava o 1º ano do 2º grau, sequer compunha o contingente do exército brasileiro, sendo que, por óbvio, não poderia ter torturado Geraldo Azevedo” (ID 575988 – Pág. 9), razão pela qual “o General Mourão anunciou que adotaria as medidas judiciais cabíveis contra o cantor” (ID 575988 – Pág. 9). Arguem que, posteriormente, o cantor “reconheceu a inverdade e declarou publicamente que se equivocou” (ID 575988 – Pág. 11), o que teria sido divulgado pelos meios de comunicação. Alegam, que, a despeito do reconhecimento do equívoco por Geraldo Azevedo, o candidato do PT continuou propagando a informação de que o General Mourão havia torturado o cantor, vejamos: “o reconhecimento do equívoco pelo cantor, contudo, não impediu que o candidato petista Fernando Haddad propalasse que General Mourão torturou o cantor Geraldo Azevedo publicamente, em entrevistas, jornais, declarações” (ID 575988 – Pág. 12). Em amparo ao alegado, colacionam alguns links de notícias nesse sentido (ID 575988 – Págs. 12–14). Aduzem que Mourão, para tentar explicar a mentira veiculada em torno dele, teria gravado vídeo e divulgado pela internet, mas que, “ainda assim, o candidato Fernando Haddad não se desculpou, nem desmentiu, limitando–se jogar a culpa do músico Geraldo Azevedo” (ID 575988 – Pág. 15), aludindo à notícia publicada em determinado sítio eletrônico, cujo título é o seguinte: “‘Quem deu informação equivocada foi o compositor torturado', diz Haddad sobre acusação contra Mourão” (ID 575988 – Pág. 16). Inferem que, diante desses fatos, ficou comprovada “a disseminação de ‘Fake News' sobre fato sabidamente inverídico pelo candidato Fernando Haddad e pela Coligação Representada, posto que até a presente data, nenhuma palavra foi dita para desmentir as assertivas calcadas em fato desmentido por Geraldo Azevedo” (ID 575988 – Pág. 16). Sustentam que os opositores políticos teriam aproveitado o equívoco do cantor “para reforçar o discurso que não [cansavam] de repetir de que o candidato Jair Bolsonaro e seu vice General Mourão são torturadores, fascistas, ditadores, violentos, etc. Este discursou [teria] pautado toda campanha eleitoral produzida pelos Representados, como se [extraía] do próprio site de campanha de Fernando Haddad” (ID 575988 – Pág. 17). Ponderam tratar–se de “'Fake News', prática que fere gravemente a verdade e a liberdade do pensamento. Isso porque ‘Fake News' cria estados mentais, emocionais ou passionais alterados e propagam falácias. Tal cenário turva a realidade e joga sombras à interpretação dos fatos, coage o pensamento e compromete a lucidez na tomada de decisões” (ID 575988 – Pág. 22). Defendem ter havido a prática de propaganda eleitoral irregular, arguindo, com esteio no art. 242 do Código Eleitoral e art. 6º da Resolução–TSE nº 23.551/2017, que “o que o candidato Fernando Haddad fez ao utilizar notícia sabidamente inverídica, inclusive, desmentida pelo próprio Geraldo Azevedo publicamente, foi utilizar–se de fato inverídico para criar estados mentais, emocionais e passionais muito negativos no eleitoral para com a campanha de Jair Bolsonaro e Antonio Hamilton Mourão” (ID 575988 – Pág. 25). Ademais, suscitam a prática de crimes eleitorais, fazendo referência aos arts. 243, IX, 324, 325 e 327 do Código Eleitoral e ao art. 17, X, da Resolução–TSE nº 23.551/2017. Por fim, pleiteiam, (i) “liminarmente, [...], tratando–se de ‘Fake News' viral, [que seja determinado] a GOOGLE, FACEBOOK e TWITTER que procedam varredura e suspendam publicações que atribuam falsa interpretação a decisão judicial exarada por esta Excelsa Corte [...] e alternativamente, se assim não entender, que determine a remoção dos links indicados nesta Representação por representarem ‘Fake News' de decisões exaradas por esta Corte, bem como que tragam aos autos identificação de páginas, links, contas, usuário respectivos, inclusive, em especial, os links trazidos a estes autos nesta Representação” (ii) “confirmando–se a decisão liminar proferida, seja julgada procedente a presente Representação, com o fim de determinar a exclusão definitiva dos conteúdos em questão” e (iii) “aplicação de multa eleitoral por veiculação de noticia falsa e prática de propaganda negativa, nos termos expendidos nestes autos, a FERNANDO HADDAD e à COLIGAÇÃO ‘O POVO FELIZ DE NOVO'” (ID 575988 – Págs. 26/27). Instados a se manifestarem acerca do interesse no prosseguimento do feito, pelo então relator, Min. Luis Felipe Salomão, (ID 578222), os representantes, por meio da petição ID 1687438, informaram a desistência do pedido liminar de remoção dos conteúdos veiculados na internet, devido ao encerramento do período eleitoral, mas pugnaram pela procedência da representação “com remoção definitiva dos links ofensivos, bem como aplicação de multa eleitoral por veiculação de notícia falsa e prática de propaganda negativa a Fernando Haddad e à Coligação ‘O Povo Feliz de Novo'” (ID 1687438 – Pág. 2). Encerrada a atuação dos juízes auxiliares nas representações eleitorais, os autos me foram redistribuídos em 13.12.2018, nos termos do art. 2º, §§ 3º e 5º da Res.–TSE nº 23.547/2017. Em defesa, a coligação O Povo Feliz de Novo e Fernando Haddad argumentam que este, no momento de sua manifestação em sabatina realizada por alguns meios de comunicação, desconhecia o equívoco posteriormente reconhecimento pelo cantor Geraldo Azevedo, nestes termos: “o representado apenas foi noticiado da declaração do próprio Hamilton Mourão durante a sabatina. E mais, não só ele como toda a equipe de entrevistadores que ali estavam não tinham ciência de que se tratava de uma notícia inverídica, tanto que foi necessário se enviar a informação através de ‘ponto eletrônico' para um dos jornalistas” (ID 3301088 – Págs. 2/3). Então, inferem que “ao contrário do que procura induzir a petição inicial, Fernando Haddad não sabia da declaração de Mourão quando entrou no estúdio para ser sabatinado, bem como não teria a menor condição de, durante a gravação, ter acesso a estas informações” (ID 3301088 – Pág. 3). Alegam que não havia “como se aferir a mensagem como ‘sabidamente falsa', tendo em vista que estava baseada na fala de alguém que, publicamente, afirmou ter sido torturado por uma determinada pessoa, atribuindo–lhe nome. E mais, deve–se considerar a história de vida de Geraldo Azevedo que, conforme é consabido, realmente foi preso e torturado durante o Regime Militar” (ID 3301088 – Pág. 3) Demais disso, arguem haver “clara tentativa de censura que os representantes buscam imperar com o requerimento de ‘varredura' para a retirada de materiais que envolvam os termos ‘GENERAL MOURÃO / VICE / TORTURA / BOLSONARO / TORTURADOR / GERALDO AZEVEDO'” (ID 3301088 – Pág. 3). Ao final, requerem o desprovimento da representação. A Google Brasil Internet Ltda. sintetiza os argumentos de defesa nos seguintes tópicos: “1) preliminarmente: (i) a prejudicialidade da Representação Eleitoral, consoante preconizam os artigos 33, § 6º da Resolução nº 23.551/2017 do E. TSE, bem como jurisprudência sobre a perda do interesse processual após encerrado o período eleitoral, devendo eventuais medidas serem tomadas pelos Representantes perante a Justiça Comum; (ii) a ilegitimidade passiva da Google para fins de remoção em relação às URLs indicadas, com exceção do vídeo inserido na plataforma do Youtube [...]; (iii) a ausência de interesse processual dos Representantes na hipótese de pretensão de desindexação dos links relativos à websites de terceiros da plataforma do Google Search; e 2) no mérito: (i) o entendimento acerca dos provedores de pesquisas (ilegalidade e ineficácia da medida), por sua vez pacificado pelo E. STJ (Rcl. 5.072/AC) e seguido pelos demais Tribunais; (ii) a impossibilidade de monitoramento prévio pelos provedores de aplicações; (iii) a necessidade de apreciação do conteúdo pelo Poder Judiciário, mediante a indicação de URL específica, de modo a viabilizar eventual ordem de indisponibilização; e (iv) a ausência de responsabilidade da Google sobre os conteúdos divulgados na plataforma Youtube” (ID 3302288 – Pág. 4). Preliminarmente, a Google defende que, ante a manifestação dos representantes no sentido de limitar o prosseguimento do feito aos pedidos de remoção definitiva dos conteúdos de internet impugnados e de aplicação de multa eleitoral, houve perda superveniente do objeto da demanda, arguindo que “não obstante a Google conseguir eventualmente indisponibilizar apenas o conteúdo hospedado no Youtube, tendo a eleição relativa ao cargo de Presidente da República sido realizada no último dia 28/10/2018, imperioso o reconhecimento da perda do objeto da demanda e a consequente perda do interesse dos representantes no prosseguimento do feito perante a Justiça Eleitoral” (ID 3302288 – Pág. 4). Aludindo ao art. 33, § 6º, da Resolução–TSE nº 23.551/2017, afirma que “se os representantes pretendem uma remoção de conteúdo, deverão pleiteá–la em face dos responsáveis pelos websites indicados (Globo, Carta Capital, Correio Braziliense, Folha de São Paulo, Coligação ‘O Brasil Feliz de novo', etc.) e mediante o ajuizamento de uma ação autônoma perante a Justiça Comum” (ID 3302288 – Pág. 5). E acrescenta que “as ordens de remoção exaradas pela Justiça Eleitoral, ainda que venham a ser confirmadas por sentença ou mesmo acórdão, possuem sua eficácia condicionada ao período eleitoral” (ID 3302288 – Pág. 5). Ainda em sede preliminar, sustenta a sua ilegitimidade passiva em relação às publicações veiculadas em websites de terceiros, alegando que “a pretensão autoral de remoção está além dos limites e possibilidades de cumprimento pela Google, na medida em que o conteúdo objeto da ordem está sob administração de outra pessoa jurídica e natural, que não fazem parte do mesmo grupo econômico da Google, tratando–se de pessoas absolutamente distintas” (ID 3302288 – Pág. 8) e que “no que diz respeito ao pedido de remoção do Google Search, a Google reitera que apenas atua como mero provedor de buscas, sem possuir qualquer ingerência nos conteúdos localizados a partir destas pesquisas” (ID 3302288 – Pág. 9). Nessa toada, suscita ausência de interesse processual, visto que “ainda que a ação fosse julgada procedente, a condenação da Google à retirada do conteúdo não seria adequada à satisfação do pleito, pois a remoção dos links indicados pelos representantes eventualmente dos resultados de uma busca não acarreta a exclusão do conteúdo propriamente dito. Isso porque, os materiais continuariam disponíveis na origem e localizáveis a partir de outros provedores de buscas” (ID 3302288 – Pág. 10). E prossegue expondo o seguinte questionamento: “se os representantes identificaram os responsáveis pelo conteúdo porque ajuizou a representação em face da Google? Onde está o interesse diante deste cenário, com exceção [...] do vídeo postado no youtube?” (ID 3302288 – Pág. 11). No mérito, argui a inexistência de vínculo entre a Google e os representantes, alegando que “se os representantes pretendem a retirada de conteúdo da internet, deveria ter se limitado a litigar em face dos responsáveis pela hospedagem do mesmo” (ID 3302288 – Pág. 16). Sustenta, também, ilegalidade de eventual ordem de retirada de conteúdo dos resultados do Google Search, nestes termos: “eventual ordem judicial no sentido de remoção de conteúdo do Google Search, além de ineficaz, conforme dito acima, seria ilegal, eis que o E. STJ já pacificou o entendimento de que os provedores de busca não podem ser obrigados a proceder à remoção/desindexação” (ID 3302288 – Pág. 16) e, colacionando julgados do STJ e do TJ/SP, infere que “a jurisprudência pacificada é manifestamente contrária à eventual pretensão dos representantes, pois os provedores de busca apenas compilam resultados e servem de mero atalho entre o usuário e o site que detém o conteúdo” (ID 3302288 – Pág. 18). Demais disso, quanto ao conteúdo hospedado na plataforma da Google, disponível por meio do Youtube, referente ao vídeo do show do cantor Geraldo Azevedo, argui que “eventual indisponibilização dos vídeos indicados na inicial depende de ordem judicial, uma vez que à Google, na figura de provedor de aplicações, não cabe o juízo de valor do conteúdo inserido na internet e tampouco o dever de monitoramento prévio” (ID 3302288 – Pág. 18) e que “os provedores de aplicações de internet não possuem obrigação de fiscalizar previamente o conteúdo produzido pelos usuários em suas respectivas plataformas, a fim de preservar as garantias da liberdade de expressão e livre manifestação de pensamento” (ID 3302288 – Pág. 19). Assevera “ineficácia técnica e impossibilidade jurídica do monitoramento prévio pretendido pelos representantes” defendendo ser “necessária a indicação das URLs (endereços virtuais) específicas dos conteúdos que se pretende remover de aplicações de internet” (ID 3302288 – Págs. 21/22). Alega, ainda, ausência de responsabilidade pelo conteúdo impugnado, aduzindo que “o marco civil da internet é claro em determinar que os provedores de internet, como é o caso da Google, só poderão ser apenados quando não atenderem deliberadamente à ordem judicial, caso em que poderão responder solidariamente pelos danos causados à terceiros decorrentes de conteúdos postados por usuários da internet” e que “não havendo descumprimento de ordem judicial, não há, em igual senso, que se falar em responsabilização financeira da Google pelo material disponibilizado na plataforma Youtube” (ID 3302288 – Pág. 25). Ao final, pleiteia a extinção do feito sem resolução do mérito, ante as matérias preliminares ventiladas e, subsidiariamente, no mérito, requer a improcedência da representação. Por sua vez, na petição ID 5047838, o representado Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. defendeu–se alegando a incompetência da Justiça Eleitoral para determinar a remoção de conteúdo da internet após o encerramento do período eleitoral, consoante se extrai dos seguintes trechos da peça defensiva: “nos termos do indigitado artigo [art. 33, § 6º, da Resolução–TSE nº 23.551/2017], fica bastante claro que, com o término do período eleitoral, compete à Justiça Comum determinar a remoção de conteúdo da internet e não à Justiça Eleitoral. Tanto é verdade que o próprio dispositivo torna sem efeito as determinações de remoção anteriormente concedidas” (ID 5047838 – Pág. 3). Quanto ao pedido dos representantes de realização de “varredura” pelos provedores de aplicação em torno das palavras–chave 'GENERAL MOURÃO/ VICE/ TORTURA/ BOSONARO/ TORTURADOR/ GERALDO AZEVEDO”, argui a impossibilidade de ser determinada essa providência, ante a disposição do art. 19, caput e § 1º, da Lei 12.965/2014 que, segundo expõe, “estipula dois requisitos para a remoção de conteúdo da Internet: (i) a existência de decisão judicial prévia; e (ii) a identificação clara e específica do seu alvo, que permita ao provedor a localização inequívoca do referido conteúdo” (ID 5047838 – Pág. 3). Argumenta que “os provedores de aplicações de internet não poderão ser obrigados a fazer qualquer “varredura” sobre o conteúdo de páginas, perfis e grupos criadas por seus usuários, pois implicaria em censura, violação à liberdade de expressão, violação à livre manifestação do pensamento” (ID 5047838 – Pág. 4). Ao final, pleiteia a extinção do feito sem resolução do mérito, ante o reconhecimento da incompetência da Justiça Eleitoral e, alternativamente, requer que “(i) a ordem judicial de retirada de conteúdo contenha a indicação da(s) URL(s) específica(s) dos conteúdos existentes na plataforma do Facebook, nos termos do art. 33, §3º da Resolução 23.551/17 do TSE; e (ii) a improcedência do pleito relativo a eventual varredura na plataforma” (ID 5047838 – Pág. 5). O Twitter Brasil Rede de Informação Ltda., por meio da petição ID 5121638, alega que “embora os Representantes pleiteiem pela remoção dos ‘links indicados nesta Representação, por representarem ‘Fake News'', não consta dos autos qualquer a especificação de qualquer conteúdo eventualmente disponibilizado na plataforma Twitter” (5121638 – Pág. 2). Aduz, preliminarmente, a perda superveniente do objeto da representação devido ao término do período eleitoral, ponderando que “esta representação visa tão somente ao fornecimento de dados de usuários e à remoção de propaganda eleitoral negativa, em vista de suposto e potencial prejuízo à candidatura, e considerando que a Justiça Eleitoral não deve estender seu poder de polícia para além do período eleitoral, requer–se desde já seja reconhecida a superveniente perda de objeto da presente representação” (ID 5121638 – Pág. 6). Sustenta inépcia da inicial em razão de o pedido da ação, atinente ao “fornecimento da ‘identificação de páginas, links, contas, usuários'”, ter sido genericamente formulado, inferindo que “a deficiência da narrativa constante da petição inicial, obstaculiza o exercício pleno do direito do TWITTER BRASIL ao contraditório e à ampla defesa, previsto no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, impossibilitando a contestação do pedido de forma pontual” (ID 5121638 – Pág. 7). Assevera que “caberia aos Representantes, pois, indicar de forma expressa e específica quais os usuários do Twitter cujos dados são pretendidos in casu, por meio da indicação das respectivas contas válidas, quais dados se pretende obter e, além disso, demonstrar o preenchimento dos requisitos legais em relação a cada um deles, sob pena de inadmissibilidade do pedido de quebra de sigilo” (ID 5121638 – Pág. 8). No mérito, argui a inexistência de indicação de URL específica do conteúdo impugnado, em contrariedade ao disposto no art. 33, § 3º, da Resolução–TSE nº 23.551/2017, nestes termos: “não obstante os Representantes nitidamente pretendam censurar manifestações da Internet que considerem inconvenientes, não há na inicial, tampouco nos documentos acostados, nenhuma indicação de que o conteúdo reputado irregular efetivamente foi veiculado por meio da plataforma Twitter” (ID 5121638 – Pág. 9). Defende “a necessidade de, além da especificação da URL de eventual conteúdo considerado ilícito pelos Representantes, análise fundamentada do conteúdo tido como impróprio, para evitar que conteúdos que não apresentem quaisquer violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral sejam removidos, o que caracterizaria verdadeira violação ao artigo 33, § 3º, da Resolução TSE 23.551/2017” (ID 5121638 – Pág. 14). Nesse mesmo sentido, afirma que “tendo em vista que [...] os Representantes não indicaram as URLs específicas do conteúdo reputado ofensivo eventualmente disponível na plataforma Twitter, não se revela possível a correta localização do(s) respectivo(s) usuários, tampouco o adequado julgamento de sua ilicitude por Vossa Excelência, como exigido pelo artigo 35 da Resolução TSE nº. 23.551/2017, gerando o risco, também aqui, de quebra do sigilo de dados de pessoas que não veicularam qualquer material contrário a lei” (ID 5121638 – Pág. 16). Por fim, suscita, preliminarmente, a extinção do feito sem resolução do mérito em razão da carência do interesse processual em relação ao Twitter “tendo em vista que o responsável pelo conteúdo está plenamente identificado e individualizado no polo passivo desta demanda” (ID 5121638 – Pág. 17) e, alternativamente, a improcedência dos pedidos formulados na representação. A Procuradoria–Geral Eleitoral opina pela extinção do feito sem resolução do mérito, asseverando “a perda superveniente do interesse de agir dos representantes em relação ao requerimento de remoção definitiva das postagens impugnadas, bem como a ausência de previsão normativa a respaldar a aplicação da pena de multa” (ID 5394238 – Pág. 6). É o relatório. Decido. Inicialmente, observa–se que, encerrado o período eleitoral, esvai–se a necessidade de resguardar o equilíbrio e a higidez da competição política, pelo que a remoção de conteúdo publicitário da internet, com esse fim, deixa de produzir efeitos, face à perda superveniente deste objeto específico no âmbito das representações. Se, porventura, das publicações impugnadas remanesçam ofensas que maculem a imagem de certo candidato, a possível ilicitude perde o viés eleitoral, passando ao âmbito de atenção da Justiça Comum, nos termos do que preconiza o art. 33, § 6º, da Resolução–TSE nº 23.551/2017: “findo o período eleitoral, as ordens judiciais de remoção de conteúdo da internet deixarão de produzir efeitos, cabendo à parte interessada requerer a remoção do conteúdo por meio de ação judicial autônoma perante a Justiça Comum”. Ademais, consoante o previsto no art. 19 do Marco Civil da Internet, considera–se que a responsabilização dos provedores de aplicação de internet por atos de terceiros (seus usuários) somente exsurge do descumprimento de ordem judicial direta e com conteúdo específico. No caso, inexistindo ordem judicial direcionada aos provedores de conteúdo representados e havendo perda do objeto quanto ao pedido de remoção definitiva, verifica–se que a extinção do feito sem resolução de mérito em relação à Google Brasil Internet Ltda., ao Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. e ao Twitter Brasil Rede de Informação Ltda é medida que se impõe. Quanto à questão de fundo, compreende–se que o marco regulatório da propaganda busca preservar a liberdade de manifestação nas disputas eleitorais, notadamente por meio da previsão de regras que assegurem um debate político livre e democrático. Dentro desse panorama, a liberdade de manifestação política deve abarcar tanto as opiniões favoráveis como as negativas acerca dos diversos candidatos, visto que, como pondera Aline Osório, “por meio da crítica à figura dos candidatos, os eleitores têm acesso a um quadro mais completo das opções políticas'. Nessa ordem de ideias, deve–se reconhecer 'considerações a respeito do caráter, da idoneidade e da trajetória dos políticos não são indiferentes ou (ir) relevantes para o eleitorado e fazem parte do leque de informações legitimamente utilizadas na definição do voto” (Osório, Aline. Direito eleitoral e liberdade de expressão. Belo Horizonte: Fórum, 2017. p. 228). Desse modo, sob a égide do postulado constitucional da liberdade de manifestação, a veiculação de propaganda que exponha os aspectos negativos relacionados aos candidatos afigura–se, em linha de princípio, legítima, notadamente como forma de ampliar o leque de informações disponibilizadas à tribuna do eleitorado. Logo, do ponto de vista ético, as campanhas de publicidade negativa não conflitam, necessariamente, com os valores fundantes do ordenamento eleitoral; pelo contrário, dentro de certas condições a propaganda crítica desempenha uma função estrutural, conexionada com o desenvolvimento de um debate que se pretende abarcador tanto dos acertos e como também dos falhanços eventualmente cometidos pelos agentes que disputam a preferência popular. Em definitivo, interessa notar que a manutenção da comunicação eleitoral em termos puramente positivos teria o efeito indesejável de criar uma atmosfera informativa artificial e distópica, no bojo da qual os postulantes seriam apresentados ao corpo de eleitores como indivíduos infalíveis, na esteira de suas próprias e enviesadas perspectivas. Todavia, é certo que a garantia da liberdade de expressão não é absoluta, havendo legítima previsão de intervenção da Justiça Eleitoral nas hipóteses de veiculação de publicidades ofensivas ou de fatos sabidamente inverídicos, o que se extrai do art. 243, IX, do Código Eleitoral, do art. 57–D da Lei das Eleições e do ar. 22 da Resolução–TSE nº 23.551/2017: “Art. 243. Não será tolerada propaganda: [...] IX – que caluniar, difamar ou injuriar quaisquer pessoas, bem como órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública.”; “Art. 22. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57–A). § 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos.” e “Art. 57–D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores – internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58–A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica. [...] § 2o A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais). § 3o Sem prejuízo das sanções civis e criminais aplicáveis ao responsável, a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação do ofendido, a retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatos em sítios da internet, inclusive redes sociais.” A rigor, nos dispositivos citados a disciplina regente procura limitar a liberdade de expressão com o objetivo preservar direitos fundamentais de igual importância, notadamente o direito à honra e o próprio direito à informação, que, na linha do que se defende, aponta para a necessidade de práticas informativas que se revelem verazes em sua substância. Afinal, na quadra das democracias constitucionais o requisito da veracidade encontra fundamento, precisamente, na necessidade de se garantir a formação de uma opinião pública livre (MORETÓN TOQUERO, Arancha. Novedades en torno a las libertades de expresión e información en la jurisprudencia del Tribunal Europeo de Derechos Humanos. In: GAVARA DE CARA, Juan Carlos et al. El control judicial de los medios de comunicación. Barcelona: Bosch, 2015, p. 40). No presente caso, verifica–se que o representado Fernando Haddad teria veiculado notícia inverídica e difamatória acerca do então candidato Hamilton Mourão, a partir de afirmação feita pelo cantor Geraldo Azevedo em show realizado em Jacobina/BA na data de 19.10.2018, ocasião em que este disse ter sido torturado pelo general Mourão na época da ditadura militar. Essa afirmação foi posteriormente desdita pelo músico ante a impossível veracidade dos fatos, visto que o representante, na época referida, teria apenas 16 anos de idade e não compunha o contingente do exército brasileiro. Não obstante, a afirmação foi repetida pelo então candidato do Partido dos Trabalhadores em sabatina realizada no Jornal O Globo, consoante se extrai dos links das matérias jornalísticas veiculadas na internet e colacionadas na exordial. Nessa senda, assevera–se que houve veiculação de notícia inequivocamente falsa, seja pela retratação do cantor, seja pelas circunstâncias do caso (notória inverdade dos fatos), apta a macular a imagem do representante, desbordando, portanto, dos limites da liberdade de expressão, desencadeando, em verdade, uma prática de desinformação dirigida ao eleitorado. À luz desse panorama, a narrativa difundida ofende, em seu âmago, o princípio da veracidade da propaganda, de acordo com o qual se repele, na seara da comunicação eleitoral: '[...] a divulgação de fatos falseados, o que se faz no resguardo da livre e pura formação do convencimento do cidadão, valor democrático que reclama tutela. Aqui, as ideias assentes são: (a) quanto maior for a quantidade de informações verídicas captadas pelo eleitor, maior a chance de que faça um juízo de valor legítimo na escolha do mandatário político; (b) a formação da decisão eleitoral sobre a base de informações manipuladas supõe um menoscabo do seu direito de escolher em liberdade' (ALVIM, Frederico Franco. Curso de Direito Eleitoral. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2016, p. 291). Não obstante, conquanto se constate que, na hipótese, a veiculação de propaganda eleitoral negativa extrapolou as balizas da liberdade de manifestação e, portanto, enveredou para a configuração de comunicação inveraz e ofensiva, faz–se imperativo reconhecer que inexiste, para casos tais, previsão específica de incidência de multa, a qual não pode ser aplicada por analogia em deferência ao princípio da legalidade plasmado no art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal. Da análise sistemática da legislação eleitoral, infere–se que, no âmbito cível–eleitoral, a propaganda ofensiva, quando praticada (i) antes do período eleitoral, poderá atrair a penalidade prevista para a propaganda extemporânea irregular (hipótese de propaganda eleitoral antecipada ofensiva), (ii) durante o período eleitoral, poderá ensejar a determinação de remoção do conteúdo irregular e direito de resposta e (iii) depois das eleições, não é passível de repressão legal por falta de previsão de penalidade específica. Com efeito, o art. 243, IX, do Código Eleitoral e o art. 22, § 1º, da Resolução–TSe nº 23.551/2017, encerram normas eleitorais imperfeitas, porquanto, embora contenham previsão de regra proibitiva (proscrição da veiculação de propaganda que calunie, difame, injurie ou ofenda a honra de quaisquer pessoas), não trazem preceito normativo sancionador a elas vinculado. Nesses casos, tendo em consideração que a aplicação de sanção pecuniária é obstada pela ausência de previsão legal específica, inexiste solução jurídica viável para além da remoção do conteúdo, seja em sede de representação ou no exercício do poder de política (CASTRO, Edson de Resende. Curso de Direito Eleitoral. 9. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2018, p. 345). Noutro vértice, verifica–se ser cabível a análise da conduta impugnada nesta
Data de publicação | 03/04/2020 |
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PALAVRA PESQUISADA | Fake News |
TRIBUNAL | TSE |
ORIGEM | PJE |
NÚMERO | 60185444 |
NUMERO DO PROCESSO | 6018544420186000384 |
DATA DA DECISÃO | 03/04/2020 |
ANO DA ELEIÇÃO | 2018 |
SIGLA DA CLASSE | Rp |
CLASSE | Representação |
UF | DF |
MUNICÍPIO | BRASÍLIA |
TIPO DE DECISÃO | Decisão monocrática |
PALAVRA CHAVE | Direito de resposta |
PARTES | ANTONIO HAMILTON MARTINS MOURAO, COLIGAÇÃO BRASIL ACIMA DE TUDO, DEUS ACIMA DE TODOS (PSL/PRTB), COLIGAÇÃO O POVO FELIZ DE NOVO (PT/PC do B/PROS), FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA., FERNANDO HADDAD, GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., JAIR MESSIAS BOLSONARO, TWITTER BRASIL REDE DE INFORMACAO LTDA |
PUBLICAÇÃO | DJE |
RELATORES | Relator(a) Min. Edson Fachin |
Projeto |